Na última década, o debate sobre a emergência climática se intensificou e os impactos das mudanças climáticas passaram a ser sentidos de maneira indiscutível. Em alguns sistemas ecológicos, já estamos atingindo o ponto de não-retorno.
Mas o que seria o ponto de não retorno?
É o momento em que uma mudança ou dano em um sistema se torna irreversível. Ou seja, mesmo com ações para mitigação do impacto, não é possível restaurar aquele sistema ao seu estado original.
O oceano também é afetado nesse cenário: de acordo com os cientistas, algumas áreas já estão atingindo o ponto de não retorno por conta do aquecimento das águas.
Esse super aquecimento do oceano traz inúmeros impactos tanto para a vida marinha quanto para as populações humanas. O branqueamento dos corais, a perda da biodiversidade marinha e as alterações nas correntes oceânicas são apenas alguns dos impactos vistos nos últimos anos e que geram uma série de consequências para a vida no planeta.
Isso porque o oceano e os ecossistemas desempenham um papel fundamental na regulação do clima do planeta. Eles absorvem grandes quantidades de dióxido de carbono (CO₂), ajudando a mitigar os impactos das mudanças climáticas. E, além disso, o oceano distribui o calor ao redor do globo através das correntes marinhas.
Os ecossistemas marinhos, por sua vez, como manguezais e recifes de corais, também protegem zonas costeiras de tempestades e erosões, reforçando a estabilidade climática do planeta.
Esse cenário levanta a seguinte questão: de que maneira temos cuidado do nosso oceano?
Um recorte temporal: 10 anos olhando para o oceano
A Organização das Nações Unidas (ONU) decretou, em 2015, o plano global chamado ‘Agenda 2030’, que tem como objetivo o desenvolvimento sustentável do planeta até o fim desta década.
A Agenda se baseia em 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, os ODS, que perpassam questões como crescimento econômico, inclusão social e sustentabilidade.

Dois anos depois, em 2017, a ONU em conjunto com a Comissão Oceanográfica Intergovernamental da UNESCO (COI-UNESCO), proclamou a Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável, iniciativa que passou a ser implementada de 2021 a 2030.
O objetivo da década segue sendo o de cumprir os compromissos da Agenda 2030, mas com ênfase no ODS 14, vida na água, que tem como mote ‘conservar e usar de forma sustentável o oceano, os mares e os recursos marinhos’.
Dentre as ações que envolvem essa década, estão: o fortalecimento da cooperação internacional no que diz respeito à pesquisa científica, o fomento de políticas públicas e inovação para proteger ecossistemas marinhos, a mitigação dos impactos atuais das mudanças climáticas e a garantia da preservação do oceano.
Coalizão Paraná pela Década do Oceano
Tendo esse cenário como plano de fundo, nasce, em 2019, a Coalizão UFPR pela Década do Oceano. A ideia veio de uma reunião de pesquisadores do Programa de Pós-Graduação em Sistemas Costeiros e Oceânicos (PGSISCO) e do Centro de Estudos do Mar (CEM), ambos da Universidade Federal do Paraná (UFPR), em Pontal do Paraná.
Três anos depois, essa reunião ganhou um número ainda maior de pesquisadores e colaboradores. Assim, em 2022, passou a se chamar Coalizão Paraná pela Década do Oceano e, agora, reúne também pesquisadores da Universidade Estadual do Paraná (UNESPAR) e do Instituto Federal do Paraná (IFPR), campus Paranaguá.

“A ideia era que a gente primeiro conseguisse fortalecer uma conversa entre os pesquisadores para identificar qual é a ciência que já vem sendo desenvolvida nessas três universidades, com múltiplos entendimentos e com uma multidisciplinaridade…”, explica a professora da UFPR e responsável pelo Laboratório de Ecologia e Conservação (LEC-UFPR), Camila Domit, também coordenadora da Rede.
O projeto foi contemplado por um edital do Conselho Nacional de Desenvolvimento Tecnológico (CNPq) e Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), que subsidia o trabalho realizado pelo grupo.
A Coalizão, portanto, se articulou como uma rede colaborativa de Ciência Oceânica, que promove, além de divulgação científica, produtos e ações de integração entre ciência, sociedade e gestão no estado, sobretudo na região do litoral paranaense.
“A partir desses entendimentos, a gente tem alguns dobramentos de tradução dessa ciência para diferentes públicos. E entre os públicos elencados no projeto, a gente incluiu tanto a sociedade, os estudantes de escolas públicas e privadas de ensino fundamental e médio, os estudantes da universidade e também os gestores”, completa Camila.
Esse trabalho, realizado no litoral do Paraná, gira em torno de cinco eixos: ecossistemas marinhos e costeiros; biodiversidade marinha e costeira; humanidades e oceano; interação continente-atmosfera-oceano; e futuro do oceano.

