Ciência e sapiência no combate ao preconceito

Universidade como espaço de desenvolvimento de consciência acerca do espectro autista

Dois anos atrás, em 2021, recebi um convite que foi, ao mesmo tempo, um grande desafio. Orientar um projeto experimental de três acadêmicas do curso de Jornalismo, da Universidade Estadual do Centro-Oeste, que se propunha a fazer a assessoria de comunicação para a Associação Guarapuavana Mundo Azul (AGMA). Fundada em 2013, a entidade tem o objetivo de compartilhar vivências e experiências para ajudar tanto os pais das crianças com o Transtorno do Espectro Autista (TEA), quanto as próprias crianças. E foi ali que comecei a ler, buscar informações sobre o tema e “entender” um pouquinho mais sobre o complexo tema do TEA. 

“Entender” assim, entre aspas mesmo, porque parece, de fato, algo muito difícil de compreender quando se está de fora da realidade do dia a dia do autismo. Quando o tema entrou em pauta, aqui, no Conexão, muitas coisas vieram à minha memória: esse projeto de assessoria; uma amiga, mãe de autista nível um, que sempre falou que “não há leveza” no diagnóstico e que, portanto, não deveríamos chamar de “autismo leve”; vários relatos de mães e pais de filhos com o espectro falando sobre como a sociedade não acolhe as pessoas com TEA; e o projeto de ‘Rastreamento Precoce do Transtorno Espectro Autista’, a partir da aplicação do M-CHAT, em Unidades Básicas de Saúde, do município de Guarapuava/PR, realizado pelo Grupo de pesquisa Neurociência e Comportamento, da Universidade Estadual do Centro-Oeste (Unicentro). 

Mas antes de apresentar um pouco mais sobre esse projeto, é importante falar sobre o Transtorno do Espectro do Autismo (TEA). Esse é um transtorno do desenvolvimento neurológico, caracterizado por dificuldades de comunicação e interação social e pela presença de comportamentos e interesses repetitivos ou restritos. É uma condição que dura a vida toda, não tem cura, mas, se identificado cedo, pode ter um prognóstico melhor, com menos sintomas. 

Os primeiros sinais podem ser percebidos já nos primeiros anos de vida, mas não são iguais para todas as crianças. Em alguns casos, os sintomas são perceptíveis desde o nascimento, enquanto, em outros, só entre um e dois anos. Estudos mostram que, aos seis meses, não há diferenças claras entre bebês com TEA e os que se desenvolvem sem intercorrências. Porém, entre 12 e 18 meses, algumas diferenças são observáveis: falta de gestos comunicativos e respostas ao nome. Alguns sinais, como diferenças na forma de exploração visual e comportamento estranho com objetos, já são visíveis aos 12 meses – os autistas costumam enfileirar ou girar os brinquedos, por exemplo.

Apesar disso, em média, o diagnóstico do TEA só acontece aos quatro ou cinco anos. E esse é um fator que pode ser considerado preocupante, uma vez que a intervenção precoce pode melhorar muito o desenvolvimento da criança. Uma ação intensiva pode até evitar que o TEA se manifeste completamente, aproveitando o período em que o cérebro é mais flexível. Por isso, a busca por sinais precoces do autismo é uma área de pesquisa intensa, que inclui a detecção de anormalidades motoras, atrasos no desenvolvimento e dificuldades sociais. 

A professora Juliana Sartori Bonini, coordenadora do Laboratório de Neurociências e Comportamento da Unicentro, explica que “existem janelas de neurodesenvolvimento e, se a criança não é estimulada nesse período correto, tudo fica mais complicado. Talvez, essa criança não desenvolva todas as habilidades que poderia. Se ela tem atraso na fala e não for estimulada no período de dois a três anos que ela tem que desenvolver isso, por exemplo, pode ter o atraso para sempre e isso não vai ser recuperado, por causa da plasticidade cerebral”.

Embora a identificação e o acesso à intervenção ocorram em menor frequência em certos grupos sociais do que em outros, o TEA manifesta-se em indivíduos de diversas etnias ou raças e em todos os grupos socioeconômicos. De acordo com o Departamento Científico de Pediatria do Desenvolvimento e Comportamento da Sociedade Brasileira de Pediatria,  o transtorno ocorre mais em meninos do que em meninas e estima-se que cerca de 30% dos casos apresentam deficiência intelectual. É frequente, também, que o autismo esteja relacionado com outros transtornos psiquiátricos (transtorno do déficit de atenção e hiperatividade, depressão e ansiedade) e com outras condições médicas. É importante ressaltar que, quando qualquer atraso é detectado, a estimulação precoce é a regra, uma vez que isso pode significar a perda de um período em que essa habilidade poderia ser adquirida pela criança. 

