Robótica: um universo pedagógico e encorajador

Entenda o que é robótica e como essa ciência tem sido uma importante ferramenta no processo de aprendizagem, principalmente, em sala de aula

Quando o assunto é robótica, o que vem à sua mente? Eu, me lembro daqueles robôs antigos, que a gente via na TV, nos filmes da década de 80 e 90 – lembra do Homem Bicentenário? Robôs, com características humanóides, que faziam nada mais do que repetir as atividades de um ser humano. Mas essa ideia já está pra lá de ultrapassada, estão aí os Transformers para colaborar com essa evolução.

Hoje, os robôs vão muito além dessa premissa de reproduzir um ser humano. Veja só, pesquisando em um site de compras, descobri que eu não preciso mais sofrer para limpar a casa, porque existe um aspirador robô, que não só aspira, mas também passa pano na casa! Totalmente programado e controlado pelo celular.

Mas você sabia que essa evolução tecnológica começou lá na Primeira Revolução Industrial? Pois é, isso aconteceu quando as indústrias foram mecanizadas e automatizadas para aumentar a produtividade. Bom, esse assunto nos despertou uma curiosidade, que levou o Conexão Ciência – C² a procurar respostas para entender o funcionamento dessa tecnologia que parece tão distante de nós, mas que já está presente em situações simples, no nosso dia a dia, como um robô que aspira o pó da sua casa

Ao chegar no bloco G56, da Universidade Estadual de Maringá (UEM), na sala do professor Breno Ferraz de Oliveira, do Departamento de Física, me deparei com um ambiente totalmente diferente do comum, surpreendente, eu diria. Como parte da decoração, vi diversos carrinhos coloridos –  um mais do que outros e pensei – que coisa, parecem robozinhos. Nossa! São robozinhos!  E isso me intrigou, pois, justo eu, que nunca fui da área de Exatas, fiquei com vontade de saber mais sobre esse universo curioso – e confuso, confesso -, e, agora, tenho a chance de contar para você o que são esses robôs, ou melhor, o que é um robô. Vem comigo!

Conversando com o professor Breno, descobri que um robô é uma máquina programada para executar uma determinada ação. Mas, ao contrário do que nós – ou pelo menos eu – sempre pensamos, ela não precisa necessariamente ter a forma humanóide, na verdade, pode ter a forma que o seu criador quiser. E mais: além da parte do movimento do robô, que é a parte eletrônica, a programação é o elemento mais importante dessa tecnologia – é o chamado pensamento computacional. 

Olha, confesso que quando ouvi esse termo, minha mente deu um nó. Como um ser humano pode pensar como um computador ou vice versa? Pensei que isso fosse coisa de ficção científica. E aí, me veio uma dúvida: como é possível ensinar algo tão específico, técnico e complicado para uma criança ou adolescente, se até mesmo os adultos como eu têm dificuldade para entender? 

Acontece que, na minha época de escola, o que não faz muito tempo, não havia ainda na Rede Pública de Ensino oficinas de robótica como recurso didático para o ensino da física, da matemática e da informática. Mas, o tempo passou e isso também mudou. Hoje, esse assunto faz parte da vida dos alunos. Bom, saí de meus devaneios e continuei explorando esse magnífico universo da programação, pois, além de curiosa, sou teimosa, e isso virou questão de honra! 

É claro que para que esse conteúdo seja de fácil compreensão para as crianças e adolescentes, é preciso todo um jeitinho de ensinar diferente, como me explicou o professor Breno. Ele desenvolveu alguns métodos que ajudam a estimular o pensamento computacional, com oficinas e outras atividades. E é aí que está o grande desafio, porque, como falou o professor, para iniciar essa jornada, foi necessário “aprender a ler e ler para aprender”, ou seja, ele teve que conseguir ensinar as máquinas, aprender a linguagem do computador e como o sistema pensa que é o que chamamos de lógica do pensamento computacional. 

Vamos voltar um pouco nessa história. Você se lembra dos carrinhos coloridos na mesa do professor Breno? Eles foram o resultado dessa metodologia aplicada. “Inicialmente, desenvolvemos um protótipo de carro autônomo, ou seja, ele tinha que andar sozinho com visão computacional. Então, ele filmava o caminho, aí com base nessa filmagem tomava as decisões para onde iria”, explicou o docente.

