Potenciais biotecnológicos são a chave da conservação

Estudos do NAPI Biodiversidade: Recursos Genéticos e Biotecnologia buscam potencial da biodiversidade do Paraná

compartilhe

O Paraná tem a agricultura como uma das suas principais atividades econômicas. Esse fato também torna o Estado muito conhecido por suas grandes exposições agropecuárias, que, além de apresentarem as novidades do campo, também abrem as portas para muitos negócios, movimentando valores que chegam na casa dos bilhões. Elas acontecem anualmente, em várias cidades da região, como a ExpoLondrina, a Expo Goio, a Expovel, a Expo Palotina e muitas outras.

Na minha cidade, a festa é a Exposição Feira Agropecuária, Industrial e Comercial de Maringá, mais conhecida como Expoingá. Em 2024, a Feira chega na sua 50ª edição, trazendo o tema: “O Elo Entre Tradição e Inovação”. Além das últimas novidades do agronegócio, a Exposição também tem na programação shows, espaços gastronômicos, parque de diversões, leilões e outras atividades.

Nos últimos anos, a Expoingá tem investido em conteúdos voltados à educação como atrativos da Feira. Isso ocorre por meio de uma parceria com a Universidade Estadual de Maringá (UEM), que tem levado a ciência para ser exposta em locais não convencionais de divulgação científica. Os conteúdos apresentados abrangem várias áreas, desde saúde até a matemática. Um dos sucessos da Feira é a participação do Museu Dinâmico Interdisciplinar (Mudi) da UEM, que exibe parte de seu acervo para os visitantes conhecerem e interagirem. 

Outro espaço de muito conhecimento na Expoingá está localizado perto da antiga ‘Fazendinha’. Conhecido como “Caminho das Sensações”, o local é uma pequena área preservada da mata atlântica, em que as pessoas podem conhecer mais sobre esse bioma. Além das espécies nativas, foram inseridas por ali algumas plantas exóticas que não apresentam riscos para o bioma do local, assim o público tem a oportunidade ver de pertinho toda essa diversidade.

Se você ficou interessado em conhecer a Expoingá e todas suas atrações, temos uma boa notícia. A Feira acontece entre os dias 9 a 19 de maio, no Parque Internacional de Exposições Francisco Feio Ribeiro. Não deixe de conferir! Ouça também nosso podcast “Conexão Expoingá” para saber mais sobre a atuação do Mudi, na edição de 2024.

Ameaça a biodiversidade

Sabe aquele ditado “nem tudo são flores”? Pois é. O fato do Paraná ser um dos protagonistas nas atividades agropecuárias também tem seu lado ruim. Afinal, para o ganho econômico, essas atividades foram ampliadas e implementadas sem muita preocupação com que tipo de impacto essas ações causam sobre os recursos genéticos e a biodiversidade. Sabemos que o desenvolvimento da agricultura e da pecuária em larga escala, envolve o desmatamento de certos espaços para o plantio e criação dos animais. E qual o perigo disso se feito sem consideração com o meio ambiente?

O coordenador geral do Novo Arranjo de Pesquisa e Inovação (NAPI) Biodiversidade: Recursos Genéticos e Biotecnologia e professor do Departamento de Bioquímica e Biotecnologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL), André Luiz Martinez de Oliveira, explica que, atualmente, é bem conhecido que a utilização em excesso de insumos agropecuários é uma das principais causas para a perda de biodiversidade. Toda essa situação leva a um problema que está atingindo o mundo inteiro: as mudanças climáticas. 

O NAPI Biodiversidade: Recursos Genéticos e Biotecnologia é composto de 49 pesquisadores, que estão localizados em todas as universidades estaduais do Estado e na Universidade Federal do Paraná (UFPR). Além disso, a equipe conta com a participação do Instituto de Desenvolvimento do Trabalho (IDT) e outros parceiros fora da área acadêmica. Com esse grupo todo, o objetivo do Arranjo é entender o potencial da biodiversidade do Paraná, seja ela micro, de micro-organismos, ou macro, com as plantas e animais. “Buscamos saber como essa biodiversidade pode ser utilizada para impulsionar o desenvolvimento de remédios, novas formas de desenvolver agricultura, novas plantas. E por aí vai”, acrescenta o coordenador geral. 

