Amalia Donegá: uma vida dedicada à justiça, à educação e à ciência

“Fiz Direito, a única coisa que eu sempre pensei que pudesse fazer, nunca cogitei qualquer outra profissão”

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Ainda muito nova, na educação básica, a filha caçula de Antônio e Lourdes, Amalia Regina Donegá, já tinha alguns caminhos muito bem planejados para o futuro: o de estudar e o de ser advogada. “Passei no vestibular da Universidade Estadual de Maringá (UEM) e fiz Direito, que foi a única coisa que eu sempre pensei que pudesse fazer, nunca cogitei qualquer outra profissão”, diz Amalia. O motivo de escolher tão cedo e com tanta certeza a advocacia? Nem ela sabe explicar, simplesmente foi assim.

Com pai operário, mãe costureira e uma família que ela considera “muito humilde, do ponto de vista econômico e cultural”, nunca foi imposto a ela o trabalho braçal. Muito pelo contrário, os pais deram a oportunidade de não precisar trabalhar no campo. Deram aos filhos a oportunidade de se dedicarem, exclusivamente, ao estudo.

Ao se formar, Amalia passou em concurso público e assumiu o cargo de Advogada do Estado, tendo a “sorte”, como ela mesmo descreve, de trabalhar na UEM. Na década de 1980 e 1990, a Defensoria Pública do Estado ainda não era muito bem estruturada, por isso, eram os advogados do curso de Direito da universidade que realizavam esse serviço gratuito para o público. Foi nesse período que a recém formada começou a trabalhar com o direito penal, uma área que sempre gostou e teve habilidade. Ela passou, então, a atuar como defensora na área criminal, fazendo quase todos os atendimentos da população de Maringá.

Aquela menina que não pensava em outra coisa, a não ser o direito, abriu o leque de possibilidades e passou a seguir, também, a carreira de docente na UEM, como professora da área criminal, além do mestrado em Direito Penal, na mesma universidade. Em 2010, convidada pelo reitor em atividade, ela precisou tomar uma decisão difícil na carreira, largando a advocacia penalista para atuar em uma diretoria administrativa.

Amalia Regina Donegá (ASC/UEM)

Quando se aposentou da procuradoria jurídica, Amalia continuou com a docência e, a partir de então, a história da professora começa a caminhar em direção ao Núcleo de Estudos e Defesa de Direitos da Infância e da Juventude (Neddij), um programa criado em 2006, ligado a Pró-Reitoria de Extensão e Cultura (PEC), no qual ela atua, hoje, como coordenadora.

“Eu formatei o Núcleo nos mesmos moldes que a gente tinha na assistência judiciária, só que voltado exclusivamente ao atendimento de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade. No Neddij, nós temos advogados, estagiários do curso de Direito, psicólogos, estagiários do curso de Psicologia e docentes, responsáveis pela orientação”, explica a coordenadora.

Entre todos os serviços prestados pela UEM, o Núcleo Maria da Penha (Numape) é responsável pelo atendimento jurídico e psicossocial das mulheres vítimas de violência doméstica, enquanto o Neddij atua em casos de violências domésticas que atingem, especificamente, o público infanto-juvenil e também adolescentes em conflito com a lei. “O nosso trabalho é dedicado ao melhor interesse da criança e do adolescente, nós não somos advogados porque o pai quer ou a mãe quer. Por isso que a gente faz uma avaliação psicológica e um contato com a rede de proteção toda, para saber exatamente onde está o problema e, ao nosso juízo, sabermos se vamos aceitar o caso ou não”, especifica Amalia. 

São ações de guarda, de pensão alimentícia, que a mãe pede contra o pai que se separou, avó pede em relação ao genro, ou mesmo avó e avô que pedem a guarda de uma criança, porque a mãe está em situação de rua, por exemplo. Atendem, também, casos de direitos violados pelo próprio estado, fazendo valer o que está prescrito na constituição ou em leis ordinárias. Todos os direitos das crianças e dos adolescentes, violados pela família, pelo estado e pela sociedade, quando não resolvidos com ajustes e acordos, devem ser resolvidos por vias jurídicas, pelos advogados e alunos do Neddij.

