Equoterapia: uma aliança entre os animais e a saúde

A ilustração colorida retrata cenas de equoterapia, uma prática terapêutica com cavalos. À esquerda, uma criança sorri ao montar um cavalo, assistida por instrutores. À direita, há interações de cuidado, como alimentar os animais e prepará-los. A arte destaca inclusão, apoio e conexão com a natureza.
O método terapêutico interdisciplinar coloca o cavalo no centro do tratamento de crianças e adolescentes

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O cavalo é um animal com um valor cultural, social e econômico que atravessa gerações em um país como o Brasil. Você já parou pra pensar em quantos espaços ele está presente? Os cavalos são empregados no trabalho rural, como meio de transporte e subsistência local em diversas regiões, aparecem em diferentes esportes como hipismo e corridas, em atividades de lazer como passeios e escolas de equitação, além de eventos culturais.

Mas uma área extremamente importante que os cavalos também estão presentes é a da saúde: nos tratamentos terapêuticos e reabilitações. A equoterapia é uma delas.

O que é a equoterapia?

A equoterapia é um método terapêutico que coloca o cavalo no centro do tratamento, ou seja, o animal auxilia na terapia e reabilitações físicas, psicológicas e sociais dos pacientes. Ela é indicada em diversos casos para pessoas com condições neurológicas ou condições psicológicas e emocionais, pessoas com transtornos do desenvolvimento ou com deficiências físicas e motoras e, ainda, para pacientes com transtornos de aprendizagem e comportamento.

O tratamento é feito de maneira individualizada, pensando nas necessidades e especificidades de cada pessoa. E mais: a equoterapia é considerada um método interdisciplinar, já que demanda uma equipe composta por diversos profissionais, como médicos veterinários, zootecnistas, fisioterapeutas, psicólogos, fonoaudiólogos e instrutores de equitação.

  • A imagem mostra uma criança montada em um cavalo, participando de uma sessão de equoterapia em um campo de terra cercado. Ela está sendo guiada por uma mulher à esquerda, segurando as rédeas do cavalo, enquanto outra mulher à direita demonstra movimentos de equilíbrio com os braços abertos, provavelmente como parte das instruções ou exercícios terapêuticos. A cena ocorre em um ambiente ao ar livre, com vegetação ao fundo, transmitindo um clima tranquilo e de interação.
  • A imagem mostra um ambiente de equoterapia, com um cercado de terra vermelha e pessoas montando cavalos sob a supervisão de instrutores. Ao fundo, o local é rodeado por uma paisagem rural, com gramados, árvores e algumas estruturas simples.

Embora seja oferecida em clínicas e centros especializados particulares, a oferta da equoterapia também pode ser encontrada em universidades e projetos sociais sem fins lucrativos. A existência dessas iniciativas é fundamental para que a prática seja acessível a um número cada vez maior de pessoas. Um desses espaços é o das universidades, como é o caso da unidade de equoterapia vinculada ao Grupo de Estudos, Pesquisa e Extensão em Equideocultura (Gepequi), da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste).

O centro funciona no Setor de Equideocultura, do Núcleo de Estações Experimentais (situado no campus de Marechal Cândido Rondon), sob a coordenação da zootecnista e professora Ana Alix Mendes de Almeida Oliveira, que tinha o sonho de criar algo que incluísse o uso do cavalo para a comunidade. Com muita dedicação e esforço, ela tornou esse sonho realidade.

Crianças com dificuldades psicossociais são o foco principal do projeto. Segundo Ana, as ações são estruturadas para atender de forma holística, isto é, integrando abordagens que promovem desenvolvimento físico, emocional e psicológico. “O uso terapêutico do cavalo é o carro-chefe do nosso trabalho. Temos uma abordagem voltada para crianças com necessidades psicossociais por meio da equitação lúdica”, explica ela.

O método empregado pelo Gepequi combina atividades realizadas em duas etapas que se iniciam após uma entrevista que avalia o grau de necessidade de cada indivíduo atendido. A primeira envolve exercícios no chão. Os praticantes desenvolvem uma conexão sensorial e emocional com o cavalo, aprendendo a cuidar do animal. “A troca do olhar entre a criança e o cavalo é mágica”, conta Ana. 

A segunda etapa é a da montaria, em que a interação com o cavalo trabalha equilíbrio, postura e confiança. Durante as sessões, as crianças cuidam dos animais, aprendem sobre alimentação e manejo, e, gradualmente, se sentem seguras para montar. Com o tempo, passam para selas mais técnicas e avançam em suas habilidades. 

Além do atendimento, o centro promove pesquisas em áreas como nutrição e bem-estar dos cavalos, unindo ensino, pesquisa e extensão. E os resultados do trabalho são evidentes: foi na equoterapia que a Angélica, mãe de Heitor, encontrou um tratamento alternativo e altamente benéfico para o filho.

Nesse trajeto, Heitor e a família conheceram o Gepequi e o menino passou a ter contato com os cavalos da fazendinha da universidade. Heitor é uma criança com Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), superdotação e Transtorno do Desenvolvimento da Coordenação (TDC). 

O TDC faz com que o menino tenha muita flexibilidade e um tônus muscular fraco e, por orientação médica, os pais procuraram o tratamento. O método terapêutico contribuiu em diversos aspectos, segundo Angélica. Ela notou melhora na concentração, na postura e na sociabilidade do filho.