Embora pareça quase óbvio que, diante da detecção de algum sinal de alerta é preciso agir, não é simples. Quando conversei com a professora Juliana, uma das questões apontadas por ela que mais me chamou atenção foi quando ela disse que o autismo é também uma questão social. E isso não só por algumas pessoas apresentarem dificuldade de socialização quando estão no espectro, mas a questão social se dá muito mais profundamente. “É recorrente que, no processo de construção do diagnóstico, aconteça a negação por parte dos pais, por exemplo. Ou não aceitam ou acham que o diagnóstico está errado. E, quando vão olhar para o histórico familiar também é muito difícil, porque existem pessoas que têm o diagnóstico e seguem negando”, aponta a professora. 

E o problema não é só ignorar um diagnóstico, mas também não oferecer o tratamento e estimulação adequados para possíveis déficits, que poderiam ser amenizados. “Uma vez que há negação, fica muito difícil. A filha da minha amiga que tem autismo, é formada em Engenharia e sofreu muito preconceito durante a adolescência, porque não se enquadrava no padrão… porque não era aceita na escola, não tinha amigos. E depois, na faculdade, tinha um amigo que era autista também”, conta Juliana. 

Em casos como esse, por não contar com o apoio de uma equipe que pudesse auxiliar nesses processos todos, há mais chance de desenvolver comorbidades, como depressão e ansiedade, justamente pela questão social. “A pessoa autista não é aceita. Então, tem todo um comprometimento dessa inserção na sociedade, que seria o segundo grupo de pertencimento. Eles não vão para festa por causa do barulho, que incomoda. Muitos gostam de música clássica na adolescência, enquanto os outros ouvem estilos musicais mais comuns. Então, tem todo o contexto que faz com que eles se distanciem, se isolem”, acrescenta a professora.

Enquanto ouvia Juliana falar de todos esses aspectos tão difíceis quanto aos aspectos sociais do autismo, me lembrava de outra professora da Universidade, próxima a mim, que havia chegado ao diagnóstico de seu filho autista, também, tardiamente. Foi então que procurei a professora Daiane Stoeberl da Cunha, do Departamento de Arte, da Unicentro, para me contar sobre como foi o processo deles. Davi, hoje com 12 anos, nasceu prematuro e dentre todos os exames e acompanhamentos, sempre teve muitos estímulos com fisioterapia, atividades pedagógicas para auxiliar no desenvolvimento, porque apresentava um pouco de atraso no desenvolvimento motor, e com os estímulos sempre foi respondendo muito bem. 

“Somente aos seis anos a gente teve a iniciativa de ir atrás de um diagnóstico, porque até essa idade era algo que incomodava algumas pessoas. Assim, principalmente eu, como mãe e como pedagoga, eu percebia que tinha algo diferente, porém como era muito longe do estereótipo do autista severo, acabava que a gente fazia os estímulos, dava as intervenções que eram necessárias e ele dava uma boa resposta. Então, foi passando”, relata Daiane. 

Na escola em que ele estudava à época também não houve essa observação ou a indicação de um possível diagnóstico de autismo. Até que a família tomou a iniciativa de investigar e buscar o diagnóstico, que veio muito rápido, de que o menino tinha autismo leve. Aos 11 anos, no entanto, foi levado para fazer uma nova avaliação, incentivado por amigos próximos e por uma pedagoga que convive com o garoto e que trabalha com altas habilidades, e teve um diagnóstico a mais: a dupla excepcionalidade, autismo leve e altas habilidades (também frequentemente chamada de superdotação). E para Daiane, esse novo diagnóstico os levou também a outro mundo, que é olhar para esse autista com altas habilidades/superdotação: “um conhecimento do qual também somos muito carentes, não é de fácil acesso, não é barato e nem acessível. E mais: o cognitivo vai super bem, mas as relações interpessoais precisam de muito estímulo, muito afeto, muito carinho, muita atenção e a mente do autista, da criança com altas habilidades é fantástica, a gente que não entende ela”. 

Outro ponto muito ressaltado por Daiane foi a questão da acessibilidade e dos altos custos na construção dos diagnósticos. E é aqui que encontro lugar para retomar aquilo que indiquei lá no início: o projeto de Rastreamento precoce do Transtorno Espectro Autista, a partir da aplicação do M-CHAT em Unidades Básicas de Saúde do município de Guarapuava/PR, realizado pelo Grupo de pesquisa Neurociência e Comportamento, da Universidade Estadual do Centro-Oeste – Unicentro. 