Para isso, os estudos procuram entender os estoques de biodiversidade em áreas que ainda são preservadas, comparando esses estoques em áreas que são utilizadas para atividades agropecuárias por longas décadas. Em seguida, as pesquisas se voltam ao potencial biológico dessas diferenças na biodiversidade, tanto nos casos de conservação, ou exploração econômica, e se essa distinção resulta em diferenças no potencial biológico das espécies que estão ausentes em uma ou outra situação.

O próximo passo se destina ao desenvolvimento de formas de atuar nessas áreas que são exploradas economicamente, com o propósito para a restauração da biodiversidade. O NAPI também busca subsidiar ações públicas para criação de áreas de conservação, que possam aumentar a troca de informação biológica entre as áreas que são ainda preservadas, para que esses estoques de biodiversidade sejam ampliados e, em alguns casos, recuperados.

Professor André Luiz Martinez de Oliveira (Foto/Mariana Manieri Pires Cardoso)

André Luiz Martinez de Oliveira também explica que existem causas naturais de extinção de espécies, isto é, redução de biodiversidade, ou de estabelecimento de espécies que não eram de um lugar e aparecem em novas áreas, chamado de estabelecimento de espécies exóticas. Porém, ele destaca que são processos que ocorrem de modo integrado a uma quantidade de outros motivos. “Por exemplo, a ação humana vai atuar na mudança de regimes de chuva. Essa modificação pode levar uma área a ter mais ou menos umidade, e essa condição vai levar a uma composição de plantas diferentes. Essa alteração nas plantas traz consigo outros animais, insetos e microrganismos. Por isso, são processos interligados”, exemplifica o professor. 

Com os levantamentos de estoque de biodiversidade e o monitoramento a longo prazo, será possível saber com mais precisão, como essas mudanças, sejam em locais que têm interferência do homem ou locais com menor interferência, acontecem de fato. “Nós precisamos de muitos anos de estudo dessas áreas para traçarmos algumas hipóteses de causa e efeito, no que diz respeito ao aumento ou diminuição dos estoques de biodiversidade”, acrescenta Oliveira.

Técnicas e tecnologias desenvolvidas pelo NAPI 

Apesar de estar implementado há apenas um ano, o NAPI Biodiversidade: Recursos Genéticos e Biotecnologia já tem muitas pesquisas em andamento. A equipe tem identificado potencial biotecnológico com o levantamento de espécies em alguns locais do Paraná. Primeiro, esses potenciais são estudados no laboratório, para entender como essa biodiversidade poderia auxiliar em alguma demanda de serviço do ser humano. Em seguida, eles são validados em ensaios mais amplos. 
“Já existem grandes trabalhos sendo feitos com espécies que nós já identificamos para, por exemplo, a redução de efeito do estresse hídrico1 no crescimento de espécies que são utilizadas para o reflorestamento, dentro da capacidade de plantas agrícolas absorverem nutrientes de uma área, o que vai levar a redução da necessidade de aplicação de fertilizantes industriais, ou então, moléculas de espécies vegetais nativas do Paraná, que têm capacidade de serem utilizadas no desenvolvimento de novos fármacos. São estudos ainda em estágios iniciais, mas os grupos que atuam nas diferentes frentes já possuem um bom caminho andado para explorar esse potencial da biodiversidade do Paraná e chegar a ter a proposição de novas tecnologias para essas diferentes áreas”, conta o coordenador.

Próximos passos

A identificação de espécies ameaçadas é só um pontapé inicial que vai levar os pesquisadores a entenderem como é a ecologia dessa espécie, para que eles possam propor mecanismos de preservação. Esse passo ocorre independentemente se a espécie é ameaçada de redução sobre a biodiversidade, ou se ela têm ou não potencial biotecnológico identificado no momento. Porque, mesmo que não seja identificado o potencial biotecnológico dela nessa fase do NAPI, não significa que ela não tenha nenhuma importância econômica para a sociedade. 

Porém, a prioridade do NAPI, no momento, são os potenciais biotecnológicos e, uma vez que ele é identificado no laboratório em uma espécie ameaçada ou não, a equipe procura saber se esse potencial pode ser aplicado efetivamente como algum tipo de produto biotecnológico. “Nós vemos se essa espécie pode ser cultivada, ou melhor, se ela pode ter seus indivíduos multiplicados de maneira simples. Nem sempre isso é possível. Então, as espécies que têm maior facilidade de multiplicação, elas sempre vão ser prioritárias na continuidade do trabalho”, explica o professor.

