É fato que, na era da informação, o avanço tecnológico transforma constantemente a forma como produzimos, armazenamos e disseminamos informações.
Você já se deu conta de como atualmente os computadores integram nossa rotina? Eles compõem o nosso cotidiano de tal modo que, muitas vezes, nem percebemos a influência direta em nossas vidas. Essas máquinas já estão entranhadas na estrutura dessa nova sociedade tecnológica. Utilizamos no trabalho, no auxílio dos estudos, para listar tarefas, registrar momentos da nossa vida por meio de fotos e vídeos, escutar música, assistir um filme, e até mesmo para pedir comida.
Quase que embutido em nossas atividades diárias, os computadores se apresentam nos mais diversos formatos e funções específicas, do mais “simples”, como relógios inteligentes, notebooks, televisões, tablets, celulares e mais uma infinidade de aparelhos, até máquinas complexas, como supercomputadores, que são capazes de auxiliar no enfrentamento de pandemias, como aconteceu na da Covid-19.
Mas, de que forma? Isso você vai descobrir ao longo do texto, primeiro é necessário entender o que são essas máquinas super potentes e eficientes.
Afinal, o que são supercomputadores?
São máquinas que possuem uma enorme capacidade de processamento e de memória, capaz de processar uma quantidade exacerbada de dados complexos por segundo! Em outras palavras, transformam base de dados gigantescas em informação palpável. Inclusive, a velocidade de processamento de um supercomputador supera em trilhões a de um computador comum que temos em casa.
A capacidade de processamento de um computador é mensurada em quantidade de flops, acrônimo para floating operations per second, ou operações de ponto flutuante por segundo. E o que seria os tais pontos flutuantes? Eu te explico!
Os pontos flutuantes representam números muito grandes ou muito pequenos na computação. Ele “flutua” para ajustar o número à sua escala, permitindo cálculos precisos com valores fracionários e extremos. Isso facilita operações com números complexos no dia a dia da computação, posto que, de forma geral, os computadores são capazes de realizar milhares de operações por segundo, contar cada uma delas se torna inviável.
Um computador comum, mesmo que potente, pode alcançar até 100 gigaflops, enquanto um supercomputador moderno opera na casa dos petaflops — ou até mesmo exaflops. Para se ter uma ideia do salto de desempenho, um gigaflop equivale a um bilhão de operações por segundo, e um petaflop corresponde a um quatrilhão. Em termos práticos, um supercomputador pode ter a potência combinada de mais de 15 mil computadores de mesa trabalhando de forma integrada.

Ou seja, são verdadeiros gigantes tecnológicos que extrapolam os dispositivos comuns que usamos no cotidiano. Agora, a pergunta que não quer calar:
E como exatamente um supercomputador foi capaz de ajudar no combate a pandemia da Covid-19?
O uso de supercomputadores foi fundamental para o rápido desenvolvimento das vacinas contra a Covid-19. Isso porque, décadas atrás, pesquisadores testavam moléculas manualmente, em laboratório, um processo lento, que demorava até mesmo uma década para alcançar alguma conclusão.
Hoje, tendo o sequenciamento do material genético do vírus e de humanos, usando um supercomputador é possível realizar uma série de combinações para verificar quais as mais promissoras. Isso representa um avanço de etapas, que se traduz não somente em economia de tempo, mas também de dinheiro!
Muito mais do que vacinas, foi por meio das operações realizadas por um supercomputador que foi possível determinar qual máscara era mais eficaz na proteção contra a Covid-19. Ainda, o uso dessas super máquinas possibilitou a análise de novos remédios. Uma verdadeira ferramenta no combate a pandemia da Covid-19!
Mas vale ressaltar que a aplicabilidade dos supercomputadores vai muito além, eles são aptos a realizar previsões climáticas, pesquisa de fusão nuclear, modelagem molecular, e até exploração de petróleo e gás.
Agora que você já está por dentro de tudo que um supercomputador pode oferecer no quesito de avanço científico e tecnológico a uma sociedade, considere ter esse nível de tecnologia aqui no Paraná e tudo que isso representaria para a comunidade científica paranaense, para os pesquisadores brasileiros no geral, bem como o retorno social. É isso que está prestes a acontecer!
Paraná será pioneiro na construção de Rede de Supercomputadores
Apesar do Brasil já possuir alguns supercomputadores espalhados pelo país, todos eles foram importados de países estrangeiros, como o supercomputador Santos Dumont. “Nós temos no país de uma forma geral um número limitado de supercomputadores e um acesso limitado, [há] filas enormes pro uso do Santos Dumont”, explica o diretor do centro de Ciências Exatas da Universidade Estadual de Maringá, Diogo Francisco Rossoni. A compra implica em alguns desafios e restrições no que se refere a aplicabilidade da máquina, limitando a exploração do potencial de determinadas áreas, como a fusão nuclear.
Mas este cenário está prestes a mudar!