A imagem mostra Heitor montado em um cavalo marrom em um local ao ar livre com chão de terra vermelha. Ele está usando capacete e é orientado por um instrutor com chapéu de palha. Ao fundo, há cercas e árvores, indicando um centro de equitação.
Heitor em uma das sessões de equoterapia da Unioeste (Foto/Arquivo pessoal)

O tratamento com a equoterapia traz uma série de benefícios para quem pratica: emocionais, físicos, sensoriais, cognitivos, sociais e comportamentais. A terapia ajuda no equilíbrio e na postura, na coordenação motora, na melhora da concentração e da sociabilidade.

Muitos desses benefícios estão relacionados ao movimento tridimensional que o cavalo realiza. A médica veterinária e professora da Universidade Estadual do Norte do Paraná (Uenp), Thaís Helena Constantino Patelli, coordena o Núcleo de Equoterapia da universidade e explica que o cavalo é a única espécie que apresenta um movimento tridimensional. “Quando você está em cima de um cavalo, você faz o movimento para cima, para baixo, para frente, para trás, para o lado direito e para o esquerdo, ao mesmo tempo. E esse movimento gera uma infinidade de benefícios”, informa a coordenadora.

Prestes a completar 10 anos de existência em 2025, o Núcleo de Equoterapia “Dr. Raul Hidetoci Mioshi”, da Uenp, tem se dedicado ao tratamento de pessoas com necessidades especiais por meio da interação com cavalos no Campus Luiz Meneghel, em Bandeirantes. Mais uma iniciativa vinda de uma universidade paranaense que oferece esse tipo de método terapêutico gratuitamente. 

Como os cavalos são preparados

Os cavalos usados na equoterapia possuem características e treinamentos específicos que os diferenciam de cavalos utilizados para passeios ou competições esportivas. De acordo com a professora Thaís, os animais devem ter uma estatura média ou baixa, facilitando a segurança do praticante, já que técnicos ficam ao lado com as mãos apoiadas nele durante toda a terapia. Isso é essencial em caso de crises ou movimentos inesperados, e garante que a equipe possa realizar resgates rápidos e seguros, se necessário.

A escolha do cavalo também leva em conta seu temperamento, saúde e marcha. Cavalos calmos, com boa marcha e sem histórico de lesões locomotoras ou neurológicas são os mais indicados. “Para cada praticante, selecionamos o cavalo conforme sua marcha, para não comprometer a evolução motora”, pontua.

A imagem mostra uma criança usando capacete e óculos montada em um cavalo dentro de um espaço coberto. Ela segura uma barra horizontal com as mãos levantadas, enquanto é assistida por três adultos, um deles vestindo uma camisa com a palavra "Equoterapia". O ambiente é um local destinado a terapias assistidas por cavalos, com árvores visíveis ao fundo.
Sessão de equoterapia da Uenp (Foto/Reprodução)

Além disso, o treinamento dos cavalos ocorre semanalmente, mesmo quando não há sessões de terapia. Durante esses treinos, os cavalos são expostos a diferentes estímulos – como objetos inesperados, bandeiras e movimentos repentinos – para assegurar que permaneçam calmos em qualquer situação.

A médica veterinária explica que “o cavalo precisa ser o mais manso possível, mas também entendemos que, assim como outros animais, ele pode ter dias em que não está no seu melhor humor. Por isso, nossa equipe avalia o comportamento diário de cada animal, observando sinais como o movimento das orelhas, a postura e a interação com os técnicos”.

Ensino, pesquisa e extensão em prol da comunidade

A procura por equoterapia na Uenp é intensa, especialmente por parte de famílias de crianças, devido aos avanços nos diagnósticos precoces. Ao longo das sessões, os praticantes aprendem lições práticas de autoestima e confiança. “O cadeirante, por exemplo, costuma olhar as pessoas de baixo para cima. Quando está em cima do cavalo, o universo se inverte, e ele pode olhar para as pessoas de cima. Isso traz segurança, confiança e uma mudança na forma como se percebe”, comenta Thaís. 

E os impactos não se limitam aos praticantes. O aprendizado é mútuo e os profissionais envolvidos também vivenciam mudanças significativas. A coordenadora do Núcleo reflete que trabalhar com equoterapia proporciona uma nova perspectiva sobre os próprios desafios, destacando que, enquanto os praticantes evoluem, os profissionais também crescem pessoalmente. Ela ressalta ainda que, mesmo quando os avanços são pequenos, o simples fato de evitar uma piora já representa um grande alívio e conquista para as famílias.

A imagem mostra uma criança montada em um cavalo branco sendo acompanhada por cinco adultos, todos com camisetas que parecem indicar um grupo ou equipe. Eles caminham em um terreno de terra sob céu claro, com uma área gramada e edificações ao fundo, sugerindo um ambiente rural. A cena reflete uma atividade supervisionada, possivelmente parte de um programa de equoterapia.
Sessão de equoterapia da Uenp (Foto/Reprodução)

O trabalho desenvolvido pelos grupos da Unioeste e da Uenp reafirma que a universidade é um espaço que gera transformação social, onde ensino e prática se encontram para atender às demandas da comunidade. Como bem resume a professora Thaís, “o papel da universidade é ser esse elo entre o conhecimento e o cuidado, formando profissionais que levem adiante a visão de contribuir com a sociedade”. E é assim, com o cavalo como parceiro e a comunidade como prioridade, que esse projetos buscam estabelecer o compromisso com o bem-estar coletivo. 

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Texto:
Camila Lozeckyi e Maria Eduarda de Souza Oliveira
Supervisão de Texto: Ana Paula Machado Velho
Arte: Hellen Vieira
Supervisão de arte: Tiago Franklin Lucena
Edição Digital: Gutembergue Junior

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