Nesse sentido, a rede abraça um leque de objetivos, que vão desde o engajamento da Academia e da comunidade interna que pesquisa a área da ciência oceânica, a divulgação científica para os diferentes públicos, bem como a organização de banco de dados e sínteses de resultados, que sirvam de subsídio para atuação dos gestores na criação de políticas públicas.
Quem mergulha nesse oceano?
Para que o trabalho da Rede seja possível, ele precisa ser feito com ajuda de muitas mãos: são cerca de 90 pesquisadores cadastrados cooperando e trabalhando em conjunto para pensar sobre o nosso oceano. Os pesquisadores que integram a Coalizão estão cadastrados no site da rede.
A articulação desse grupo facilita que pesquisadores encontrem seus pares em temáticas de estudo comuns no que diz respeito à Ciência Oceânica. Desse modo, a produção acadêmica vem sendo fortalecida.

Para conectar essas pessoas, a pesquisadora e gerente da Coalizão, Mariana Lacerda, explica que o grupo produz uma série de materiais para reunir e divulgar as produções, como newsletters mensais, podcasts, conteúdos nas redes sociais, workshops guiados pelos eixos temáticos, além da comunicação interna com os pesquisadores.
“A gente fala que o principal objetivo, que também é o grande desafio, é o de se trabalhar em rede. Mas o que a gente pensa é que de alguma forma, ao longo do tempo, essa rede vai sendo alimentada e ela começa a girar”, argumenta Mariana.
Além disso, o trabalho da Coalizão anda lado a lado com outros projetos e iniciativas das instituições de ensino UFPR, IFPR e UNESPAR, bem como de outras organizações como a Associação MarBrasil
“Então a ideia não é que a Coalizão execute projetos. […] O que nós queremos é aproximar essas pessoas, para elas conversarem, trocarem informações e, além disso, ajudá-las a construir materiais, diálogos, espaços de divulgação, onde elas vão conseguir escalonar a pesquisa para esse nível de educação, de comunicação, da cultura científica e da cultura oceânica”, explica a pesquisadora Camila.
Nesse sentido, a Coalizão atua dando suporte na comunicação, divulgação e organização de ações coletivas para esses projetos, cultivando a divulgação científica no âmbito escolar e universitário e facilitando a conexão entre ciência e a sociedade.
Esse importante trabalho de alfabetização oceânica e educomunicação, ajuda a traduzir em diferentes linguagens o que vem sendo produzido na academia e nos projetos sociais ligados ao oceano.
Existe um futuro possível?
Conectar pesquisadores e estudantes e sensibilizar a sociedade no que diz respeito aos estudos do oceano é uma parte essencial do trabalho da Coalizão. Entretanto, é necessário que as pesquisas acadêmicas e ações sejam traduzidas na forma de subsídios para os gestores e governanças territoriais.
“Nós estamos nesse processo agora de construir também esses espaços, documentos e esse diálogo com os gestores. A ideia é fazer a tradução desses dados de ciência e também escutar os órgãos ambientais, para saber o que eles estão precisando da ciência, quais são as prioridades em relação aos dados científicos, para que eles tenham um processo de gestão mais adequado para o território”, explica Camila Domit.

A meta, portanto, é colaborar para que a governança, em nível local e regional, possa tomar decisões sustentáveis e que colaborem para a proteção do oceano, manutenção da biodiversidade e para a justiça social.
Dessa forma, é possível construir em conjunto e de maneira comunitária, uma realidade outra, que proteja o oceano, a vida marinha e a nossa biodiversidade, estendendo essas ações para além da década atual – mas também para um futuro possível a longo prazo.
Embora o ponto de não-retorno acenda um alerta na situação em que o planeta se encontra, ele ainda não foi alcançado. Ainda é possível – e necessário – buscarmos soluções, em conjunto, para cuidar do nosso oceano. Ainda dá tempo de mergulharmos juntos nessa missão.
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Texto: Camila Lozeckyi
Supervisão de Texto: Ana Paula Machado Velho
Arte: Camila Lozeckyi
Supervisão de arte: Tiago Franklin Lucena
Edição Digital: Gutembergue Junior
Glossário
A pesquisa que mencionamos contribui para os seguintes ODS:

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