Comecei uma pesquisa para dar conta de uma pauta sobre a presença feminina na ciência e fazer um texto que pudesse ser publicado na ocasião do Dia Internacional da Mulher, 8 de março. Como sou jornalista da Universidade Estadual de Maringá (UEM), no Paraná, entrei no site de notícias da Instituição. Joguei umas palavras-chave na caixinha “search” e o resultado me chamou a atenção. O conteúdo comprova o que já imaginávamos: as mulheres que vivem no universo da ciência ainda têm menos visibilidade e oportunidades que os homens no universo acadêmico. Então, decidi usar o conteúdo dos textos que emergiram da busca para construir minha argumentação nesta matéria, que pode ser considerada mais um artigo.
Vamos lá, então. Um dos textos produzidos e postados no site da Assessoria de Comunicação da UEM, a ASC, informava que a Universidade avançou no ranking 2024 de pesquisadores mais citados do mundo. Matéria de novembro do ano passado. A lista reúne 2% dos cientistas mais influentes do planeta e é elaborada, anualmente, pela Universidade de Stanford (EUA), em parceria com a renomada editora Elsevier. Doze pesquisadores da UEM estão no ranking, eram nove, em 2023. Porém, só há uma mulher citada nos dois períodos.
Por outro lado, uma reportagem comemorava um marco da Universidade de Maringá. “Desde 2019, a UEM lidera o ranking brasileiro na proporção de autorias femininas em comparação às masculinas”, diz a matéria sobre o Leiden Ranking, elaborado pelo Centro de Estudos em Ciência e Tecnologia (CWTS), da Universidade de Leiden, na Holanda.
Foi registrado que a Universidade está em primeiro lugar no Brasil em produção científica liderada por mulheres e é a 19ª universidade com maior produção científica feminina no mundo entre as 1.506 universidades analisadas, no período de 2019 a 2022, isto é, desde que o CWTS introduziu o indicador de gênero na classificação.
Com 53,3% de pesquisadoras, a UEM mantém, há seis anos consecutivos, a liderança entre as universidades das Américas e do Hemisfério Sul, posição que também se repete há seis anos consecutivos. No entanto, lembro aqui, só uma aparece no ranking dos cientistas mais influentes do mundo. Infelizmente, isso reflete uma realidade: as mulheres publicam menos artigos científicos do que os homens em todo o planeta, a UEM é exceção.

A pesquisadora citada no ranking da Stanford/Elsevier é a professora Rosângela Bergamasco, do Departamento de Engenharia Química (DEQ). Na reportagem publicada pela ASC, consta que ela possui mais de 30 anos de experiência em Engenharia Sanitária e Química.

Bergamasco tem se dedicado a pesquisas voltadas ao meio ambiente com foco no tratamento de efluentes, resíduos sólidos e na obtenção de água potável. Atualmente, essas investigações concentram-se na remoção de contaminantes emergentes presentes na água consumida pela população.
A reportagem mostra que Rosângela aponta um crescimento na presença feminina na pesquisa científica. Atribui isso ao aumento de editais do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq); da Coordenação de Aprimoramento de Pessoal de Ensino Superior (Capes); da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep); e da Fundação Araucária, a agência de incentivo à pesquisa do Paraná. Essas organizações destinam um percentual específico para projetos conduzidos por mulheres. “Estes editais têm incentivado cada vez mais nós, pesquisadoras, a atuarmos na ciência, garantindo nosso espaço.”
A professora lembrou, por exemplo, que o CNPq vai premiar pesquisadoras pelo valor de seu trabalho científico a partir deste ano. O Conselho lançou o Prêmio Mulheres e Ciência, em que investirá cerca de R$ 500 mil em prêmios.
Outro aspecto importante destacado no texto é o fato de que Bergamasco acredita que o perfil feminino pode influenciar positivamente os resultados de uma pesquisa científica. “Por sermos mais observadoras, mais detalhistas, enxergamos coisas minuciosas, habilidade importante para a pesquisa científica. Esta é uma característica das mulheres. Temos este diferencial e habilidades para atuarmos em qualquer emprego”, disse a professora à equipe da ASC.
Por outro lado, Rosângela lembra que não há uma carreira estruturada para pesquisadores e pesquisadoras. Se isso fosse realidade no Brasil, haveria, segundo ela, mais estímulo para que as estudantes ingressassem na pesquisa. Para a docente, enquanto não for uma profissão, a maioria das mulheres vai acumular as funções de professora e pesquisadora, fora todas as outras atividades do cotidiano que ficam sob responsabilidade das representantes femininas das famílias.

O depoimento de Bergamasco termina com um pedido àquelas que estão iniciando as carreiras: não desanimem! “Não tenham medo. Hoje, está mais fácil. Os desafios são grandes em qualquer profissão, mas as condições, hoje, são bem melhores”, concluiu Bergamasco, lembrando que, quando começou a fazer o curso de Engenharia Química, apenas 20% de sua turma eram mulheres.
Mais dedicação
Adentrando outros links trazidos pela minha pesquisa no site da Assessoria de Comunicação da UEM encontrei uma nova conversa da equipe. Desta vez, com a professora e pesquisadora do Departamento de Ciências Básicas da Saúde (DBS), Jeane Laguila Visentainer. Ela também acumula mais de 30 anos de experiência na área de Imunologia, com ênfase em Imunogenética e Imunohematologia.
Diferente de Bergamasco, Jeane diz que não teve muitas dificuldades na carreira por ser mulher, porque a área dela, Farmácia e Bioquímica, sempre contou com muitas estudantes e profissionais do sexo feminino.
Mas, assim como a colega da Engenharia Química, a professora defende que as mulheres, geralmente, se dedicam muito ao que fazem e acabam trabalhando com mais afinco, porque querem obter resultados. “Muitas vezes, têm mais humanidade, o que faz parte da essência feminina. Elas tendem a ser mais sentimentais, buscando soluções, especialmente na área da saúde, por empatia com as pessoas que enfrentam determinadas doenças”, argumenta.