Completando 16 anos em atividade, o Núcleo já está presente em todas as universidades estaduais do Paraná. Nesse percurso de quase duas décadas, a UEM e a Universidade Estadual de Londrina foram as únicas universidades que mantiveram sempre a mesma coordenação. Esse é um dos motivos de Amalia também estar na coordenação estadual do Núcleo de Estudos e Defesa de Direitos da Infância e da Juventude, desde 2020.

Ainda como docente, a professora do curso de Direito desenvolve pesquisas na área do direito penal, que acabou se dirigindo, graças aos anos de atuação com crianças e adolescentes, para pesquisas relacionadas ao direito infanto-juvenil. “Os meus bolsistas, quando investem no nosso trabalho, já sabem que têm o compromisso de trabalhar com a pesquisa, com a área de estudos e com a extensão. Então, necessariamente, a gente sempre está com um projeto de pesquisa, um projeto de ensino e pelo menos um projeto de extensão em andamento. Sempre”, diz Amalia.

Pandemia

No período de pandemia e distanciamento social, o Neddij não parou de funcionar um único dia. Em março de 2020, quando a OMS já havia decretado uma pandemia, Amalia entrou em contato com a PEC e logo começaram atuar de forma remota. Como em muitos serviços, foi preciso ativar um WhatsApp próprio e divulgar o número de contato em todos os meios de comunicação possíveis. 

Infelizmente, o serviço deles aumentou muito, não só pelo aumento de casos de violação de direitos, mas também por causa da celeridade dos atos processuais, que ficaram mais transparentes e ágeis. Entre tantos problemas que enfrentou na pandemia, Amalia aponta essa maior eficácia do processo como um benefício para a área do direito. 

Agora, com as atividades voltando novamente a funcionar, o problema do Neddij e da sua coordenadora é outro. Depois da população ter se acostumado a fazer praticamente tudo pelo WhatsApp, o retorno ao presencial encontra resistência. Sem contar as arrumações e ajustes que precisam ser feitos no Bloco 3, onde funciona o núcleo. “Parece que teve um vulcão, todo mundo correu pra casa, deixou tudo do jeito que estava, e voltou dois anos depois. Quando entramos, tinha brinquedo de criança em cima da mesa, aparelho quebrado, uma bagunça”, relata Amalia.

Determinada e muito focada, ela passou por todas as dificuldades da carreira de cabeça erguida, sem nem mesmo notar muitos dos obstáculos que as mulheres precisam superar na profissão. Essa garra ela atribui à personalidade e ao temperamento. “Eu sofri assédio ou qualquer outro tipo de coisa, mas ao mesmo tempo que isso possa ter me incomodado, eu aprendi como me desvencilhar na mesma hora, às vezes eu até tiro vantagem”, comenta.

Casada e com filhos e netos, Amalia soma 40 anos no mundo jurídico, além de alguns outros no mundo educacional e científico. Ela tem muito orgulho da sua caminhada profissional e de sua vida pessoal, e diz, com muita convicção e determinação, que não está nem próxima de “entregar as botinas”.

A menina Amalia Regina Donegá (Arquivo pessoal)

Confira a terceira temporada do podcast “Donas da ciência”, e ouça a história da Amalia contada por ela mesma

Donas da Ciência – T3 E1 – Amalia Regina Donegá Conexão Ciência C²

A docente Amalia Regina Donegá expõe sua história, contando a trajetória que a levou a sua formação profissional e, principalmente, como ser humano.

O conteúdo desta página foi produzido por

Texto: Rafael Donadio
Arte: Murilo Mokwa
Revisão: Ana Paula Machado Velho
Supervisão de Arte: Tiago Franklin Lucena
Edição Digital: Gutembergue Junior


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