Diagnóstico precoce, tratamento mais efetivo

O projeto, que já está em fase de implantação em cinco Unidades Básica de Saúde (UBS) com ênfase em Estratégias de Saúde da Família (ESF), de Guarapuava-PR, é fruto das pesquisas realizadas no Grupo de pesquisa Neurociência e Comportamento, da Unicentro , pelo mestrando Luis Gustavo Gusson, enfermeiro de formação, orientado pela professora Juliana  Sartori Bonini. 

Essa parceria com a prefeitura surgiu a partir de uma dissertação de mestrado, da aluna Mônica Tavares, que é funcionária da prefeitura e psicóloga. O projeto foi justamente para implantar o diagnóstico de autismo no FastMedic®, que é o sistema da prefeitura utilizado em todas as unidades de saúde. Nesse sistema, ficam todas as informações relacionadas a agendamentos, prontuários, medicamentos e outros dados essenciais das pessoas atendidas e nele são inseridas as questões do M-CHAT, que é um instrumento de triagem (Modifield Checklist for Autism in Toddlers) exclusivo para sinais precoces de autismo e não para uma análise global do neurodesenvolvimento. 

Ter a possibilidade de um diagnóstico na rede pública de saúde resolve alguns dos gargalos quanto ao TEA. Primeiro, torna acessível um diagnóstico e posterior acompanhamento que em outros contextos fica completamente inacessível a boa parcela da população; segundo, facilita a busca por um tratamento mais efetivo, uma vez que o tratamento padrão-ouro para o TEA é a intervenção precoce. Assim que se levanta a suspeita ou imediatamente após o diagnóstico, é importantíssimo o acompanhamento por uma equipe interdisciplinar. 

E como ele acontece na prática? A professora Juliana explicou que, com a utilização da Escala M-CHAT, quando a criança chega na unidade de saúde para qualquer atendimento, inclusive na puericultura, já é avaliada pelo profissional responsável. Todos esses profissionais precisam ter formação superior para fazer a avaliação no sistema dentro do Fast Medic. As crianças identificadas e com indícios para TEA são, então, encaminhadas para uma avaliação, com exames e consultas especializadas para determinar um diagnóstico preciso e o melhor plano de tratamento. 

“O questionário leva a uma pontuação e tem os pontos de corte, que vão dizer para a pessoa se tem risco de ter autismo de acordo com os scores, porque são perguntas simples, não é nada muito complexo. Tudo é determinado a partir do comportamento da criança. Por exemplo, se ela observa muito as mãos, porque eles têm determinadas estereotipias. Os comportamentos são avaliados pelo profissional, que vai conversar com os pais sobre isso e vai fazendo a pontuação”, explica a professora Juliana. 

A partir do diagnóstico, a criança é encaminhada para uma psicóloga, que faz a análise do comportamento, a partir dessas informações, elabora um parecer detalhado sobre cada um desses pacientes que têm possibilidade de ter autismo e, a partir disso, é encaminhado para que um médico emita um laudo. E, aqui, mais uma dificuldade: o profissional da psicologia precisa ter um treinamento específico. A professora Juliana explica que “a criança pode ter vários problemas de neurodesenvolvimento, não só o autismo que tem muitas características parecidas. E, posteriormente, é para ter um Neuropediatra que faça o laudo conclusivo. Porque o diagnóstico é clínico. É um médico que vai pegar o laudo da psicóloga, avaliar e dizer se essa criança tem autismo. Pode ser, inclusive, que ela não tenha ainda todas as características do autismo, por isso, que se chama espectro, porque cada criança tem características específicas”. 

O TEA é visto hoje como um problema de saúde pública global, com uma crescente incidência em várias regiões, incluindo os Estados Unidos e o Brasil. O projeto aponta, ainda, para a falta de números precisos no nosso país e o aumento constante nos diagnósticos, o que demonstra a relevância de pesquisas e ações como essa, que além de mostrar o quão essencial é a pesquisa na vida das pessoas, auxilia no aprimoramento de políticas públicas de saúde voltadas para crianças com TEA. O autismo afeta de forma significativa a qualidade de vida não só das crianças, mas também de suas famílias e a partir de uma identificação precoce, de forma acessível, é possível buscar as intervenções e estímulos adequados, que podem levar a melhorias substanciais no funcionamento social, linguístico, cognitivo e comportamental

Até agora, 43 crianças já foram avaliadas no projeto coordenado por Juliana, duas delas com um possível diagnóstico de autismo, que serão encaminhadas para psicólogos, para fazerem a avaliação, que depende da observação dessas crianças. E, por isso, o projeto trabalha também com o grupo dos pais, para que haja um entendimento claro a respeito do que significa ter esse diagnóstico, de como eles devem lidar, como devem ser as conduções necessárias para que o tratamento seja o mais efetivo possível. “Porque, às vezes, o grande problema seria, primeiro a aceitação e depois, a condução. Então, os pais dessas crianças avaliadas que são diagnosticadas, terão esse acompanhamento a partir disso na própria UBS”, ressalta a professora Juliana.

A Universidade como espaço de acolhida

Pessoas com Transtorno do Espectro Autista são abrigadas por  leis específicas, entre elas a Lei 7.611/2011, que trata da educação especial e o atendimento educacional especializado a as Universidades contam com setores destinados a atender aos seus acadêmicos para proporcionar aos estudantes condições de acesso e permanência no ensino superior. Na Unicentro, procurei os profissionais da Coordenadoria de Apoio ao Estudante (Coorae), que é quem desempenha esse importante papel e desenvolve ações multiprofissionais para contribuir para a redução da evasão ocasionada por fatores relacionados à desigualdade e à exclusão social. Entre os objetivos da Coorae estão o fortalecimento do processo de democratização do ensino superior público e a criação de subsídios que auxiliem o universitário em seus desafios na vida acadêmica. 

Pedi a eles que me falassem sobre a importância do acompanhamento de estudantes com autismo e os principais desafios enfrentados no ambiente educacional. Todo esse processo se dá no sentido de garantir os direitos previstos pela legislação brasileira para acesso, permanência e sucesso educacional dos estudantes com Transtorno do Espectro Autista e os desafios envolvem, principalmente, o enfrentamento de barreiras como a falta de conhecimento sobre as especificidades do TEA, capacitismo, resistência dos professores na adaptação dos conteúdos e atividades avaliativas, invisibilidade, falta de respeito e empatia por parte dos colegas, superproteção, entre outras.

Na prática, caso o estudante com TEA tenha necessidade, além do atendimento direto com o professor de apoio pedagógico ou psicopedagógico, tem a possibilidade de solicitar à Pró-Reitoria de Ensino (Proen) um tutor pelo Programa de Tutoria Discente, que atende aos alunos pertencentes a grupos que necessitam de ações inclusivas, acompanhando o estudante nas dinâmicas universitárias, oferecendo orientação no encaminhamento de suas atividades acadêmicas. Podem se inscrever como tutores nesse programa, os alunos regularmente matriculados a partir da segunda série dos cursos de graduação da Unicentro.

Antes de acontecer o atendimento, o estudante precisa solicitar via protocolo o acompanhamento pedagógico anexando o requerimento e o laudo. Posteriormente, é realizada uma triagem com os psicólogos e assistente social que encaminham o aluno para os professores do apoio permanente. No primeiro encontro com os professores, é feita uma conversa para conhecer os estudantes, suas necessidades e potencialidades e, a partir disso, é elaborado um planejamento educacional que atenda as demandas mencionadas pelo estudante. Especificamente no atendimento de acadêmicos com TEA, é realizado o treino de habilidades sociais e orientação da rotina acadêmica, além de orientações constantes aos professores sobre adaptação pedagógica. E a coordenadoria oferece Atendimento Psicológico, Assistência Social, Enfermagem e Suporte Pedagógico

Perguntei, ainda, quais são os resultados observados no progresso ou na adaptação dos estudantes com autismo no contexto de sua formação universitária e os profissionais me responderam que é possível observar melhora na autonomia e autoconfiança, redução da fobia social, melhor desempenho nas atividades acadêmicas, melhor adaptação em questões organizacionais o que resulta na redução da ansiedade, desenvolvimento da criatividade e tomada de decisão, fortalecimento de laços de amizade, entre outras.

A chegada na Universidade é um momento desafiador para qualquer pessoa. A dinâmica de ensino, ter que administrar a vida acadêmica por conta própria, muitas coisas e pessoas ainda desconhecidas. Perguntei então, aos profissionais da Coorae, como era a percepção deles quanto a essas dificuldades para os alunos que estão no espectro. E eles me responderam que a mudança de rotina é um ponto importante a ser destacado, pois na universidade, além da diferença organizacional comparada a escola, o aluno passa a ter atribuições que demandam de mais autonomia, o que pode causar conflitos internos nesses estudantes. A interação social também é um desafio para o aluno com TEA, pois o ambiente é totalmente distinto do que estava habituado, e as relações com os demais alunos podem ficar comprometidas, muitas vezes pela falta de conhecimento dos colegas sobre o espectro e de como as pessoas com TEA podem se comportar em um ambiente educacional. 

