No próximo dia 6 de outubro, 150 milhões de brasileiras e brasileiros de 5.569 cidades estarão aptos a estar na solidão da cabine, diante da urna eletrônica. Vão escolher prefeitos e vereadores para um mandato que começa em 2025 e termina em 2028. De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral, 29 partidos receberão aproximadamente R$ 5 bilhões, valor estabelecido pelo Congresso Nacional para gastos com a corrida eleitoral, em 2024.
Durante quatro anos, os eleitos serão responsáveis por decidir como será a cidade em que você, sua família e amigos vivem, estudam, trabalham, se divertem e buscam uma vida digna com segurança e perspectivas de futuro.
O que para muitos é um direito garantido pela democracia, para outros é algo assim: “ahhh, mas eu não gosto de política e só voto porque sou obrigado”.
Diante dessa recorrente e temerosa afirmação, nunca é demais relembrar Platão, filósofo grego que viveu entre 428-348 antes de Cristo: “Quem não gosta de política, está condenado a ser dirigido por aqueles que gostam.”
E pelo número de candidatos que surge a cada eleição, parece que há pessoas que gostam de política e estão se aproveitando dessa gente que não se preocupa em dar qualidade ao voto e, consequentemente, à democracia.
Já parou para pensar que se a política fosse tão ruim assim, como algo que não tem serventia, por que as sociedades modernas, a exemplo das antigas da época de Platão, ainda insistem nesse tipo de representação política?
Oras, é porque a política está relacionada com aquilo que diz respeito ao bem público, à vida em comum, às regras, leis e normas de conduta no espaço social. Ou seja, a política foi criada para regular os conflitos sociais. No fim das contas, tudo é política.
O Brasil já viveu décadas em que as pessoas não podiam votar e os governantes eram indicados e nomeados para cargos como prefeitos e governadores pelo regime militar que implantou no Brasil a ditadura, a partir do golpe de 1964. E, acredite, se está ruim com democracia, pior sem ela.
Discurso moderado
Afinal, se a política é tão importante, por que há muitos candidatos que se valem de ataques à política e aos políticos ‘tradicionais’ e até à urna eletrônica? Nos últimos anos, vivemos um período de constantes investidas à democracia e às instituições, o que cria instabilidade e fragiliza o nosso sistema político.
Para o professor do Departamento de Ciências Sociais, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Emerson Urizzi Cervi, há uma aflição na base social de sustentação da democracia. “Essa crise é identificada como um ataque à democracia por dentro. Autocratas usando as ferramentas democráticas, as regras democráticas, disputam espaço de representação para combater a democracia”.
Embora em eleições municipais se discutam questões mais objetivas e relacionadas ao dia a dia do cidadão, especialmente nas médias e grandes cidades, o resultado irá influenciar a próxima disputa nacional, em 2026. Isso porque os prefeitos e vereadores eleitos agora serão os cabos eleitorais dos próximos deputados estaduais e federais, senadores e governadores. E em 2028, começa tudo de novo. Um eleitor que compreende essa dinâmica, consegue ter um voto de maior qualidade.
Quem conhece os meandros da política afirma que a eleição municipal é a mais difícil na definição do voto. Os candidatos precisam disputar, de fato, no corpo a corpo. Nessas condições, o eleitor conhece o candidato e as possíveis alternativas, além do histórico de cada um. Na visão de Cervi, em geral, nas nossas eleições de meio termo que antecedem o pleito nacional esse discurso mais ideológico e abstrato tem menos força, tem menos impacto.
“O Brasil é uma imensidão de pequenos municípios, como algumas ilhas de grandes metrópoles. Esses grandes municípios reúnem a maioria dos eleitores, é verdade. Mas se a gente olhar para os eleitos, a imensa maioria dos 5.579 prefeitos é eleita por 3 mil votos, 4 mil votos, nem isso, às vezes”, pondera Cervi.
Para o caso do Paraná, o professor confirma sua tese. “Percebe-se que, no Paraná, Curitiba é um grande centro bolsonarista e lava-jatista, é a origem da Operação Lava-jato. Nós não tivemos, na capital, nenhum candidato lava-jatista ou bolsonarista de fato. O bolsonarismo, na verdade, se dividiu em duas candidaturas para entrar como vice e não apresentou candidato”. É o que se verifica também nas cidades de médio porte.
O professor dá a dica: “a eleição municipal é muito mais pragmática. Os políticos que exploram o discurso ideológico têm mais dificuldade de se eleger”. Por isso que, antes de definir o voto, é importante conhecer a qual partido e grupo político seu candidato pertence, mesmo que essa liderança não apareça nas propagandas.
