Quando pesquisamos no dicionário a definição da palavra ‘fronteiras’, é comum nos depararmos com a utilização de termos associados à separação, limite ou divisão. De acordo com o dicionário Michaelis, uma das definições de fronteiras é “limite, marco ou linha divisória entre duas regiões, dois estados, países”.
Na escola, nas aulas de geografia, lembro de estudarmos as fronteiras como demarcações que separam um território de outro. E não é incomum que, em alguns casos, essas fronteiras apareçam em contextos em que a separação representa algo negativo: algo que serve para apartar pessoas, culturas e espaços.
É possível, no contexto de um mundo globalizado, repensar essas linhas sem que, necessariamente, representem um afastamento ou uma limitação?
NAPI Trinacional: caminhando entre três nações
O Desenvolvimento Sustentável da Região Trinacional 2020 – 2040, ou apenas NAPI Trinacional, integra os Novos Arranjos de Pesquisa e Inovação do Paraná, financiados pela Fundação Araucária e pela Secretaria de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Seti).
O Arranjo nasceu com a intenção de promover pesquisas e projetos que contribuam para a tomada de decisões que levem a um desenvolvimento sustentável da região trinacional. Essa região transfronteiriça abrange três países, sendo eles: Argentina, Brasil e Paraguai.
A Região Trinacional urbana compreende oito municípios, desses, cinco são do Paraguai, dois do Brasil e um da Argentina: Minga Guazú, Ciudad del Este, Presidente Franco, Hernandarias, Los Cedrales; Santa Terezinha de Itaipu, Foz do Iguaçu e; Puerto Iguazú, respectivamente.
Este é um território bastante complexo e estratégico, por isso as pesquisas buscam compreender suas fragilidades e potências, para que a Rede Trinacional de pessoas e instituições proponha projetos que propiciem a integração de pessoas, culturas e relações: sejam elas sociais, econômicas ou ambientais.
Para que esse trabalho seja possível, tanto na teoria quanto na prática, o NAPI atua naquilo que compreende como pesquisa-ação, ou seja, articula pessoas que vêm dos governos, da sociedade civil e do setor produtivo, além das universidades – a chamada quádrupla hélice. Estas pessoas são deste territórios, por isso são ao mesmo tempo pesquisadores e sujeitos da pesquisa e representam múltiplos saberes: acadêmicos de várias áreas, populares, ancestrais, profissionais .
“Buscamos sempre fortalecer o processo de integração que já existe entre o Brasil, Paraguai e a Argentina, porque nós partimos sempre do princípio que, para o Paraná é um ponto forte ser um estado fronteiriço”, afirma a articuladora do NAPI, Adriana Brandt.
Uma Metrópole Trinacional Sustentável
O que o NAPI Trinacional vem fazendo é, sem dúvida, dar um novo significado para a compreensão de fronteiras. É a possibilidade de enxergar as fronteiras como espaços de encontro, que oportunizam construções conjuntas entre os povos e sinergia. Por isso, o Arranjo tem como principal objeto de estudo a institucionalização de uma Metrópole Trinacional Sustentável.
O projeto da Metrópole Trinacional Sustentável consiste na integração territorial e urbana da região Trinacional, facilitando e potencializando esse espaço em termos de circulação de pessoas, relações comerciais e sociais, tornando as trocas interculturais fluídas e facilitadas.
Essa Metrópole é a reunião de oito cidades, entre três países, unidas por dois rios – o Iguaçu e o Paraná. Conta com quase um milhão de pessoas, além de importantes pontos como as Cataratas do Iguaçu e a Itaipu Binacional e é um território regido pelo agronegócio. É a região fronteiriça urbana mais populosa e movimentada da América do Sul, com milhares de pessoas indo e vindo todos os dias. Daí vem a importância das pesquisas.
