A aposentada Isabel Rodrigues é ministra da Igreja Maria Goreti e tem no seu smartphone diversos grupos de conversa no aplicativo WhatsApp. É pelo aplicativo que ela, junto com outras pessoas do grupo, combina o revezamento das atividades da igreja, trocam informações sobre pessoas com necessidade e marcam encontros e cafés. Certo dia, Isabel estava com dúvidas sobre a nova funcionalidade do aplicativo que aumenta a velocidade do áudio e mostrou, rapidamente, as conversas com suas amigas e conhecidos.
De um relance, lembro de ter ficado surpreso com uma grande quantidade de figurinhas (stickers), imagens brilhantes de bom dia e dezenas de emojis no WhatsApp da Isabel. Quando questionei sobre a presença desses elementos ela disse que era muito comum enviar e receber emojis e na sua opinião, “deixava a conversa mais leve”. Quanto aos emojis, vi uma infinidade de risadas, expressões faciais como tristeza, sorrindo e de mãos tocadas como em um gesto de oração.
Assim como Isabel, milhões de pessoas ao redor do mundo trocam, diariamente, mensagens e usam essas imagens nos computadores e telefones. Por estarem tão presentes nas conversas do dia a dia acabamos não pensando muito sobre o uso de todos esses ícones. Em tempos de pandemia, esse hábito aumentou, porque todos foram obrigados a cumprir as recomendações de distanciamento social, passando, assim, mais tempo utilizando tecnologias de comunicação, como as redes sociais, aplicativos e chats.
E o que parece ser uma mera ferramenta para traduzir estados emocionais por meio de imagens, agora tornou-se objeto de pesquisa na Universidade Estadual de Maringá (UEM, no Paraná, como é o caso do pesquisador e professor Tiago Lucena, do curso de Comunicação e Multimeios. Ele une jovens curiosos para estudar esses recursos em um grupo de pesquisa da Instituição.
Em uma recente investigação de iniciação científica, a estudante da UEM, Alice Loureiro, identificou como os emojis são aplicados no campo da saúde, revisando artigos em diversas bases de dados, espaço que organiza as publicações científicas, caracterizando cada um delas. Na ocasião, 158 artigos foram analisados de um total de mais de 700 escolhidos nas consultas nas bases de dados. “Para os artigos, usamos uma metodologia de pesquisa chamada Revisão de Escopo (scoping review, em inglês), seguindo as orientações do PRISMA – um documento com diversas orientações sobre como fazer e publicar pesquisas dessa natureza”, esclarece Tiago.
Eles conseguiram identificar um aumento no interesse pelos emojis nos últimos anos. Em 2008, nas mesmas bases de dados selecionadas, foram produzidos apenas dois artigos falando sobre o assunto. Já em 2020, o número saltou para 54, além de uma infinidade de outros trabalhos em anais de congresso, eventos e seminários, que não foram analisados por Alice e Tiago.
A jovem pesquisadora contou com a ajuda de dois estudantes do Ensino Médio, do Colégio de Aplicação da UEM (CAP), Vanderlei Silva e Julia Calvo, que possui uma bolsa de iniciação científica para o Ensino Médio, e outros participantes do grupo. Alice destaca que o uso dos emojis varia de acordo com sexo, idade e nacionalidade. Um exemplo de variação de significados em diferentes nacionalidades e culturas é o emoji de mãos tocadas, que, quando usado pelo grupo de Isabel, representa a oração, mas quando usado no Japão, volta a sua definição original da cultura japonesa, de cumprimento entre duas pessoas.
Criados em 1997, por uma empresa no Japão, esses recursos gráficos logo ganharam o mundo e representam elementos comuns nas conversas mediadas por computador e smartphones. Eles foram uma “evolução” daqueles “emoticons” que são expressões faciais realizadas usando pontuações. Assim, dois pontos + parênteses passaram a significar um rosto feliz :). Alice lembra que em conversas por meio do smartphone ou computador não conseguimos acessar tão facilmente os gestos, as expressões faciais e a entonação de voz. Esses são elementos de paralinguagem que ajudam a compreender como está o interlocutor e são importantes nas conversas. Por mais lúdicos que pareçam ser, eles representam elementos comunicacionais muito poderosos e são utilizados em diversos contextos de pesquisas.
Conforme a pesquisa mostrou, os emojis também se transformaram em objeto de investigação de diversos campos do saber e cientistas ao redor do mundo têm se atentado para o fenômeno com uma curiosidade mais sistematizada do que aquela que tive quando vi a mensagem do WhatsApp da Isabel. Há artigos que descrevem que, pelo emojis, podemos identificar pessoas em estados depressivos, outros sugerem que emojis de bandeiras e outros símbolos nacionais podem ser indicativos da inclinação política do usuário (se de esquerda ou direita), e tantos outros que identificam e analisam aplicações no campo da educação, psicologia, neurociência e até direito. Como saber se alguém foi irônico ou ameaçou alguém com base nos emojis usados?
Também foram identificadas pesquisas que relatam a aplicação de emojis em embalagens de produtos alimentícios e estratégias de comunicação e marketing para diversos produtos. A depender do emoji utilizado, é possível incentivar que profissionais da saúde lavem mais as mãos em banheiros de hospitais, como mostrou uma pesquisa. Emojis também têm maior eficiência na comunicação entre médicos e pacientes, principalmente, se esses forem crianças (que podem escolher entre emojis para expressar como se sentem – por exemplo em situações de dor) ou em pessoas que não dominam bem o idioma do local onde estão sendo atendidas (não-letradas ou refugiados, por exemplo). Assim, diversos artigos destacaram a importância do uso desse recurso de comunicação no campo da saúde.
Dessa forma, registramos aqui o que falamos cotidianamente, mas sem muita convicção. Uma imagem pode valer por mais de mil palavras.
O conteúdo desta página foi produzido por
Texto: Rafael Donadio
Supervisão: Ana Paula Machado Velho
Edição de áudio: Rafael Donadio
Edição de vídeo: Thamiris Saito
Arte: John Zegobia
Supervisão de Arte: Thiago Franklin Lucena
Edição Digital: Gutembergue Junior