Eleições municipais: para quem vai seu (valioso) voto?

Esta arte utiliza uma paleta de tons frios com um mapa estilizado de fundo, destacando uma urna eletrônica no centro, cercada por um explosivo vermelho. Uma mão em tons de rosa e preto interage com a urna, sugerindo o ato de votar, com detalhes de um toque simbólico e energizado.
Seguindo uma arriscada tradição, os brasileiros decidem em quem votar no último instante; depois ficam frustrados e culpam o candidato e a política

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No próximo dia 6 de outubro, 150 milhões de brasileiras e brasileiros de 5.569 cidades estarão aptos a estar na solidão da cabine, diante da urna eletrônica. Vão escolher prefeitos e vereadores para um mandato que começa em 2025 e termina em 2028. De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral,  29 partidos receberão aproximadamente R$ 5 bilhões, valor estabelecido pelo Congresso Nacional para gastos com a corrida eleitoral, em 2024. 

Durante quatro anos, os eleitos serão responsáveis por decidir como será a cidade em que você, sua família e amigos vivem, estudam, trabalham, se divertem e buscam uma vida digna com segurança e perspectivas de futuro.

O que para muitos é um direito garantido pela democracia, para outros é algo assim: “ahhh, mas eu não gosto de política e só voto porque sou obrigado”. 

Diante dessa recorrente e temerosa afirmação, nunca é demais relembrar Platão, filósofo grego que viveu entre 428-348 antes de Cristo: “Quem não gosta de política, está condenado a ser dirigido por aqueles que gostam.”

E pelo número de candidatos que surge a cada eleição, parece que há pessoas que gostam de política e estão se aproveitando dessa gente que não se preocupa em dar qualidade ao voto e, consequentemente, à democracia.

A imagem apresenta o título: "Registros de candidatos a prefeito/a em 2024 nos 5.568 municípios brasileiros", e fornece uma análise da distribuição de candidatos a prefeito em relação ao número de concorrentes por município.
A ilustração central é uma representação de uma urna eletrônica estilizada, onde os números e os blocos indicam as proporções de municípios conforme a quantidade de candidatos. Ao lado esquerdo da imagem, há uma legenda com cores variando do verde claro ao azul escuro, cada uma representando o número de candidatos e a porcentagem de municípios com aquela quantidade. As informações da legenda são:
1 candidato - 217 municípios (3,9%)
2 candidatos - 2.733 municípios (49,1%)
3 candidatos - 1.511 municípios (27,1%)
4 candidatos - 645 municípios (11,6%)
5 candidatos - 274 municípios (4,9%)
6 candidatos - 112 municípios (2%)
7 candidatos - 47 municípios (0,8%)
8 candidatos - 19 municípios (0,3%)
9 candidatos - 9 municípios (0,2%)
10 candidatos - 6 municípios (0,1%)
11 candidatos - 1 município (0%)
Esses dados são representados visualmente no lado direito da urna, com proporções e cores correspondentes a cada grupo. No rodapé da imagem, está a fonte: Fonte: CPOP/UFPR e os créditos do infográfico: © Conexão Ciência | Infográfico: Lucas Higashi.

Já parou para pensar que se a política fosse tão ruim assim, como algo que não tem serventia, por que as sociedades modernas, a exemplo das antigas da época de Platão, ainda insistem nesse tipo de representação política?

Oras, é porque a política está relacionada com aquilo que diz respeito ao bem público, à vida em comum, às regras, leis e normas de conduta no espaço social. Ou seja, a política foi criada para regular os conflitos sociais. No fim das contas, tudo é política.

O Brasil já viveu décadas em que as pessoas não podiam votar e os governantes eram indicados e nomeados para cargos como prefeitos e governadores pelo regime militar que implantou no Brasil a ditadura, a partir do golpe de 1964. E, acredite, se está ruim com democracia, pior sem ela.

Discurso moderado

Afinal, se a política é tão importante, por que há muitos candidatos que se valem de ataques à política e aos políticos ‘tradicionais’ e até à urna eletrônica? Nos últimos anos, vivemos um período de constantes investidas à democracia e às instituições, o que cria instabilidade e fragiliza o nosso sistema político. 

Para o professor do Departamento de Ciências Sociais, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Emerson Urizzi Cervi, há uma aflição na base social de sustentação da democracia. “Essa crise é identificada como um ataque à democracia por dentro. Autocratas usando as ferramentas democráticas,  as regras democráticas, disputam espaço de representação para combater a democracia”. 