“Que nos seja oportunizado cruzar os rios sem ficar em filas; matricular os nossos filhos em escolas de qualquer dos três países, porque essas escolas terão um currículo comum que vai prever o ensino dos dois idiomas – português e espanhol; usufruir dos serviços de saúde de forma simples; ter uma empresa no Brasil com filiais no Paraguai e na Argentina de uma forma mais descomplicada…”, explica Adriana.
E uma palavra guia todo o trabalho desenvolvido pelo NAPI: sustentabilidade. Não é possível pensar uma metrópole trinacional que viabilize os intercâmbios entre nações sem que isso seja feito de maneira sustentável: pensando nas particularidades do território e, também, das pessoas.
“É preciso preparar o território da melhor forma para que o processo de desenvolvimento seja inclusivo socialmente e ambientalmente… Para que os ‘traumas’ do passado não se repitam. O NAPI Trinacional trabalha para dotar os tomadores de decisão de insumos para potencializar os impactos positivos do novo ciclo de desenvolvimento e minimizar ao máximo – senão eliminar! – as externalidades negativas”, afirma Adriana.
Respeitando os diferentes saberes
Um dos pilares que sustenta os trabalhos do NAPI Trinacional é a construção colaborativa do conhecimento, unindo o setor público (parte Estatal), o setor privado (as empresas), as universidades e a sociedade civil (a população).
A ideia é que os conhecimentos produzidos no Arranjo levem em conta essas diferentes esferas da sociedade e que o saber não se limite à esfera acadêmica, mas que conte, também, com apoio dos saberes técnicos e populares, especialmente de povos originários e comunidades tradicionais, como indígenas e quilombolas.
“Buscamos tecer uma rede que seja realmente a mais representativa e mais autêntica da nossa comunidade. Procuramos trabalhar desde a equanimidade de gênero, de representantes por país e por setor da sociedade, para ficar o mais equânime possível. E, portanto, mais significativa.”, explica a articuladora do NAPI.
Pensar uma proposta de desenvolvimento de uma região de maneira sustentável é, portanto, levar em conta tanto os aspectos ambientais quanto sociais: quem são as pessoas que vivem nesse ambiente, como as transformações afetam o cotidiano dessas pessoas e de que maneira é possível construir um plano futuro que abrace cada particularidade.
O que o NAPI já fez até aqui?
O trabalho já entregue pelo NAPI está longe de ter um ponto final. Na Fase 1, o Arranjo realizou pesquisas envolvendo mais de 100 pesquisadores e profissionais, sintetizadas em duas publicações que propuseram projetos-chave e indicaram os próximos passos. Desses dois livros, um foi traduzido para o espanhol e o guarani.
Tendo traçado um panorama rico da região e os passos a seguir na Fase 1, agora na Fase 2, o Arranjo propõe que a rede produza um material robusto para os tomadores de decisão. Além disso, o NAPI Trinacional segue investindo em imersões e formações-ações.
Para que tudo isso seja possível, o NAPI conta com dezenas de pesquisadores, estudantes e colaboradores do Brasil, Argentina, Paraguai, além de pesquisadores e instituições de outros países da América do Sul, como Chile e Venezuela, e também da Europa, como Espanha e França.
Pensar uma região tão vasta, rica e populosa quanto essa carece de um olhar cuidadoso e ferramentas cada vez mais detalhadas, para que as transformações respeitem as pessoas, as culturas e a natureza de cada país.
O trabalho do NAPI Trinacional tem mostrado que é possível propor um novo significado para fronteiras: um que unifica, dá forças e integra.
Para conhecer mais sobre o trabalho desenvolvido pelo Arranjo, confira o vídeo institucional:
EQUIPE DESTA PÁGINA
Texto: Camila Lozeckyi
Supervisão de Texto: Ana Paula Machado Velho
Arte: Marjorie Gracino e Lucas Higashi
Supervisão de arte: Tiago Franklin Lucena
Edição Digital: Gutembergue Junior
Glossário
A pesquisa que mencionamos contribui para os seguintes ODS:
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