Imagine uma floresta. Enquanto besouros reciclam folhas e galhos caídos, fertilizando a terra para que mais plantas cresçam rapidamente, formigas e cupins trabalham para arejar o solo e ajudar as novas sementes a brotar em segurança. Mas a atuação desses pequenos jardineiros, invisíveis aos olhos dos menos atentos, não para por aí. Aliás, você sabia que a polinização, processo que permite a fertilização e a formação de frutos e sementes, não é uma atividade exclusiva das abelhas? Vespas, beija-flores, borboletas, formigas e até morcegos também desempenham um papel crucial polinizando plantas por aí!
Em um ecossistema, os seres vivos coexistem em uma interação equilibrada, onde cada um desempenha seu papel na dinâmica natural. Seja por meio de ações individuais, colaborativas ou pelo simples cumprimento da cadeia alimentar, todos contribuem para o funcionamento do ambiente. Graças ao esforço dos insetos, novas plantas brotam em regiões antes ameaçadas, e animais de todos os tamanhos garantem alimento e abrigo.
O Brasil é o país mais biodiverso do mundo e a Classe Insecta é a mais diversa do planeta, dominante em quase todos os ecossistemas. Para se ter uma ideia, o número de espécies de insetos que habitam nosso planeta ainda não é conhecido com exatidão, e muitos cientistas ainda discutem se tal número pode estar próximo a 2 milhões, ou passa de 30 milhões.
Mesmo perante a menor das expectativas, de aproximadamente 1 milhão de espécies conhecidas e catalogadas, o número ainda é muito expressivo, se comparado à variedade de espécies de vegetais, microrganismos e animais vertebrados, como observado no infográfico a seguir:

Nesse cenário, os insetos destacam-se como elementos indispensáveis para manter o equilíbrio da vida na Terra. Mesmo assim, esses importantes animais enfrentam problemas, desde a repulsa que alguns sentem, até um declínio populacional causado por diversas atividades humanas. É aí que entra a importância das coleções entomológicas, que nos ajudam a compreender a diversidade e a relevância dos insetos na vida terrestre.
O que é entomologia?
A curadora do Herbário da UEM (HUEM) e professora do Departamento de Biologia, Maria Auxiliadora Milaneze Gutierre, define a Entomologia como uma das partes da Zoologia, ciência que estuda os animais. “As coleções entomológicas são formadas por amostras coletadas e preservadas que são secas, organizadas e enumeradas, sempre contendo uma ficha de informações sobre o local de coleta e alguns aspectos de seu comportamento, com data e nome da pessoa que realizou a coleta”, diz Maria Auxiliadora.
Para entendermos melhor o que é Entomologia, o C2 preparou um vídeo que explora o significado da palavra e a relevância dessa área científica! Confira:
No Museu Dinâmico Interdisciplinar da Universidade Estadual de Maringá (MUDI/UEM), a Coleção Entomológica da Professora Yoko Terada é motivo de orgulho. Organizada por Yoko Terada (1946-2000) e seus alunos, entre as décadas de 1970 e 1990, a coleção conta com mais de 8.700 espécimes de insetos conservados a seco.
O material completo encontra‐se à disposição de pesquisadores do MUDI, com uma parte em exposição para o público que visita o museu. A entrada é gratuita e as visitas podem ser agendadas para grupos, escolas ou de forma espontânea. No site Notícias do MUDI há informações sobre dias e horários de funcionamento, inclusive para visitas noturnas.

Abelhas em destaque
Como a linha de pesquisa da professora Yoko Terada era a Polinização, grande parte da coleção entomológica do MUDI é composta por abelhas. “Quando consideradas apenas as espécies nativas do Brasil, o acervo representa um conhecimento importante da nossa biodiversidade, uma vez que contém espécimes das cinco famílias de abelhas que ocorrem no Brasil, representando 51 gêneros, 68 espécies e 82 morfoespécies1 de abelhas nativas solitárias ou sociais, com ou sem ferrão”, aponta Maria Auxiliadora.
Indo mais além, esses números exemplificam a importância histórica da coleção para a comunidade acadêmica. Até 2007, ela abrigava exemplares de 17% das abelhas nativas conhecidas no estado do Paraná, totalizando 400 espécies. A nível nacional, quando considerada a diversidade de abelhas ainda em estudo (incluindo espécies e morfoespécies), o acervo do MUDI equivale a 7,6% das espécies de abelhas estimadas para todo o território brasileiro.
A Coleção Entomológica Yoko Terada no acervo do Mudi (Foto/Mudi) A Coleção Entomológica Yoko Terada no acervo do Mudi (Foto/Mudi) A Coleção Entomológica Yoko Terada no acervo do Mudi (Foto/Mudi) A Coleção Entomológica Yoko Terada no acervo do Mudi (Foto/Mudi) A Coleção Entomológica Yoko Terada no acervo do Mudi (Foto/Mudi) A Coleção Entomológica Yoko Terada no acervo do Mudi (Foto/Mudi) A Coleção Entomológica Yoko Terada no acervo do Mudi (Foto/Mudi)
Maria Auxiliadora destaca que as abelhas estão envolvidas em importantes relações ecológicas, dentre as quais está a manutenção da flora nativa e o aumento da produtividade de culturas agrícolas, pois são responsáveis pela polinização das flores e, consequente, pela reprodução sexuada da maioria das espécies de angiospermas2. “Durante a polinização, na busca por recursos florais, as abelhas levam os grãos de pólen de uma flor para outra, proporcionando a chegada dos gametas masculinos ao estigma da flor, culminando na formação de frutos e sementes viáveis”, aponta a professora.
No estado do Paraná, foram identificadas 35 espécies de abelhas-sem-ferrão. Contudo, pouco se sabia sobre a diversidade dessas espécies na região Norte do estado, especialmente em Maringá e arredores, antes das amostras armazenadas na coleção da professora Yoko Terada.
As pesquisas realizadas no âmbito do projeto “Abelhas-sem-ferrão no Museu Dinâmico Interdisciplinar: a educação não formal a serviço da preservação ambiental” revelaram que 34% dessas abelhas registradas no Paraná e 5% das espécies conhecidas no Brasil, ocorrem na região de Maringá.
Entomologia é… preservação!
Embora a grande importância das abelhas nativas e seus serviços ecossistêmicos estejam muito bem documentados em pesquisas, tal grupo de animais vem sofrendo, há muitas décadas, com as ações antrópicas negativas ao meio ambiente.
“O impacto humano, ao promover a retirada das florestas nativas, destrói os locais usados para a construção dos ninhos das abelhas, assim como as fontes de recursos para sua sobrevivência, causando a diminuição da diversidade destes insetos em todo o mundo”, alerta Maria Auxiliadora.

As coleções de insetos têm um papel fundamental em diversos estudos, abrangendo áreas como biodiversidade, com foco em aspectos ambientais e ecológicos; agricultura, seja na análise de insetos-praga que afetam plantações, seja na identificação de agentes polinizadores ou controladores biológicos de pragas; saúde pública, ao investigar insetos transmissores de doenças; e até mesmo biologia forense, contribuindo com evidências para a resolução de crimes.
Para a professora Maria Auxiliadora, a preservação das coleções entomológicas é indispensável para o monitoramento das espécies de insetos em determinadas localidades. “Somente com a manutenção das coleções entomológicas poderemos saber quais são as espécies de insetos de determinado local, se ainda ali permanecem ou não, tendo em vista as grandes alterações ambientais relacionadas às ações antrópicas”, defende.
O museu
Originalmente, a coleção foi destinada ao Museu da Bacia do Paraná, também vinculado à UEM, mas em 2009 foi transferida definitivamente para o MUDI, onde recebeu o nome em homenagem à professora Yoko. O acervo ainda inclui alguns espécimes de insetos coletados na década de 1970, antes mesmo de a professora Yoko ingressar na UEM. O exemplar mais antigo de abelha na coleção é uma Epicharis flava (abelha-de-óleo), coletada no Campus Sede em 13 de março de 1975 e assinado por A. Nakan.
Centenas de visitantes exploram o espaço do Mudi todas as semanas. A maioria é de estudantes da Educação Básica de Maringá e região, buscando complementar os assuntos vistos em sala de aula, ou simplesmente visitam esse museu de ciências para desfrutar de um dia diferente da rotina escolar, mas sem fugir do viés educativo.
“Seja qual for seu objetivo, no MUDI o visitante tem a oportunidade de aprender sobre os insetos, em especial, as abelhas, e por meio do conhecimento adquirido, modificar concepções sobre os animais expostos, alguns que, às vezes, passam por nós despercebidos, mas que são fundamentais para o equilíbrio ecológico do planeta”, defende Maria Auxiliadora.
Ao resguardar exemplares de diversas espécies, muitas das quais ameaçadas ou pouco conhecidas, a Coleção Entomológica da Professora Yoko Terada contribui para o estudo e a conservação da biodiversidade brasileira.
Disponível para visitação em um espaço educativo e aberto para a comunidade, a coleção promove o entendimento do papel crucial dos insetos nos ecossistemas, como polinizadores, controladores de pragas e agentes de equilíbrio ambiental. Essa iniciativa, dedicada à preservação da memória científica, promove uma atitude de respeito e cuidado com o meio ambiente, servindo como inspiração para quem visita o museu.
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Texto: Guilherme de Souza Oliveira
Colaboração: Maria Auxiliadora Milaneze Gutierre
Revisão: Silvia Calciolari
Supervisão de Texto: Ana Paula Machado Velho
Edição de vídeo: Yumi Aoki
Arte: Hellen Vieira
Supervisão de arte: Tiago Franklin Lucena
Edição Digital: Gutembergue Junior
Glossário
- Morfoespécie – Grupo de organismos que difere em algum aspecto morfológico de todos os outros grupos. ↩︎
- Angiosperma – Plantas cujas sementes são protegidas por uma estrutura denominada fruto. Também conhecidas por magnoliófitas ou antófitas, possuem raiz, caule, folha, flores, semente e fruto. ↩︎
A pesquisa que mencionamos contribui para os seguintes ODS:

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