Visão de mundo
E como fica o eleitor nesse momento? Ou ele adota o discurso que criminaliza a política, ou liga o radar e tira um tempo para buscar informações sobre os candidatos que estão com as candidaturas deferidas. Antes da hora de definição do voto, é importante verificar se os nomes que te atraem possuem uma vida política coerente com a visão de mundo que você acredita ser a ideal para uma vida em paz. É melhor estratégia para não se frustrar.
Imagine se você tiver que contratar uma pessoa ou equipe para administrar e resolver os problemas da sua casa. Você irá dar total liberdade para que escolham, em seu lugar, tudo o que é preciso ser feito, isso sem a sua participação nas decisões.
Você ficaria confortável em ter alguém que você não conhece, não foi recomendado por ninguém? Nem se daria ao trabalho de pesquisar a experiência ou antecedentes da pessoa ou empresa? É complicado: vão usar o seu dinheiro para decidir como você viverá nos próximos quatro anos. Pensa na tragédia!
Assim é a cidade, uma extensão da nossa casa. Cada decisão dos eleitos afeta diretamente você e a população em geral. A eleição municipal é aquela que o voto de qualidade fará toda a diferença nos serviços essenciais como os de saúde, educação, segurança e até o mais básico como varrição das ruas, coleta e destinação de resíduos urbanos.
Agora, mesmo que você pense “eu não tô nem aí, porque é só um voto e não faz diferença”, nem tudo está perdido. Opções não faltam quando pensamos em maior representação de mulheres, racial, indígenas e LGBTQIA +, entre outros segmentos. Na busca, basta ter consciência de que o seu voto, somado a todos os outros, vale muito quando o objetivo é avançar em qualidade de vida, justiça social, inclusão e gestores públicos que cumpram com a sua função que é servir a população.
Como se livrar das arapucas?
O professor Emerson Urizzi Cervi coordena o grupo de pesquisa em Comunicação Política e Opinião Pública (Cpop) da UFPR. São anos de experiência em pesquisas e publicações nas áreas de debate e opinião pública, eleições, partidos, comunicação eleitoral, financiamento de campanhas e metodologia de pesquisa.
Este ano, o Grupo Cpop de pesquisa está avaliando os comentários das pessoas que assistem os debates de candidatos a prefeito do Paraná e qualificando a opinião manifestada de cada candidato. Em seu perfil no Facebook, Cervi antecipa algumas análises que ainda serão sistematizadas pelo grupo, após o final da disputa.
Ele ressalta que, em 2024, as eleições municipais apresentaram menos candidatos no geral, em função da reforma eleitoral aprovada em 202, que criou as federações partidárias e diminuiu as vagas de cada partido. O tempo de propaganda gratuita no rádio e tv foi pulverizado, o que restringe ainda mais o acesso do eleitor aos candidatos.
Assim, o eleitor não teve muito tempo para buscar e elaborar as informações que chegam, na maioria dos casos, por meio de programas bem produzidos, totalmente roteirizados, o que não dá margem para qualquer debate. E é aí que há grandes chances de haver arrependimentos do voto.
“Se eu tenho um candidato que está se apresentando, mas o discurso dele é contra a política, eu devo ficar atento. E isso acontece mais nas candidaturas a vereador, mas também pode acontecer a prefeito. Se esse candidato for eleito, ao invés de atuar para que a política funcione a favor do segmento da sociedade, ele vai atuar contra. E isso é uma armadilha para o eleitor”, alerta Cervi.
Outra prudência é com aquele empresário bem sucedido, com uma propaganda de primeiro mundo, mas que como administrador público não consegue seguir a Lei de Responsabilidade Fiscal. “Exatamente por isso que muitos são condenados por improbidade administrativa. Alguns nem são acusados de roubar, apenas não dominam o rito e o arcabouço legal no trato da coisa pública”, completa o professor da UFPR.
Dizem as más línguas que a política e a disputa de eleições não é para amadores. Mas, em certo sentido, é bom para o campo político não ser um espaço para aventureiros, como já foram no passado os radialistas e agora os influencers, delegados, pastores, coaches.
Com a popularização da Inteligência Artificial e advento das fake news, é preciso estar atento e, diante da mais remota dúvida, acesse o portal do TSE que traz informações detalhadas de como escolher o seu candidato.
Depois de todo o trabalho para determinar quem será seu candidato e confirmar na urna a decisão, o eleitor não deve baixar a guarda. No dia seguinte à divulgação dos eleitos, começa a parte que dura quatro anos, a de acompanhar os mandatos, o que, certamente, ajudará na próxima eleição.
A democracia agradece!
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Texto: Silvia Calciolari
Supervisão de Texto: Ana Paula Machado Velho
Arte: Mariana Muneratti e Lucas Higashi
Supervisão de arte: Tiago Franklin Lucena
Edição Digital: Gutembergue Junior
Glossário
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