Preste atenção, pode ser TDAH!

O diagnóstico de Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade pode explicar alguns comportamentos incomuns

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Esse é um assunto que me preocupou durante muito tempo, porque eu pensava que toda a minha desatenção e falta de foco em alguns casos – ou, até mesmo, um hiperfoco em outras situações – remetesse a algum transtorno em específico. Tanto se falava em déficit de atenção e hiperatividade que muitas dúvidas foram surgindo. Acredito que mesmo você, leitor, em algum momento, já deve ter se perguntado se tem o tal Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), não é mesmo?

Em meio a tantas curiosidades e dúvidas, eu, que estava em fase de investigação do espectro autista no meu filho de 4 anos, aproveitei a oportunidade de uma consulta médica para entender sobre esse transtorno de falta de atenção e hiperatividade, e como funciona o diagnóstico tanto em crianças quanto em adultos. O diagnóstico foi negado pelo neuropediatra, para minha tranquilidade, mas aprendi muita coisa em todo esse processo.

Na visita ao neurologista infantil, Pedro Bressan Leite, ele nos explicou que o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade é um distúrbio neuropsiquiátrico que afeta a capacidade de atenção, hiperatividade e controle impulsivo. “Um dos principais sintomas incluem muita desatenção, dificuldade de manter o foco, organização e atenção a detalhes, além da inquietação, agitação e dificuldade em ficar parado, o que pode gerar, em alguns casos, uma impulsividade, que leva o indivíduo a agir sem pensar nas consequências”, ressaltou. De acordo com Bressan, os indícios de TDAH podem ser observados inicialmente no ambiente escolar. 

Pedro Bressan Leite possui graduação em Medicina pela Universidade Federal do Paraná (2008), residência médica em Pediatria pela Universidade Federal do Paraná (2011) e especialização em Neurologia Pediátrica pela Universidade Federal do Paraná (2013) (Foto/Arquivo Pessoal)

O caso de Arthur

Um exemplo é Arthur Viotto, que tem oito anos, filho de Juliana Viotto, de 38.  Ambos são moradores de Iguaraçu, cidade pequena, localizada a aproximadamente 30 km de Maringá, no Paraná. Juliana nos contou que começou a observar os sintomas durante o período da pandemia, quando grande parte das aulas era remota, e as atividades pedagógicas eram desenvolvidas com o filho em casa. Durante esse período, ela percebeu que seu filho tinha uma dificuldade muito grande para desenhar e pintar. “Então, eu sempre acabava pegando a mãozinha dele, ajudando-o, mas ele não queria ficar quieto, não queria parar”. 

Quando o Arthur mudou da pré-escola para a escola municipal, parte das atividades ainda era remota, mas, depois, começaram as aulas presenciais. Foi quando a professora chamou Juliana para conversar sobre o desempenho escolar do filho, pois ele não acompanhava os demais alunos. A professora relatou que era como se ele não estivesse na sala, como se  “estivesse em outro mundo.” Juliana chegou a comentar com a professora que ela também tinha dificuldade em ajudá-lo com as atividades. “Foi aí que iniciamos toda a investigação, mais profunda, neurológica e pedagógica.”

Durante esse processo, Arthur teve uma crise convulsiva severa, em que foi parar na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), cinco dias entubado, no Hospital Santa Rita de Maringá. “Começamos o processo de investigação Depois que ele recebeu alta, passou a realizar um tratamento com o neuro. Antes da crise convulsiva, para mim, era tudo normal”, relatou Juliana.

Mas com os relatórios e apontamentos da escola em mãos, Juliana o levou ao neuro que aplicou alguns testes. Assim que o médico terminou os exames com o Arthur, ela disse: “doutor, tudo que o senhor perguntou aqui eu também tenho. Eu também sou assim.” O médico disse que, provavelmente, Juliana também apresentava o TDAH. “Me recordo que ele apontou que o transtorno é genético, vem da mãe. Mas que não poderia fechar o diagnóstico, apenas um neuro adulto”.

Por meio do acompanhamento com o médico, Arthur fez vários exames, mas não apresentava nenhuma alteração. Até que foi fechado o diagnóstico de TDAH para ambos, mãe e filho. Arthur já saiu medicado com diagnóstico de TDAH hiperativo. “Para mim foi um susto e, ao mesmo tempo, um alívio, porque percebia também que eu tinha uma dificuldade, mas não sabia o que era. Para a minha idade, no entanto, foi um pouquinho mais difícil, porque já tenho 38 anos, já fiz faculdade, mas tive uma grande dificuldade na escola.”

Bressan ressalta que existem três tipos de TDAH, o predominantemente desatento, predominantemente hiperativo-impulsivo e o combinado. De acordo com o neuro, o grau do TDAH pode ser avaliado com base na intensidade dos sintomas, variando de leve a grave. O tratamento envolve terapia comportamental, psicoeducação e, em alguns casos, medicamentos, assim como no caso do Arthur. “É importante que as famílias estejam envolvidas no tratamento para fornecer apoio e entender as necessidades da criança ou do adolescente”, destacou.