Pelo estereótipo que algumas pessoas têm sobre o autismo, barreiras podem ser criadas, impedindo a interação social com os demais alunos. Como o trabalho da Coordenadoria é muito coletivo, eles optaram por conversar comigo também de forma coletiva. Participaram os profissionais: Paloma Ratuchne, pedagoga; Viviane Barbosa de Souza Huf, pedagoga; Gisele Taheviski, pedagoga e bióloga; Eliana Joséia dos Santos, pedagoga e psicóloga; Antônio Alexandre Pereira Junior, psicólogo; todos são Professores de Apoio Permanente na Educação Especial do Coorae Unicentro.

Conversei, ainda, com o professor Guilherme Benette Jeronymo, vice-coordenador do curso de Direito da Unicentro e professor orientador da Tutoria para acompanhamento de acadêmica do curso, que está no espectro autista e solicitou o acompanhamento de um tutor, como prevê os regulamentos. Além dela, outra colega também tem TEA, mas não fez a solicitação de acompanhamento. O Professor Guilherme relatou que o Departamento contou com o auxílio da Coorae, uma vez que as acadêmicas já colocaram no cadastro que tinham o TEA. Por isso, já no início das aulas a equipe da Coorae conversou com os professores do curso de Direito para que todos os encaminhamentos necessários fossem realizados. “Precisamos ter as atenções necessárias, especialmente em relação a avaliações, ao tempo desses alunos, uma vez que eles têm um tempo diferente, então teríamos que compreender esse tempo diferente desses alunos e, então, nas reuniões com os professores explicamos e os professores entenderam e foram se adequando ao cenário em sala. Então, até agora, nós não tivemos nenhum problema prático em relação com esses alunos”. 

O contexto de estudos na universidade é, naturalmente, de maior autonomia por parte dos alunos, os professores não exercem mais aquele papel de acompanhamento mais próximo e, segundo o professor, dentro do que é possível os docentes têm se empenhado em auxiliar nessa integração a essa nova realidade, novo ambiente, novas formas de estudo. Para ele, no início, como com qualquer aluno, duas alunas que têm TEA tiveram certa dificuldade, mas conseguem, no dia a dia, se adaptar bem. “As duas que têm o espectro autista aqui no curso de Direito são boas alunas, têm bom desempenho em relação a avaliações. São naturalmente mais quietas, mas socializam bem com os outros colegas. Os outros colegas também acolheram bem, porque sabem da importância disso. Eu acho que a gente está conseguindo lidar muito bem com isso”, pontua o professor Guilherme. 

Há dois anos, quando adentrei nesse universo a respeito do Autismo em função de uma orientação de projeto, já me peguei pensando no papel fundamental das universidades na promoção do conhecimento, na formação de profissionais e na construção de sociedades mais inclusivas. Hoje, depois de ter aprofundado em muitos temas a respeito do TEA, vejo o quanto esse papel é mais do que fundamental: são essenciais desde a informação que propagam até o desenvolvimento de pesquisas, ações e estratégias como é o caso do projeto para diagnóstico do TEA de forma acessível e gratuita, inserido na rotina da rede pública de saúde.

Nas muitas conversas que tive, percebi ainda a importância da Universidade como espaço integrador e de integração. Da ciência em seu estado mais puro às ações mais práticas, na interação entre as pessoas. O cotidiano das instituições também precisa ser de protagonismo na luta contra o preconceito em torno do TEA e a conscientização é um primeiro passo para destacar a importância da aceitação e inclusão. Cada uma das pessoas  que fazem as universidades precisam ser agentes ativos na promoção do protagonismo das pessoas autistas. Incentivando a participação, criando ambientes que respeitem as diferentes formas de comunicação e interação, contribuindo para a construção de uma cultura inclusiva e diversificada e, por consequência, uma sociedade mais justa e acolhedora para todas as pessoas, independentemente de sua posição. Neste caso, no espectro autista.

Glossário

Capacitismo: Discriminação de pessoas com alguma deficiência, seja ela física, mental, intelectual ou sensorial.

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Texto:
Andressa Rickli
Supervisão de texto: Ana Paula Machado Velho
Arte: Hellen Vieira
Supervisão de arte: Tiago Franklin Lucena
Edição Digital: Gutembergue Junior

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