No ano de 2024, o Grupo de Trabalho (GT) criado pela Secretaria da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Seti) para estudar a implantação de uma Rede de Supercomputadores, nas Instituições Estaduais de Ensino Superior (IEES) concluiu o projeto de aquisição e transferência da tecnologia do Centro de Desenvolvimento de Computação Avançada (C-DAC) da Índia, instituição parceira do GT, que é referência mundial em pesquisa e desenvolvimento de tecnologia de ponta.
Segundo Rossoni, que também compõe o GT, ao todo serão oito supercomputadores distribuídos pelas IEES do Paraná. A entrega da primeira máquina construída em território nacional está prevista para março de 2026, com as demais sendo instaladas ao longo do ano.
Esse é mais um passo importante para o avanço da ciência, tecnologia e inovação do Estado, e proporciona, sobretudo, independência no desenvolvimento de pesquisas e soluções de problemas no Paraná.
Autonomia paranaense
Ao liderar a maior iniciativa estadual já realizada no Brasil nesse setor, o Paraná rompe com a dependência de estruturas externas e constrói uma capacidade própria de processamento e análise de dados em larga escala. Assim, a implementação da Rede de Supercomputadores no Paraná representa mais do que um avanço tecnológico: simboliza um passo concreto rumo à autonomia científica, tecnológica e decisória do Estado.
Segundo Rossoni, esse projeto tem potencial para transformar o Paraná em referência mundial: “esse modelo que nós estamos propondo é pra ser algo realmente inovador, tanto a nível de Brasil, quanto a nível mundial. É o maior investimento estadual que já foi feito nesse quesito a nível de Brasil.”.
A criação da Rede paranaense pode abrir caminhos para usos mais amplos e democráticos da computação de alto desempenho. Como mencionamos, atualmente, o acesso a supercomputadores no Brasil é escasso e concentrado, com longas filas para uso, o que limita seu aproveitamento.
Por isso, ao integrar universidades, setor público, setor privado e sociedade civil organizada, o Paraná busca tornar essa tecnologia acessível e estratégica para o desenvolvimento regional e nacional. Rossoni ressalta o potencial do Estado para “ser um piloto de algo que pode ser expandido para todo o país. […] Talvez, o Paraná possa servir de modelo de inovação, principalmente, na parte de supercomputadores, tanto no país como no todo”.
Essa autonomia se reflete em diferentes esferas. No setor da saúde, como já destacado, o uso para desenvolvimento de vacinas e remédios. Por outro lado, no campo da gestão pública, a interconexão de dados e o uso de evidências científicas para tomada de decisão prometem mais eficiência e racionalidade nas políticas públicas.
Vale frisar que os reflexos da implantação da Rede de Supercomputadores não se concentram apenas no Paraná, mas alcançam todo território nacional.
Soberania computacional a nível nacional
O professor também destaca a urgência do Brasil conquistar soberania computacional. Segundo ele, esse é o principal impacto do projeto, a começar pelo Paraná.
No cenário atual, o Brasil é majoritariamente dependente da compra de tecnologias desenvolvidas por outros países, o que impõe diversas limitações à sua utilização. Por isso, a necessidade de construir um supercomputador com total domínio nacional, livre de restrições impostas por outras nações.
“Se eu tenho um supercomputador e quero trabalhar, por exemplo, com um novo procedimento para uma fusão nuclear […] eu tenho limitações. Quem me vende, que geralmente são os Estados Unidos ou a China, não quer que você pesquise em determinadas áreas. Nós temos apenas nove supercomputadores [no Brasil] e todos eles são limitados, seja no acesso e/ou na capacidade de processamento”, esclarece Rossoni.
Outrossim, o Brasil é líder em energia renovável, cerca de 80% da produção elétrica vem de fontes eólica, solar ou hidrelétrica, também possui infraestrutura para desenvolver energia nuclear, como é o caso das usinas de Angra. No entanto, a falta de autonomia tecnológica impede o avanço em áreas estratégicas como essa.
A construção de supercomputadores com tecnologia nacional permitiria ao país atuar em setores sensíveis com liberdade, além de estimular a inovação em outras áreas. Portanto, o projeto é visto como um primeiro passo rumo à independência tecnológica, com potencial de impactar positivamente todo o país.
Índia e Brasil: cooperação internacional para o avanço tecnológico
A realização do projeto e a construção do supercomputador são frutos de uma parceria bilateral entre Brasil e Índia. O Paraná, em conjunto com o C-DAC e o governo indiano, deu início ao desenvolvimento do primeiro supercomputador no Estado.
Essa cooperação internacional envolve transferência de tecnologia e o intercâmbio de conhecimento técnico, com a vinda de diversos pesquisadores e especialistas indianos para apoiar e capacitar profissionais brasileiros no desenvolvimento das máquinas.
O diferencial dessa parceria está justamente na substituição da compra pela construção de uma Rede de Supercomputadores, é um marco para o país, não somente para o Estado.
A articulação da parceria teve início com o pesquisador sênior da Fundação Araucária, Jorge Edson Ribeiro, da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). Médico e especialista em bioinformática, Jorge mantém contato com instituições indianas, há mais de 20 anos, e sempre sonhou em trazer um supercomputador para o Brasil. Ao longo das últimas décadas, esse objetivo foi se concretizando por meio de projetos e articulações internacionais.

