Feche os olhos e imagine que você é só a parte material do seu corpo. Está sentindo sua estrutura? Agora, imagine-se “puxando ferro” na academia. Essa atividade, que pode ser chamada de exercício físico, causa uma reação importante no seu corpo. Uma delas é chamada de inflamação pelos especialistas. Para quem está fora da área da educação física, pode pensar que essa é uma forma de estresse. Mas não se preocupe, esse estresse é um grande aliado da sua saúde física e mental.
Nunca imaginei querer me estressar, mas, o professor Ademar Avelar de Almeida Júnior, do Departamento de Educação Física (DEF), da Universidade Estadual de Maringá, no Paraná, aconselhou. Aliás, muitos dos médicos, não só profissionais de educação física, que a gente visita depois dos 30 anos, dizem coisas como: exercite-se!!! Mas, como vimos no vídeo acima, temos que “provocar” nosso corpo de maneira planejada para ser bom para nossa saúde.
O professor coordena um grupo de pesquisa chamado GePense – Grupo de Estudos e Pesquisa em Exercício e Nutrição para Saúde e no Esporte. Ele e a equipe estudam as inter-relações entre o que a gente come, a qualidade nutricional do que ingerimos, o exercício físico e a atividade física em diferentes públicos, sendo que o foco principal é a área da saúde.
Segundo o pesquisador, a primeira pesquisa que o grupo fez foi um estudo de efeito agudo do exercício. Efeito agudo é aquela resposta que acontece durante e logo após uma sessão de esforço. De acordo com Ademar, em algumas situações, isso pode ser um problema para o organismo. Por exemplo: um maratonista, nas 48 a 72 horas após uma prova, pode desenvolver o que é chamado de imunodepressão, uma queda do sistema imunológico; isto é, de defesa do organismo. É comum essas pessoas terem problemas como inflamação de garganta, resfriado, por conta de terem feito uma atividade muito vigorosa. Ou seja, o exercício faz bem, mas precisa ser bem controlado.
Treinando o sistema imunológico
O professor Ademar lembra que o nosso sistema imunológico tem diferentes formas de atuar. Quando a gente se corta, por exemplo, o corpo envia sinalizadores para que o organismo comece a trabalhar com o objetivo de resolver aquele problema. Acontece o que os especialistas chamam de inflamação.
“Um corte gera um aumento das atividades de marcadores pró-inflamatórios, sinais para que o corpo comece a atuar para a reconstrução do tecido, para matar alguns micro-organismos, bactérias e vírus, que possam estar no local do corte. Então, esses marcadores, que a gente chama de sinalizadores, vão se ‘organizar’ para ajustar o que tem de errado. Essa inflamação, a gente também pode chamar de estresse. O que acontece é que os estímulos que a gente tem no dia a dia, o estresse, sejam eles psicológicos ou físicos, colocam nosso corpo em alerta”, explica Avelar.
Em outras palavras, o exercício pode ser visto como um agente estressor. Deixe-me explicar melhor. Você imagina por que uma sessão de musculação aumenta a nossa massa muscular? Porque quando fazemos exercício, a gente “machuca” a nossa musculatura. Basta lembrar como a gente sai dolorido ou dolorida, né? A dor está relacionada ao dano muscular. Quando ele acontece, o corpo sinaliza que houve ruptura das fibras musculares. Como? Por meio da liberação de alguns sinalizadores, como os marcadores inflamatórios. Esses marcadores, por sua vez, anunciam que tem algo errado, que vários sistemas do corpo precisam trabalhar para melhorar, aumentar o potencial daquele músculo. Assim, o corpo vai recrutar os responsáveis por produzir mais proteína, “porque músculo nada mais é do que proteína estrutural, uma proteína ligada na outra. Então, quando eu faço exercício e causo dano ao meu músculo, e sinto aquela dor, aquilo é um estímulo para aumentar minha massa muscular. Ou seja, o exercício é um agente estressor, só que, em longo prazo, ele é muito benéfico, porque eu fico mais apto a novos estímulos e, mais forte”, destaca o professor.
Resumindo, o exercício físico é um agente estressor que, se praticado de forma controlada e regular traz adaptações benéficas. Há diferentes modelos de exercício: caminhar, correr, andar de bicicleta, nadar, fazer musculação. Trabalhos mostram que cada tipo de estresse que eles provocam, gera respostas diferentes. Na grande maioria das situações, essas respostas são positivas, no entanto, em algumas situações, elas podem ser prejudiciais: problemas ósseos, articulares, dores nas costas, dor no joelho, rompimento de ligamento, quando passamos dos nossos limites. “Por isso, é importante procurar ajuda profissional na hora de fazer o exercício”, alerta o professor da UEM.