Atualmente, Jeane é uma das responsáveis pelo Laboratório de Imunogenética (LIG-UEM), que realiza exames de compatibilidade para transplantes de medula óssea e renal. Eles são oferecidos aos 30 municípios da 15ª Regional de Saúde, além de outras regiões, conforme determinação da Central de Transplantes do Estado do Paraná. Ela também orienta vários acadêmicos do curso de Pós-Graduação em Biociências e Fisiopatologia em estudos de associação genética e doenças.
Diversidade na UEM
Em um texto de 2022, a ASC entrevistou a professora e pesquisadora Marcia Edilaine Lopes Consolaro. A farmacêutica-bioquímica é docente do Departamento de Análises Clínicas e Biomedicina da UEM, e coordena o Programa de Pós-Graduação em Biociências e Fisiopatologia, além de diversos projetos nacionais e internacionais em pesquisas em HPV e câncer cervical; infecções sexualmente transmissíveis; e arboviroses.

À época da publicação da reportagem, Márcia era diretora de Pós-Graduação da UEM. Analisando o ranking da Universidade de Leiden, que já destacava a Universidade, disse que essas conquistas mostravam que a Instituição vivia um ambiente bastante inclusivo em termos de políticas de diversidade de gênero e de empoderamento das mulheres. Mas, esta não é a percepção atual!
“Isso pode ser evidenciado pela proporção muito pequena de mulheres ocupando cargos de liderança, como por exemplo as pró-reitorias e as diretorias. Este fato pode ser ou tornar-se um reflexo da inclusão ou não das mulheres em diferentes aspectos da vida acadêmica da universidade, o que é muito preocupante”, destacou.
A docente reconhece que, no mundo, apesar de avanços marcantes, as oportunidades para protagonismo feminino têm sido poucas. As mulheres precisam vencer muitos desafios! As disparidades continuam gritantes, o que também se observa na área científica, onde, de maneira geral, as mulheres representam apenas 1/3 dos cientistas no mundo.
“Acredito que a UEM precisa repensar e adotar novas estratégias para inclusão de mulheres nos diferentes segmentos da atuação acadêmica, inclusive quanto à ocupação de cargos de liderança. Isto para que o ambiente interno da universidade seja cada vez mais inclusivo, o que, com certeza, se refletirá na formação de profissionais que transformarão a realidade social”, reforça Marcia Consolaro.
Espaço de discussão
Para discutir essas questões, destaquei entre as reportagens que achei no site da UEM, que, em outubro do ano passado, o Departamento de Matemática (DMA) organizou o I Workshop da Sociedade Brasileira de Matemática de Mulheres na Matemática. O evento reuniu mulheres que atuam na docência e na pesquisa matemática em todas as regiões do Brasil e em todos os níveis de ensino.
Segundo a equipe da organização, o objetivo do Workshop era promover a discussão sobre a questão de gênero na área de Ciências Exatas e a maior representatividade feminina na área de pesquisa e ensino no Brasil. Durante três dias, foram realizadas plenárias, mesas-redondas, rodas de conversa, sessão de pôsteres e autógrafos, oficinas e minicursos.
De acordo com a professora do DMA e organizadora do evento, Valéria Cavalcanti, em depoimento à ASC, embora a presença de mulheres seja similar a dos homens nos cursos de graduação em Matemática, ela diminui drasticamente em cursos de pós-graduação e cargos mais altos. E mais: 8% das bolsas do CNPq em Matemática e Estatística são concedidas para as mulheres, o que demonstra a desigualdade.

“Chamamos esse processo de ‘efeito tesoura’. Assim, buscamos promover o interesse das meninas pela Matemática desde cedo, combater estigmas e desestímulos enfrentados por elas, e criar um ambiente de apoio para a continuidade de suas carreiras acadêmicas e científicas. Além disso, precisamos discutir assédio, maternidade e a diversidade no ambiente acadêmico, onde ainda prevalece uma cultura masculina. A meta é reduzir disparidades e alcançar igualdade em todos os níveis da carreira”, detalhou Cavalcanti na reportagem publicada pela Assessoria da UEM.
A coordenadora destacou, porém, na ocasião do Encontro, que esse tema tem que estar na pauta de preocupação de todos, independentemente de gênero, formação escolar ou acadêmica. “Os homens precisam saber o que a gente está discutindo, precisam entender as nossas angústias e anseios, para que possam nos ajudar também.”
Para não terminar essa reflexão sem boas notícias, trago a informação da Agência Brasil, que aponta para a direção de que nem tudo está perdido. Segundo a Agência, nos últimos 20 anos, a proporção de pesquisadoras que assinam publicações científicas no país saltou de 38% para 49%. O Brasil é o terceiro colocado na lista dos países com maior participação feminina na ciência, que conta com 18 nações mais a União Europeia. Os dados constam do relatório da Elsevier-Bori Em direção à equidade de gênero na pesquisa no Brasil. Será que dá pra comemorar? Feliz Dia Internacional da Mulher!
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Texto: Ana Paula Machado Velho
Arte: Mariana Muneratti e Hellen Vieira
Supervisão de arte: Hellen Vieira
Edição Digital: Guilherme Nascimento
A pesquisa que mencionamos contribui para os seguintes ODS:

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