Esses protótipos dos carrinhos coloridos, então, foram a base para o ensino de robótica nas escolas juntamente com a colaboração do projeto de extensão TrUEM. A iniciativa teve origem em 19 de setembro de 2019 com o objetivo de compartilhar “o conhecimento e os desafios da Robótica e da Inteligência Artificial, de forma gratuita, por meio de experiências de aprendizado acessíveis e inclusivas”, diz o formulário do projeto. O nome TrUEM faz referência às palavras TRUE – termo em inglês, que na robótica indica se a sentença é verdadeira, e UEM, onde nasceu. Essa premissa contou com o apoio e parceria de uma dupla fundamental. 

Uma delas é a Denise Adorno Lopes, formada em física pela UEM, e que, naquele período,  trabalhava em uma universidade na Suécia, mudando-se posteriormente para Oak Ridge, nos Estados Unidos, onde está atualmente e  – curiosidade: onde foi desenhado o projeto Manhattan da bomba atômica. Apesar de trabalhar com física nuclear, Denise sempre auxiliou no desenvolvimento da área de tecnologias e robótica e, inclusive, é responsável pela construção de toda a parte do carrinho autônomo.

Outra importante contribuição veio de Guilherme de Souza Rocha, engenheiro aeronáutico, que, atualmente, faz mestrado na área da ciência da computação, na UEM. Guilherme também foi responsável por compartilhar seus conhecimentos sobre robótica e sobre os equipamentos que existem na área, além de mediar toda a comunicação para as parcerias entre a UEM e a Prefeitura de Maringá. 

Atualmente, então, como dito acima, o TrUEM está sob a coordenação de Breno. Ele e o grupo que o acompanha propuseram uma parceria com a Secretaria de Educação – Prefeitura de Maringá (Seduc) e, agora, a robótica vai invadir salas em 52 unidades escolares de Maringá.

Oficinas de Capacitação 

Olhares atentos, dinâmicas, perguntas, auxílio dos monitores e muita risada! Um dia, professor, no outro, aluno, novamente. É em meio a esse clima de descontração, que muito conhecimento é transmitido para capacitar os professores da Rede Municipal de Ensino de Maringá. Essas oficinas fazem parte da iniciativa proposta pelo projeto de Breno Oliveira, que tem como objetivo, auxiliar os professores a ministrarem, posteriormente, a robótica no ambiente escolar, como recurso pedagógico. 

Com os professores, as oficinas de robótica não utilizam teoria no quadro, pelo contrário, os “alunos”, ficam sentados em frente ao computador elaborando as programações que farão o carrinho andar ou qualquer outra coisa acontecer. A intervenção é utilizada como método investigativo. Eles ficam imaginando como proceder para levarem os jovens a pensar. “Como faria isso? Vamos tentar pensar? Será que o computador pensa dessa maneira? Mostramos que existe uma pequena diferença de como o computador funciona. Eles corrigem e percebem o resultado”, destacou Breno, mais uma vez dando pistas do que é o pensamento computacional.

Por outro lado, com os jovens, já nas salas de aula das escolas, as oficinas são organizadas em equipes de quatro alunos com apenas um computador. Os estudantes ficam ansiosos aguardando sua vez. Enquanto um colega faz a atividade na prática, os demais colaboram, ditando o que fazer conforme orientação do professor. Essas atividades estimulam o trabalho em equipe e a colaboração entre eles, além das dinâmicas de jogos, que têm como objetivo encorajá-los a tomarem decisões com mais autonomia a partir da competitividade.

E você está se perguntando, onde entra a construção dos carrinhos autônomos? É agora, no final do curso. Os organizadores propõem um campeonato de futebol de robôs. Mas não é um simples campeonato meu caro, minha cara. Aqui, os estudantes vão precisar construir os seus “jogadores”: um carrinho de controle remoto. E mais: aprender a pilotá-lo Ou seja, não é somente sobre programar, mas sobre – e principalmente – colocar o objeto para atuar de verdade. A regra é: quem fizer um gol em menor tempo, vence o campeonato.  “Normalmente, levamos chocolate para incentivar a participação dos alunos”, brinca o professor. Por um chocolate, eu acho que topo entrar na brincadeira, hein?