A imagem mostra um homem de pele clara, cabelos grisalhos e curtos, vestido com uma camisa social clara, de manga longa e sem gravata. Ele está segurando um microfone com a mão direita e um apresentador de slide na mão esquerda. O homem parece estar fazendo uma apresentação ou dando uma palestra, enquanto olha para o lado esquerdo da imagem, em direção à audiência ou a uma tela que aparece ao fundo. A tela está ligada, mas o que é exibido nela não é totalmente visível. O fundo é claro e neutro, sem muitos detalhes.
Emerson Urizzi Cervi é coordenador do Grupo de Pesquisa em Comunicação Política e Opinião Pública (Cpop) na UFPR (Foto/Arquivo pessoal)

Embora em eleições municipais se discutam questões mais objetivas e relacionadas ao dia a dia do cidadão, especialmente nas médias e grandes cidades, o resultado irá influenciar a próxima disputa nacional, em 2026. Isso porque os prefeitos e vereadores eleitos agora serão os cabos eleitorais dos próximos deputados estaduais e federais, senadores e governadores. E em 2028, começa tudo de novo. Um eleitor que compreende essa dinâmica, consegue ter um voto de maior qualidade.

Quem conhece os meandros da política afirma que a eleição municipal é a mais difícil na definição do voto. Os candidatos precisam disputar, de fato, no corpo a corpo. Nessas condições, o eleitor conhece o candidato e as possíveis alternativas, além do histórico de cada um. Na visão de Cervi, em geral, nas nossas eleições de meio termo que antecedem o pleito nacional esse discurso mais ideológico e abstrato tem menos força, tem menos impacto.

“O Brasil é uma imensidão de pequenos municípios, como algumas ilhas de grandes metrópoles. Esses grandes municípios reúnem a maioria dos eleitores, é verdade. Mas se a gente olhar para os eleitos, a imensa maioria dos 5.579 prefeitos é eleita por 3 mil votos, 4 mil votos, nem isso, às vezes”, pondera Cervi.

Para o caso do Paraná, o professor confirma sua tese. “Percebe-se que, no Paraná, Curitiba é um grande centro bolsonarista e lava-jatista, é a origem da Operação Lava-jato. Nós não tivemos, na capital, nenhum candidato lava-jatista ou bolsonarista de fato. O bolsonarismo, na verdade, se dividiu em duas candidaturas para entrar como vice e não apresentou candidato”. É o que se verifica também nas cidades de médio porte. 

A imagem apresenta um fundo azul médio com um título em preto na parte superior que diz: "Eleitor esperto, a Democracia agradece!". Abaixo, há uma lista de cinco pontos, escritos em roxo sobre um fundo azul mais claro, com dicas para o eleitor ficar atento na hora de escolher seu candidato nas eleições municipais:
1.   Seja prudente com informações e recomendações vindas por aplicativos de mensagens.
2.   Procure ouvir o que o candidato pensa da sua cidade, fala e promete.
3.  Busque referências sobre o partido, tempo de filiação, correligionários e quem o financia.
4.   Dê um Google para conhecer a vida do candidato, dentro e fora do espaço público.
5.   Se for possível, participe de um evento de campanha para conhecer as propostas.
No canto superior esquerdo da imagem, há uma ilustração de uma pessoa de pele marrom, cabelo curto e preto, com uma expressão de discurso ou argumento. O braço direito está levantado, apontando para o texto. No rodapé da imagem, há os créditos: © Conexão Ciência | Arte: Mariana Muneratti.

O professor dá a dica: “a eleição municipal é muito mais pragmática. Os políticos que exploram o discurso ideológico têm mais dificuldade de se eleger”. Por isso que, antes de definir o voto, é importante conhecer a qual partido e grupo político seu candidato pertence, mesmo que essa liderança não apareça nas propagandas. 

Visão de mundo

E como fica o eleitor nesse momento? Ou ele adota o discurso que criminaliza a política, ou liga o radar e tira um tempo para buscar informações sobre os candidatos que estão com as candidaturas deferidas. Antes da hora de definição do voto, é importante verificar se os nomes que te atraem possuem uma vida política coerente com a visão de mundo que você acredita ser a ideal para uma vida em paz. É melhor estratégia para não se frustrar. 

Imagine se você tiver que contratar uma pessoa ou equipe para administrar e resolver os problemas da sua casa. Você irá dar total liberdade para que escolham, em seu lugar, tudo o que é preciso ser feito, isso sem a sua participação nas decisões. 

Você ficaria confortável em ter alguém que você não conhece, não foi recomendado por ninguém? Nem se daria ao trabalho de pesquisar a experiência ou antecedentes da pessoa ou empresa? É complicado: vão usar o seu dinheiro para decidir como você viverá nos próximos quatro anos. Pensa na tragédia!

Assim é a cidade, uma extensão da nossa casa. Cada decisão dos eleitos afeta diretamente você e a população em geral. A eleição municipal é aquela que o voto de qualidade fará toda a diferença nos serviços essenciais como os de saúde, educação, segurança e até o mais básico como varrição das ruas, coleta e destinação de resíduos urbanos.

Agora, mesmo que você pense “eu não tô nem aí, porque é só um voto e não faz diferença”, nem tudo está perdido. Opções não faltam quando pensamos em maior representação de mulheres, racial, indígenas e LGBTQIA +, entre outros segmentos. Na busca, basta ter consciência de que o seu voto, somado a todos os outros, vale muito quando o objetivo é avançar em qualidade de vida, justiça social, inclusão e gestores públicos que cumpram com a sua função que é servir a população. 

