O Projeto Biofábrica e a harmonia entre ciência e natureza

Descubra como o Projeto Biofábrica transforma a produção de plantas ornamentais

O outono chegou! Época em que as folhas começam a cair e a paisagem se torna nebulosa, com seus tons amarelos e vermelhos. É fato que isso traz uma certa nostalgia, porém, é apenas a transição da natureza, que precisa de mudanças para a renovação. 

Andando pelo Parque, neste clima mais ameno, consigo apreciar com mais atenção as espécies no meu entorno. Tanta coisa bonita, algumas verdes e enormes. Outras pequenas e lindas, com cores deslumbrantes. Confesso que dá vontade de ‘roubar’ algumas e levar pra casa. Mas imagina se todo mundo que fosse caminhar resolvesse levar uma ‘mudinha’ pra casa. Poderia ser o fim da presença de toda a beleza e diversidade que tanto elogia durante minhas sessões de exercício físico.

É pensando em questões como essa que pesquisadores se uniram no “Projeto Biofábrica de Orquídeas e Outras Ornamentais”. A ideia é mostrar como a ciência e a natureza podem se unir de uma maneira surpreendente, beneficiando o ambiente e a nós, humanos, e mais: todo o cenário da floricultura.

A iniciativa é coordenada pelo engenheiro agrônomo e professor do curso de Agronomia da Universidade Estadual de Londrina (UEL), Ricardo Faria. Ele é mestre e doutor em Genética Vegetal pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Além de liderar o projeto, Ricardo coordena o Orquidário e o Laboratório de Cultura de Tecidos de Plantas, do Departamento de Agronomia da UEL. 

Equipe do Projeto Biofábrica (Foto/Arquivo do Projeto Biofábrica)

O lançamento do projeto ocorreu em dezembro de 2023. Contou com a presença da reitora, Marta Favaro, docentes e servidores do Centro de Ciências Agrárias (CCA) da UEL, membros da administração e representantes de instituições apoiadoras, como a Fundação Araucária e o Instituto de Desenvolvimento de Londrina (Codel).

Ricardo destaca que o R$1,5 milhão recebido pelo projeto “é o maior já disponibilizado para o setor de floricultura na Universidade, até hoje”. A partir dos esforços do professor e do apoio de outros servidores da UEL e da Secretaria da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Seti), a iniciativa foi contemplada com recursos do Fundo Paraná/Seti. 

A verba, explica Ricardo Faria, vem sendo investida na estruturação de estufas para a propagação in vitro de espécies de plantas, aquisição de insumos, adequação dos laboratórios e na concessão de bolsas de estudo para até 15 estudantes e profissionais de áreas como Agronomia, Engenharia Florestal e Marketing. 

Sala de crescimento da Biofábrica com luminosidade e temperatura controlada (Foto/Ricardo Faria)

Segundo o professor, não é só a natureza que ganha com a iniciativa, diminuindo a predação das espécies no ambiente natural. “A proposta central do projeto é transformar a produção de plantas ornamentais em um negócio sustentável e dinâmico”. Ricardo Faria, que também é pós-doutor em Biotecnologia, pela Universidade da Flórida, nos EUA, enfatiza a importância “de gerar empregos e renda para as pequenas propriedades e comunidades locais, enquanto impulsiona a floricultura como um setor promissor em Londrina e região, com ênfase na capacitação profissional e na organização eficiente dos produtores”.

O projeto na prática

O termo “Biofábrica” se refere a uma fábrica ou instalação especializada na produção em larga escala de organismos vivos. No caso da equipe da UEL, produção de plantas e outras espécies nativas brasileiras com potencial ornamental. Para atingir esses objetivos o “Projeto Biofábrica de Orquídeas e Outras Ornamentais” utiliza técnicas avançadas como a Cultura de Tecidos de Plantas e métodos convencionais como sementes, estaquia e divisão de touceira1 para produzir mudas de plantas ornamentais.

De acordo com o professor Ricardo, a dinâmica proposta pelo projeto, na verdade, cumpre um papel fundamental: evita o extrativismo e a extinção de espécies nativas em seus habitats naturais. 

São utilizadas técnicas de cultivo in vitro que são imprescindíveis para acelerar e otimizar o processo produtivo. O termo in vitro, que dizer em vidro. É utilizado para denominar processos biológicos que ocorrem sob o controle de certos fatores, como temperatura e luminosidade. As plantas cultivadas nas condições in vitro se desenvolvem em recipientes de vidro ou plástico, contendo um meio de cultura que disponibiliza água e nutrientes para seu crescimento.

“Essa abordagem, aliada ao uso de técnicas modernas que permitem a multiplicação rápida e livre de pragas das mudas em ambiente controlado durante todo o ano, contribui significativamente para a preservação ambiental”, reforça o engenheiro agrônomo, que reconhece que a Biofábrica ainda não consegue produzir plantas nativas brasileiras com potencial ornamental em grande quantidade. 

As plantas ornamentais, como o próprio nome sugere, são espécies cultivadas não apenas pela sua beleza estética, mas também por suas múltiplas funções e benefícios. Entre as diversas espécies que são produzidas pela Biofábrica, há muitas cores, formas e texturas. 

Encantam as orquídeas e bromélias nativas do Brasil, o bambu da sorte, palmeiras, samambaias, antúrios, suculentas e um mix de espécies ornamentais ideais para cultivo em vaso e para uso no paisagismo. 

O cultivo in vitro de orquídeas, por exemplo, é amplamente difundido entre os laboratórios de cultura de tecidos e uma das principais vantagens desta técnica é a produção de plantas em quantidade, aliada à qualidade das mudas. Essas informações estão em um livro lançado pelo professor Faria, em 2012, “Produção de Orquídeas em Laboratório”.

“Essa técnica ainda possibilita a obtenção de praticamente 100% de sementes germinadas e, por meio da micropropagação de matrizes selecionadas, é possível a produção de plantas livres de doenças, com a garantia de preservar as mesmas características da planta-matriz”, registra a publicação. 

Outro importante fator é o apelo ecológico, ao considerar que muitas espécies de orquídeas estão em risco de extinção. Nesse caso, o cultivo in vitro torna-se um importante instrumento de preservação, juntamente com a independência do produtor em relação às plantas silvestres, reduzindo a extração na natureza. 

“As orquídeas e bromélias, com suas flores exóticas e formas intrigantes, são símbolos da biodiversidade brasileira. Já o bambu da sorte e as palmeiras acrescentam um toque elegante aos ambientes. As samambaias, antúrios e suculentas complementam a diversidade, oferecendo opções versáteis para diferentes tipos de decoração e ambientes”, lembra Faria.

Biofábrica na comunidade

Outra mente por trás do projeto é a professora doutora Cristianne Cordeiro. Ela voltou a destacar a importância do apoio do Fundo Paraná da Seti, que viabiliza financeiramente a iniciativa. Segundo Cristiane, hoje, a Biofábrica conta com uma equipe robusta de colaboradores, entre eles os professores da UEL, Maurício Ursi Ventura e Juliano Rezende, e o engenheiro agrônomo Bruno Melegari.

A professora destaca que o grupo participa de eventos como a ExpoLondrina e busca integrar a Biofábrica às comunidades locais, ouvindo as demandas dos produtores e buscando soluções conjuntas para otimizar a comercialização. “A abordagem colaborativa é essencial para enfrentar os desafios do mercado, como por exemplo, garantir a qualidade e competitividade dos produtos no setor de floricultura”, explica.

A docente ainda destaca que o sucesso do projeto é medido não apenas pelos números de produção, mas pelo impacto positivo no meio ambiente e na economia local. A inovação e a tecnologia, além da utilização de técnicas avançadas de cultivo e de pesquisa constante, garantem mudas de qualidade. 

O orquidário da UEL é um dos locais que sediam a produção de conhecimento científico do grupo. O espaço UEL, teve início no ano de 1997, em princípio, dentro de um pequeno ripado de madeira. Hoje, possui dez casas de vegetação que, somadas, ocupam uma área de aproximadamente de 1000 m2 e o Laboratório de Cultura de Tecidos, onde são realizados estudos de micropropagação e criopreservação de espécimes de orquidáceas.          

No Laboratório vem testando, por exemplo, técnicas de nanotecnologia associadas ao óleo essencial de hortelã pimenta na tentativa de aumentar a longevidade das rosas. Para quem não sabe, a nanotecnologia trabalha com substâncias e estruturas em uma escala invisível a olho nu. Outra pesquisa vem utilizando a vitamina C para retardar o escurecimento das pétalas e das folhas. Os primeiros pré resultados já mostraram que a vida da planta dentro das casas das pessoas pode ser aumentada em até 10 dias.

Planos futuros

Já sabemos que a visão abrangente da Biofábrica é fomentar a produção de plantas ornamentais como um agronegócio viável em Londrina e região, ajudando a colocar no mercado produtos com mais qualidade. Mas “o propósito do grupo não se limita à geração de empregos e renda em pequenas propriedades. Inclui a capacitação de profissionais na área de floricultura, bem como a organização dos produtores”, reforça Cristianne.

Com isso em mente, a expansão das ações estão nos planos futuros da Biofábrica. A ideia é que a equipe consiga fazer com que a produção de plantas ornamentais seja uma alternativa viável para o Paraná, Londrina e região com o aumento do número de produtores e um eficiente sistema de comercialização.

Os resultados e sucesso do projeto serão medidos e avaliados pelo crescimento econômico da Floricultura  e pelo aumento do número de produtores e da produção de plantas ornamentais nessa região do Estado.

“Atualmente, mais de 90% das plantas ornamentais comercializadas no Paraná são provenientes do estado de São Paulo. A ideia é que, com a ação da Biofábrica, o Paraná passe a se destacar na produção de plantas ornamentais, assim como se destaca na produção de grandes culturas como o café e a soja. É preciso união, ter planos, sonhar e adotar atitudes positivas para alcançar nossos objetivos e transformar o ambiente em que vivemos e o mundo”, conclui o professor Ricardo Faria. 

O C² espera que a iniciativa continue florescendo assim como algumas espécies que a equipe do projeto cultiva.

EQUIPE DESTA PÁGINA
Texto:
Gabriele Christine e Ezequiel Moreira Gonçalves
Supervisão de texto: Ana Paula Machado Velho
Arte: Guille Cordeiro
Supervisão de arte: Tiago Franklin Lucena
Edição Digital: Gutembergue Junior

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A pesquisa que mencionamos contribui para os seguintes ODS:

Glossário

  1. Touceira – Conjunto de plantas da mesma espécie que nascem muito próximas entre si, formando um tufo espesso. ↩︎