Campeonato de futebol de robôs realizado na entidade Lins de Vasconcelos em Maringá  (Foto/Arquivo pessoal)

Nayra Carolina Bueno de Morais Assunção, professora do 4º ano do ensino fundamental, da Escola Municipal Pastor João Barbosa de Macedo, participou de uma das formações e contou que sempre gostou da área de tecnologia da informação. Na escola em que trabalha, já foi até monitora de informática e, também, realizou uma formação em programação.

Segundo Nayra, implantar oficinas de robótica nas escolas trará muitos benefícios não só para os professores como ela, mas para os alunos, em sala de aula. “Eles aprendem a programar, criar comandos – uma sequência de passos para que uma máquina execute uma ação, caso contrário, se os comandos não forem adequados, não terão sucesso. Então, é necessário que eles pensem, identifiquem problemas e criem soluções. É uma ótima estratégia para aprender os conteúdos de forma mais prática e lúdica”, enfatizou. 

Ciência que ensina e empodera 

Bom, depois de toda essa experiência, já conseguimos perceber que o impacto dessas tecnologias vai muito além da própria robótica, não é mesmo? Existe um alcance gigantesco em relação ao desenvolvimento humano e comportamental dos alunos. E, aqui, aproveito para citar o saudoso Paulo Freire: “o homem só consegue transformar sua realidade a partir do momento que se torna protagonista de sua história”. Protagonista  não é apenas um mero espectador, mas o principal, o condutor e, nesse projeto, a comunicação entre o TrUEM e o aluno é horizontal, permitindo que o estudante se sinta parte do processo, criando possibilidades e desenvolvimento de habilidades, muitas vezes, reprimidas e que nunca foram descobertas. 

O professor Breno enfatizou que a intenção do projeto é realmente ir além da ciência aplicada em sala de aula e do pensamento computacional.  É trabalhar para resgatar o aluno e fazê-lo acreditar no seu potencial, além de despertar o interesse sobre o ambiente universitário após a conclusão do ensino médio.  

“Havia um aluno que dizia não ser capaz. Após algumas práticas, conseguiu montar um carrinho autônomo. Ele também colocou um sensor para detectar um obstáculo e tentar desviar, e não colidir. O aluno conseguiu realizar todo circuito. Ele dizia ‘como é que eu consegui? Eu que não sou nada, tô aqui fazendo as coisas’”, contou Breno. 

O professor destacou, ainda, o quanto é necessário colocar os acadêmicos da graduação para presenciar esses acontecimentos fora dos muros da Universidade com a intenção de motivá-los a fazerem a diferença na sociedade e, principalmente, se sentirem valorizados na profissão que escolheram para o futuro, para que não desistam, “já que existe um alto índice de evasão acadêmica nos cursos de física e matemática na UEM”, explicou.

E isso tem funcionado, conforme podemos ver na história de Arão Santos, que é acadêmico de física na UEM e membro do projeto há aproximadamente um ano. Ele destaca que a experiência tem sido gratificante em sua formação.  “Espero que o projeto continue forte!  Não é só a profissão do futuro, mas do presente. A programação está em alta além da área das exatas e tecnológicas, como na biologia também. É uma oportunidade para sairmos da bolha da Universidade e o projeto nos permite sair desse contexto, e trocar experiências com a comunidade externa”.

Arão Santos, acadêmico de física da UEM, auxiliando a professora nas oficinas de robótica (Foto/Maysa Ribeiro)

“Eu vislumbrei que esse projeto teve um impacto social muito maior do que todas as pesquisas que eu já fiz na minha vida! Tenho me dedicado muito para que realmente aconteça e impacte o maior número de pessoas! E já tem impactado”, ressaltou Breno com orgulho e gratidão.

EQUIPE DESTA PÁGINA
Texto:  Débora Arcanjo
Colaboração: Maysa Ribeiro Macedo e Bruna Mendonça
Revisão: Ana Paula Machado Velho
Supervisão de Texto: Ana Paula Machado Velho
Arte: Marjorie Corrêa Gracino
Supervisão de arte: Tiago Franklin Lucena
Edição Digital: Gutembergue Junior

A pesquisa que mencionamos contribui para os seguintes ODS: