Realidade aumentada: ciência transformando a medicina

A ilustração retrata uma mulher de jaleco e óculos escuros, com expressão confiante e mãos erguidas. Seu cabelo longo e escuro contrasta com o fundo vibrante, que exibe mapas estilizados em rosa e elementos gráficos em roxo e azul. A arte tem um estilo moderno e futurista, sugerindo tecnologia ou realidade aumentada. Assinada por Hellen Vieira para "Conexão Ciência", a imagem remete à inovação científica.
Testes com óculos de realidade aumentada permitem que médicos acompanhem atendimentos de emergência em qualquer lugar do mundo

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Se o cinema nos ensinou algo, é que a tecnologia pode desafiar as barreiras do que hoje é considerado impossível. Desde os óculos de realidade virtual de Matrix até os comunicadores avançados de Star Trek, a ficção científica sempre imaginou um futuro onde a ciência e a inovação estariam ao alcance das mãos. Mas e se esse futuro já estivesse acontecendo? 

A medicina sempre foi uma arte moldada pelo tempo e pela distância. No passado, o socorro dependia da proximidade do curandeiro, do médico ou do hospital mais próximo. Hoje, essa distância se dissolve no ar, atravessa continentes e conecta profissionais de saúde em tempo real, como se o especialista estivesse ao lado do paciente. 

Em Granada, na Espanha, Carlos Edmundo Rodrigues Fontes, pesquisador brasileiro e professor da Universidade Estadual de Maringá (UEM), está protagonizando essa revolução, trazendo a realidade aumentada para o atendimento médico e desafiando os limites da distância e da ciência.

O avanço da telemedicina tem sido uma das maiores transformações no campo da saúde. Tecnologias que antes pareciam distantes ou restritas a laboratórios, agora estão sendo implementadas no dia a dia dos profissionais médicos. A possibilidade de atender um paciente remotamente, com o suporte de dispositivos de realidade aumentada, representa um passo significativo na democratização da saúde, garantindo acesso rápido a diagnósticos e intervenções, independentemente da localização geográfica.

A imagem é um infográfico colorido sobre os benefícios e etapas do uso da realidade aumentada na saúde. No topo, destaca vantagens como atendimento rápido, redução de erros e acesso à saúde em locais remotos.
O infográfico apresenta quatro etapas numeradas:
Profissional de saúde inicia acolhimento (fundo roxo, ilustração de médico com óculos de realidade aumentada).
Conexão com o especialista remoto (fundo rosa, médica analisando dados em um computador).
Orientação e diagnóstico com instruções (fundo azul, médico recebendo orientações remotamente).
Execução e finalização do procedimento (fundo laranja, checklist com marcações).
A arte, assinada por Hellen Vieira para "Conexão Ciência", reforça o papel da tecnologia na melhoria da saúde.

Uma jornada de pesquisa e inovação

O pesquisador, que também possui cidadania espanhola, está em Granada desde o último trimestre do ano passado e permanecerá até maio de 2025, trabalhando em conjunto com especialistas locais. A Universidade de Granada, com mais de 500 anos de história e uma forte tradição acadêmica, foi escolhida como parceira ideal para essa pesquisa, especialmente por contar com um dos maiores centros de simulação da Europa, o Instituto IAVANTE, líder em formação e avaliação de competências para profissionais de saúde.

Durante a entrevista, o professor Carlos destacou a importância do respeito à ciência na Espanha, onde a valorização do conhecimento cria oportunidades para pesquisadores. Ele ressaltou que, ao se apresentar como pesquisador, percebe um genuíno interesse das pessoas em seu trabalho. “Quando você diz que é pesquisador aqui, as pessoas realmente querem saber o que você pesquisa”, afirmou. E esse reconhecimento está diretamente ligado à tradição científica do país.

Ele também refletiu sobre sua trajetória e a motivação que encontrou ao longo desta pesquisa. “Tenho 32 anos de UEM. Quer dizer, estou no topo da minha carreira, daqui a pouco vou me aposentar. Então, me encontrar na posição em que estou hoje e me sentir motivado a continuar, é muito bom. Foi uma injeção de ânimo muito grande, sabe? Algo que veio só a acrescentar para mim. E poder, de repente, desenvolver alguma coisa que servirá para as pessoas… Isso é muito legal”, destacou.

  • A imagem mostra o professor Carlos Edmundo Rodrigues Fontes, um homem de meia-idade com barba grisalha tirando uma selfie em frente a um prédio com a inscrição "Facultad de Ciencias de la Salud". Ele está vestindo um blazer azul e uma camisa branca, e carrega uma mochila no ombro. Sua expressão é séria, e ele olha diretamente para a câmera.
  • A imagem mostra o professor Carlos Edmundo Rodrigues Fontes, um homem de meia-idade com barba grisalha, usando um terno preto sobre uma camiseta branca, ele está dentro de uma sala de aula. Ao fundo há uma tela escrita "XII Congresso Nacional GESSEP" com uma apresentação intitulada Análisis de Usabilidad de "Gafas Inteligentes" con Realidad Aumentada en Procedimientos Sanitarios Realizados por Profisionales en un Entorno Simulado.

A realidade aumentada como ferramenta médica

O uso de óculos de realidade aumentada na saúde não é uma novidade, mas sua aplicação para atendimentos de urgência e emergência é algo pioneiro. O dispositivo permite que um especialista visualize, em tempo real, o que um profissional de saúde está enxergando em uma situação de atendimento. Além disso, o especialista pode fazer marcações na tela, indicar procedimentos e orientar a equipe local.

“A grande questão era saber se a distância influencia na qualidade do atendimento, devido ao possível delay1 na transmissão de dados”, explicou o pesquisador. Para testar essa hipótese, ele conduziu um experimento entre dois continentes, conectando médicos no Brasil e na Espanha. “No fim do ensaio, percebemos que a distância não é um obstáculo. Conseguimos realizar diagnósticos à distância de forma eficaz.”

Os testes foram realizados em um dos centros de simulação mais avançados da Europa, com manequins que imitam condições reais de traumas e emergências. As imagens captadas pelos óculos foram enviadas a especialistas a quilômetros de distância, que puderam avaliar os casos e dar orientações precisas sobre o tratamento adequado. Os resultados foram surpreendentes, abrindo novas perspectivas para a integração da tecnologia com a prática médica.

Testes e implementação no Brasil

Segundo o pesquisador, a tecnologia já está em teste na Universidade Estadual de Maringá, inclusive no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU). Um dos principais objetivos é utilizá-la em locais remotos onde há escassez de especialistas, permitindo que médicos de referência auxiliem atendimentos urgentes a quilômetros de distância.

No experimento realizado, dois casos clínicos foram analisados: uma criança vítima de acidente de trânsito e um motociclista com trauma torácico. Nos dois casos, o especialista à distância foi capaz de fazer diagnósticos precisos e indicar procedimentos essenciais, aumentando significativamente as chances de sobrevivência dos pacientes. Os testes mostraram que a tecnologia pode ser fundamental para agilizar a tomada de decisões e reduzir erros médicos.

Desafios e perspectivas futuras

Agora, a pesquisa avança para a etapa clínica. Após uma fase  completamente experimental, os testes serão aplicados diretamente em pacientes. “O que é lógico, tem que passar por uma parte experimental, porque se você vai fazer em seres humanos, não tem como sem testar antes de maneira simulada. É antiético”, explica o pesquisador.

Entre os primeiros projetos clínicos já em desenvolvimento está a prevenção de trombose venosa profunda, utilizando os óculos para monitoramento e diagnóstico precoce. Além disso, outros estudos estão sendo preparados para aplicar a tecnologia na assistência de pacientes politraumatizados. A ideia é que, em breve, a ferramenta esteja plenamente inserida no dia a dia da medicina, não apenas como um suporte à decisão médica, mas como parte essencial de protocolos emergenciais e hospitalares.

“Não adianta você ter uma tecnologia e isso não servir para ninguém. Se é publicado e fica em uma estante, não adianta, você não resolve nada”, conclui o pesquisador. Com esse espírito, a pesquisa segue avançando, sempre com o objetivo de levar soluções concretas para a prática médica e melhorar o acesso à saúde.

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Texto:
Jéssica Cafisso e Guilherme Nascimento dos Santos
Revisão de texto: Silvia Calciolari
Arte: Hellen Vieira
Supervisão de Arte: Hellen Vieira
Edição Digital: Guilherme Nascimento

Glossário

  1. Delay: atraso e diferença de tempo entre o envio e o recebimento de alguma informação. ↩︎

A pesquisa que mencionamos contribui para os seguintes ODS:

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