A imagem apresenta o título em destaque: "Números da disputa a vereador/a em 2024", com informações sobre a candidatura e distribuição de gênero nas eleições municipais para vereador no Brasil.
No centro da imagem, há um mapa do Brasil dividido em duas cores:
34% representados pela cor verde claro, que correspondem às mulheres.
66% representados pela cor azul, que correspondem aos homens.
Ao lado direito do mapa, há informações adicionais:
150 milhões de eleitores.
5.569 Câmaras Municipais.
58.000 vagas, com um asterisco indicando que o número exato depende da consolidação dos dados sobre a população de cada cidade.
Na parte inferior, aparecem os números:
427.481 registros de candidaturas.
Há uma legenda que indica as cores utilizadas:
Verde para mulheres.
Azul para homens.
No rodapé, aparecem as fontes: Fonte: TSE. © Conexão Ciência | Infográfico: Lucas Higashi.

Como se livrar das arapucas?

O professor Emerson Urizzi Cervi coordena o grupo de pesquisa em Comunicação Política e Opinião Pública (Cpop) da UFPR. São anos de experiência em pesquisas e publicações nas áreas de debate e opinião pública, eleições, partidos, comunicação eleitoral, financiamento de campanhas e metodologia de pesquisa. 

Este ano, o Grupo Cpop de pesquisa está avaliando os comentários das pessoas que assistem os debates de candidatos a prefeito do Paraná e qualificando a opinião manifestada de cada candidato. Em seu perfil no Facebook, Cervi antecipa algumas análises que ainda serão sistematizadas pelo grupo, após o final da disputa.

Ele ressalta que, em 2024, as eleições municipais apresentaram menos candidatos no geral, em função da reforma eleitoral aprovada em 202, que criou as federações partidárias e diminuiu as vagas de cada partido. O tempo de propaganda gratuita no rádio e tv foi pulverizado, o que restringe ainda mais o acesso do eleitor aos candidatos. 

Assim, o eleitor não teve muito tempo para buscar e elaborar as informações que chegam, na maioria dos casos, por meio de programas bem produzidos, totalmente roteirizados, o que não dá margem para qualquer debate. E é aí que há grandes chances de haver arrependimentos do voto.

“Se eu tenho um candidato que está se apresentando, mas o discurso dele é contra a política, eu devo ficar atento. E isso acontece mais nas candidaturas a vereador, mas também pode acontecer a prefeito. Se esse candidato for eleito, ao invés de atuar para que a política funcione a favor do segmento da sociedade, ele vai atuar contra. E isso é uma armadilha para o eleitor”, alerta Cervi.

Outra prudência é com aquele empresário bem sucedido, com uma propaganda de primeiro mundo, mas que como administrador público não consegue seguir a Lei de Responsabilidade Fiscal. “Exatamente por isso que muitos são condenados por improbidade administrativa. Alguns nem são acusados de roubar, apenas não dominam o rito e o arcabouço legal no trato da coisa pública”, completa o professor da UFPR. 

A imagem apresenta um fundo verde com um título em branco na parte superior que diz: "Se o candidato não souber discutir, desconfie!". Abaixo, há uma lista de cinco pontos, escritos em branco sobre um fundo escuro, relacionados a temas importantes para candidatos em discussões eleitorais:
Como desenvolver as funções sociais da cidade e garantir o bem-estar dos habitantes.
Sugestões para ofertar Saúde e Educação de qualidade para toda a coletividade.
Definir o zoneamento urbano e a construção de uma cidade inclusiva e com diversidade.
Emergência climática e propostas para preparar a cidade para os extremos do clima.
Valorizar a política como a única forma de mudar a vida das pessoas.
No canto inferior direito da imagem, há uma ilustração de uma pessoa de pele marrom, cabelo curto e preto, com uma expressão de discurso ou argumento. O braço direito está levantado, apontando para o texto.
No rodapé da imagem, há os créditos: © Conexão Ciência | Arte: Mariana Muneratti.

Dizem as más línguas que a política e a disputa de eleições não é para amadores. Mas, em certo sentido, é bom para o campo político não ser um espaço para aventureiros, como já foram no passado os radialistas e agora os influencers, delegados, pastores, coaches

Com a popularização da Inteligência Artificial e advento das fake news, é preciso estar atento e, diante da mais remota dúvida, acesse o portal do TSE que traz informações detalhadas de como escolher o seu candidato

Depois de todo o trabalho para determinar quem será seu candidato e confirmar na urna a decisão, o eleitor não deve baixar a guarda. No dia seguinte à divulgação dos eleitos, começa a parte que dura quatro anos, a de acompanhar os mandatos, o que, certamente, ajudará na próxima eleição.

A democracia agradece!

EQUIPE DESTA PÁGINA
Texto:
Silvia Calciolari
Supervisão de Texto: Ana Paula Machado Velho
Arte: Mariana Muneratti e Lucas Higashi
Supervisão de arte: Tiago Franklin Lucena
Edição Digital: Gutembergue Junior

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