O coordenador também enfatiza que trata-se de um trabalho que vai afunilando. “A gente busca a identificação de algumas centenas de espécies, dessas centenas de espécies, algumas dezenas delas têm potencial. Dessas, algumas passam pelos filtros de uso desse potencial como um produto tecnológico efetivamente. Desses indivíduos restantes que passam nesse filtro de cultivo facilitado, de baixo custo, nós vamos tentar aplicar em pequena escala, seja em células vivas, se for um fármaco, ou em plantas em vasos, se for para agricultura e reflorestamento, e depois ir ampliando”, detalha.

Uma vez que eles chegam na validação desse potencial, que refere-se à verificação do efeito ou do potencial biotecnológico em larga escala, é preciso definir um protocolo de como utilizar aquele recurso genético para se obter um produto biotecnológico eficaz. Essa etapa vai resultar em uma patente, porém, as instituições de ensino superior, possuem uma limitação muito grande em levar isso ao mercado. E é aí que entram as parcerias com o setor privado, para que esses potenciais possam ser levados à população em geral, para serem ampliados em escala de produção.

Conservando a biodiversidade

Quando falamos em conservação, muitas vezes, nós, seres humanos, nos colocamos na posição mais importante como espécie. Por que o homem quer conservar a biodiversidade? Porque essa biodiversidade pode servir a ele em algum momento. Seja para utilização de recursos biológicos para que nós tenhamos mais qualidade de vida, saúde, alimentação mais adequada, recursos econômicos, entre outros.

Embora a gente se coloque nessa posição dominante, o professor André acredita que o uso da biodiversidade de maneira racional também traz uma integração maior do ser humano com a natureza. “Nós temos uma interligação de tudo o que acontece no planeta em termos de causa e efeito, pois foi a vida que mudou há cinco bilhões de anos atrás, alterando a composição da atmosfera, que faz com que ela tenha oxigênio e que permita que animais e organismos que fazem essa respiração que a gente conhece hoje tenham se espalhado pelo planeta”. 

O NAPI Biodiversidade: Recursos Genéticos e Biotecnologia em ação (Foto/Arquivo NAPI Biodiversidade)

“Então, essas mudanças nas condições do planeta Terra dependem da biodiversidade também. E se essa biodiversidade ficar muito reduzida, corre o risco de que uma ou muitas espécies não consigam se adaptar às condições que vão ser criadas por essa redução. Inclusive nós, como espécie humana, a gente pode sofrer problemas de risco de extinção por conta disso. Parecem coisas isoladas, mas são coisas que estão integradas. E eu diria que essa conservação serve tanto para o benefício da experiência humana, como para a manutenção de nós como espécie e de outras espécies do planeta”, declara o professor.

Por isso, o NAPI atua nessas duas frentes, desde a identificação de organismos que possam trazer algum benefício para o ser humano, melhorando a qualidade de vida e, inclusive, trazendo recuperação e proteção à biodiversidade, até o próprio mapeamento do potencial biológico do Paraná, que vai resultar em proposições de novas áreas de preservação.

E esse trabalho é só um pedaço das pesquisas realizadas por essa grande rede que é o NAPI Biodiversidade: Recursos Genéticos e Biotecnologia. Conheça mais desse arranjo no texto “Como a ciência potencializa a agricultura brasileira?”.

EQUIPE DESTA PÁGINA
Texto:
Milena Massako Ito
Supervisão de texto: Ana Paula Machado Velho
Edição de vídeo: Yumi Santos Aoki
Arte: Camila Lozeckyi
Supervisão de arte: Tiago Franklin Lucena
Edição Digital: Gutembergue Junior

Gostou do nosso conteúdo? Nos siga nas nossas redes sociais: Instagram, Facebook e YouTube.

A pesquisa que mencionamos contribui para os seguintes ODS:

Glossário

  1. Estresse hídrico – Situação na qual a quantidade de água utilizada demandada é superior à quantidade do recurso disponível. ↩︎

Edição desta semana

Artigos em alta

Descubra o mundo ao seu redor com o C²

Conheça quem somos e nossa rede de parceiros