Para Juliana, o quanto antes os pais e a equipe pedagógica escolar fecharem um diagnóstico junto com o neuro, as perdas serão menores para a criança, pois haverá uma vida mais saudável, com mais inclusão na sociedade. “É preciso mais compreensão e empatia para conseguirmos construir uma comunidade mais inclusiva em todos os aspectos.” 

Por isso, é importante ressaltar que, se o TDAH não for tratado adequadamente, pode resultar em dificuldades acadêmicas, sociais e emocionais futuras irreversíveis. Os resultados podem variar, mas com intervenção adequada, muitos indivíduos conseguem gerenciar seus sintomas e ter uma vida sem percalços.

As causas do TDAH

De acordo com Bressan, as causas exatas do TDAH não são conhecidas, mas envolvem fatores genéticos, neurobiológicos e ambientais. O diagnóstico é feito por profissionais de saúde mental com base em critérios estabelecidos em manuais diagnósticos, como o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), documento criado pela Associação Americana de Psiquiatria (APA) para padronizar os critérios das desordens que afetam a mente e as emoções.

Por outro lado, é importante destacar que manuais como o DSM, principalmente em suas versões mais recentes, podem levar a uma disseminação de diagnósticos pouco problematizadora, como mostra o psiquiatra e psicanalista francês Patrick Landman, em livro recentemente lançado no Brasil, Todos hiperativos? A inacreditável epidemia de transtornos de atenção. Como diz Landman, em entrevista concedida ao jornal Folha de S. Paulo, “o que parece ser prioritário para o DSM não é a atenção, e sim as perturbações do comportamento a que ela é assimilada.”

Tentem imaginar o dia-a-dia de uma criança: de um lado, nas horas de lazer, jogos eletrônicos, televisão, celular, um conjunto de atividades estimulantes que exige uma atenção rápida, uma mudança de foco constante; de outro lado, nas horas da escola, conteúdos desconhecidos e atividades desafiadoras, que exigem bastante concentração. Perceberam a diferença? O que nós, sociedade, pedimos às crianças são dois comportamentos completamente diferentes, que elas sejam, ao mesmo tempo, hiperativas e concentradas.

É por isso que o filósofo alemão Christoph Türcke, autor do livro “Hiperativos! Abaixo a cultura do déficit de atenção”, afirma que vivemos em uma cultura do déficit de atenção. “Apenas onde já existe uma cultura do déficit de atenção é que existe TDAH. Bilhões de pequenos choques audiovisuais estimulam a atenção humana o tempo todo – e por isso a desgastam”, escreve o filósofo em seu ensaio “Cultura do déficit de atenção”, que resume as principais ideias de seu livro

A ideia de uma cultura do déficit de atenção nos desafia a repensar e construir um ambiente mais saudável, visando assim não apenas um tratamento (necessário, é claro), mas uma verdadeira transformação social.

Oficinas de autorregulação da aprendizagem

Não é nenhuma novidade que a vida dos estudantes universitários é bastante puxada: novos conteúdos, trabalhos acadêmicos, provas etc. Agora, imagina enfrentar tudo isso sendo diagnosticado com TDAH? Para auxiliar esses estudantes, bem como outros que apresentam dificuldades semelhantes, o Núcleo de Acessibilidade da Universidade Estadual de Londrina (NAC-UEL) oferece, desde o mês de setembro deste ano, oficinas de autorregulação da aprendizagem. De acordo com a mediadora dessas oficinas, a professora doutora Natália Moraes Góes, do Departamento de Educação, “autorregulação da aprendizagem é definida como o controle intencional dos estudantes das variáveis cognitivas, motivacionais, comportamentais e emocionais visando atingir uma determinada meta de aprendizagem.” 

Por meio das oficinas, os estudantes com TDAH são capazes de desenvolver uma maior consciência sobre como aprendem, identificando fatores e dificuldades que podem interferir na própria aprendizagem. “Além da reflexão sobre o próprio processo de aprendizagem, nas oficinas os estudantes também são ensinados a como organizar melhor as suas tarefas, o seu tempo e o seu ambiente de estudo, como estabelecer metas adequadas para aprender, como controlar a procrastinação e manter a atenção diante das inúmeras tarefas escolares”, afirma a professora.

Em todos os aspectos da vida, o importante é ter informação e, a partir disso, entrar em ação. No caso do TDAH, conhecer a condição das crianças, adolescentes e, até, adultos, é fundamental para garantir uma vida mais estável e feliz!

Veja o que a Universidade vem fazendo para enfrentar um outro grande desafio atual… o autismo.

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Texto:
Débora Cristina Arcanjo e Rodolfo Rorato Londero
Supervisão de texto: Ana Paula Machado Velho
Arte: Mariana Muneratti
Supervisão de arte: Tiago Franklin Lucena
Edição Digital: Gutembergue Junior

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