A parceria, enfim, se consolidou em 2024, com uma missão oficial liderada pelo governador do Paraná, Ratinho Jr., e representantes de diversas entidades, que juntos visitaram a Índia. Segundo o professor, foi durante essa viagem que o governo estadual compreendeu a importância estratégica de investir em supercomputação para impulsionar áreas como economia, sustentabilidade e saúde pública.
Por que a Índia?
“Porque a Índia se dispôs a fazer o que os outros não querem: ser um parceiro. Não seremos clientes e eles os vendedores. É uma parceria de duas vias. Nós podemos levar coisas para a Índia, e a Índia pode trazer coisas para nós”, explica Rossoni.
Essa relação bilateral também envolveu uma comitiva indiana que veio ao Paraná em 2024 para conhecer de perto as necessidades locais. Eles visitaram diversos espaços do Estado, o que resultou em mudanças significativas no escopo do projeto.

Inicialmente, a proposta previa apenas duas máquinas: uma na UEPG e outra no Instituto de Desenvolvimento Rural de Londrina (IDR-Londrina). No entanto, após as visitas e discussões com os pesquisadores do grupo de trabalho, a ideia foi ampliada. Durante as visitas, Rossoni e outros articuladores do GT argumentaram quanto à necessidade de que “cada universidade estadual tivesse uma máquina para fortalecer todo o nosso ecossistema”, pois, mesmo com o acesso remoto, a existência de uma máquina em cada instituição gera engajamento e representatividade local.
Com isso, o projeto cresceu: cada uma das universidades estaduais do Paraná receberá uma máquina de 300 a 400 teraflops, conectadas por uma rede de alta velocidade. Além dessas, a UEPG terá uma máquina ainda mais potente, entre 600 e 700 teraflops, que funcionará como o “coração” da Rede.
Já o IDR-Londrina será responsável por uma máquina voltada à inteligência artificial (IA), com capacidade de aproximadamente 50 petaflops IA, utilizando tecnologia baseada em GPU, essencial para o processamento de dados em modelos como o ChatGPT.
“A computação de IA exige muito mais das GPUs (placas de vídeo), do que das CPUs tradicionais (processadores). Por isso, a estrutura do IDR será focada nesse tipo de processamento”, detalha Rossoni.
Além disso, o IDR contará com o primeiro computador de simulação quântica do Paraná. Embora não seja um computador quântico real, o equipamento será capaz de simular o comportamento dessa tecnologia emergente, considerada promissora para resolver problemas complexos.
Assim, de previsão climática ao desenvolvimento de vacinas, os supercomputadores são uma importante ferramenta para a solução de problemas e avanço científico.
Gostou do tema e quer saber mais? Acesso o nosso podcast e confira todos os detalhes sobre os supercomputadores e a implantação da Rede no Estado.
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Texto: Sabrina Heck e Yumi Aoki
Supervisão de Texto: Ana Paula Machado Velho
Arte: Lucas Higashi
Supervisão de arte: Lucas Higashi
Edição Digital: Guilherme Nascimento
A pesquisa que mencionamos contribui para os seguintes ODS:

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