Olhando públicos específicos: encontrando evidências
Há, enfim, inúmeros estudos que comprovam os efeitos do exercício. Segundo o professor Avelar, é possível dizer que os exercícios são importantes mesmo para aqueles que possuem algum tipo de disfunção ou doença. Como vimos acima, há evidências de que, quando se submete o corpo a uma sessão de exercícios vigorosos, a imunidade pode cair temporariamente. Por isso, é preciso pensar: como seria esse efeito em pessoas que já têm problemas no sistema de defesa do organismo, como aquelas que vivem com o HIV, o vírus que provoca a Síndrome de Imunodeficiência Adquirida, a Aids?
Com isso em mente, o grupo liderado pelo professor Ademar organizou um estudo com esse público. Entre outras perguntas, eles tentaram responder: será que é possível fazer qualquer tipo de exercício com essas pessoas? Será que o exercício moderado prejudica ainda mais a imunidade deste pessoal?
“Testamos os pacientes com exercício de força, musculação, que a gente chama de treinamento com pesos, ou exercício resistido, de intensidade moderada. Vimos que, realmente, há um impacto agudo na imunidade, mas ele é muito pequeno, não chega ao ponto de abrir o que a gente chama de janela de oportunidade para alguma infecção ou algum tipo de disfunção, ou seja, desequilíbrio. Então, o exercício moderado é seguro para esse grupo e tem outros benefícios importantes”.
Para dar mais fundamento às pesquisas do GePense e minimizar os impactos sob a imunidade das pessoas que vivem com HIV, outras perguntas foram feitas e novos testes realizados com os mesmos voluntários. Eles foram divididos em grupos e uma parte recebeu uma suplementação com glutamina, um aminoácido, produzido pelo nosso corpo e também encontrado em alimentos de origem animal. Essa substância é conhecida por ter propriedades anti-inflamatórias, que podem amenizar o estresse do organismo. Os pesquisadores viram que ela tem, sim, o efeito de diminuir a janela imunológica naqueles que praticaram exercícios moderados e foram suplementados.
“Encontramos dois principais resultados que permitem dizer que os exercícios são também importantes para aqueles que possuem algum tipo de disfunção ou doença. Vimos que o exercício aumentou a atividade inflamatória, mas a glutamina possibilitou que a resposta pró-inflamatórias fosse amenizada. Então, a suplementação protegeu os pacientes com HIV, que naturalmente já possuem baixa imunidade. Além disso, vimos uma resposta cognitiva positiva, isto é, quando os pacientes receberam a suplementação de glutamina e foram submetidos a uma de exercício, eles melhoraram a capacidade de raciocínio, principalmente, nos aspectos de atenção”, comemorou o professor.
Então, é possível afirmar que o nosso organismo precisa de certos estímulos estressantes para que ele possa reagir de forma adequada a alguns desequilíbrios do dia a dia. Quanto mais habituado ao estresse o corpo está, melhor ele responde a outros tipos de estresse. A pessoa que tem uma boa “aptidão física”, é aquela que passou por muito estresse, treinou muito o seu corpo. Esse preparo é importante para as pessoas saudáveis e para quem enfrenta a vida sob o fantasma da baixa imunidade.
Enfim, as pesquisas do professor Ademar Avelar juntam-se a muitas que apontam o exercício físico como um agente estressor que traz diversos benefícios relacionados à saúde. Vão desde aptidão física (aumento da força, da massa muscular, da flexibilidade, diminuição da gordura corporal, melhora na agilidade, no equilíbrio) até a melhora da qualidade de vida e, inclusive, social. Pode-se dizer que as pessoas se relacionam melhor com seus familiares e com o mundo quando fazem exercício físico de forma regular, por estarem mais bem humoradas, já que ao se “mexerem” produzem mais serotonina, hormônio do humor. A qualidade do sono também é impactada, porque os exercícios permitem que as pessoas durmam mais e melhor.
Por isso, Ademar Avelar faz um alerta: o nosso nível de atividade física vem diminuindo cada vez mais. A forma de vida da sociedade contemporânea tem contribuído para isso.
“O avanço da tecnologia tem nos tornado cada vez mais sedentários. Precisamos lutar contra a falta de movimento e, ao mesmo tempo, a favor da nossa saúde. Tenha em mente que o exercício físico é um remédio importante para os males atuais, especialmente, porque prepara seu corpo para as surpresas do dia a dia. Mexa-se de forma planejada e frequente. A sua saúde agradece!
O conteúdo desta página foi produzido por
Texto: Ana Paula Machado Velho
Degravação da entrevista: Thamiris Rayane Shimano Saito e Milena Massako Ito
Edição de áudio: Ana Paula Machado Velho
Edição de vídeo: Thamiris Rayane Shimano Saito
Ilustrações: John Zegobia
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A pesquisa que mencionamos contribui para os seguintes ODS: