Uma década dedicada ao estudo do oceano

A rede Coalizão Paraná pela Década do Oceano une forças de projetos e pesquisadores em torno da Década da Ciência Oceânica

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Na última década, o debate sobre a emergência climática se intensificou e os impactos das mudanças climáticas passaram a ser sentidos de maneira indiscutível. Em alguns sistemas ecológicos, já estamos atingindo o ponto de não-retorno. 

Mas o que seria o ponto de não retorno?

É o momento em que uma mudança ou dano em um sistema se torna irreversível. Ou seja, mesmo com ações para mitigação do impacto, não é possível restaurar aquele sistema ao seu estado original. 

O oceano também é afetado nesse cenário: de acordo com os cientistas, algumas áreas já estão atingindo o ponto de não retorno por conta do aquecimento das águas.

Esse super aquecimento do oceano traz inúmeros impactos tanto para a vida marinha quanto para as populações humanas. O branqueamento dos corais, a perda da biodiversidade marinha e as alterações nas correntes oceânicas são apenas alguns dos impactos vistos nos últimos anos e que geram uma série de consequências para a vida no planeta.

Isso porque o oceano e os ecossistemas desempenham um papel fundamental na regulação do clima do planeta. Eles absorvem grandes quantidades de dióxido de carbono (CO₂), ajudando a mitigar os impactos das mudanças climáticas. E, além disso, o oceano distribui o calor ao redor do globo através das correntes marinhas.

Os ecossistemas marinhos, por sua vez, como manguezais e recifes de corais, também protegem zonas costeiras de tempestades e erosões, reforçando a estabilidade climática do planeta.

Esse cenário levanta a seguinte questão: de que maneira temos cuidado do nosso oceano?

Um recorte temporal: 10 anos olhando para o oceano

A Organização das Nações Unidas (ONU) decretou, em 2015, o plano global chamado ‘Agenda 2030’, que tem como objetivo o desenvolvimento sustentável do planeta até o fim desta década.

A Agenda se baseia em 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, os ODS, que perpassam questões como crescimento econômico, inclusão social e sustentabilidade.

A imagem contém os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) estabelecidos pela ONU, cada um representado por um ícone e uma cor distinta. Os objetivos incluem: erradicação da pobreza, fome zero, saúde e bem-estar, educação de qualidade, igualdade de gênero, água potável e saneamento, energia limpa e acessível, trabalho decente e crescimento econômico, inovação e infraestrutura, redução das desigualdades, cidades sustentáveis, consumo responsável, ação climática, vida marinha, vida terrestre, paz e justiça, e parcerias globais para o desenvolvimento sustentável. O logotipo "The Global Goals" aparece no canto inferior direito.
Os 17 ODS da ONU ilustrados pela artista Hellen Vieira, integrante da equipe do Conexão Ciência (Ilustração/Conexão Ciência)

Dois anos depois, em 2017, a ONU em conjunto com a Comissão Oceanográfica Intergovernamental da UNESCO (COI-UNESCO), proclamou a Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável, iniciativa que passou a ser implementada de 2021 a 2030.

O objetivo da década segue sendo o de cumprir os compromissos da Agenda 2030, mas com ênfase no ODS 14, vida na água, que tem como mote ‘conservar e usar de forma sustentável o oceano, os mares e os recursos marinhos’. 

Dentre as ações que envolvem essa década, estão: o fortalecimento da cooperação internacional no que diz respeito à pesquisa científica, o fomento de políticas públicas e inovação para proteger ecossistemas marinhos, a mitigação dos impactos atuais das mudanças climáticas e a garantia da preservação do oceano. 

Coalizão Paraná pela Década do Oceano

Tendo esse cenário como plano de fundo, nasce, em 2019, a Coalizão UFPR pela Década do Oceano. A ideia veio de uma reunião de pesquisadores do Programa de Pós-Graduação em Sistemas Costeiros e Oceânicos (PGSISCO) e do Centro de Estudos do Mar (CEM), ambos da Universidade Federal do Paraná (UFPR), em Pontal do Paraná.

Três anos depois, essa reunião ganhou um número ainda maior de pesquisadores e colaboradores. Assim, em 2022, passou a se chamar Coalizão Paraná pela Década do Oceano e, agora, reúne também pesquisadores da Universidade Estadual do Paraná (UNESPAR) e do Instituto Federal do Paraná (IFPR), campus Paranaguá. 

A imagem mostra uma mesa-redonda durante a V Semana de Estudos Ambientais do IFPR em Paranaguá. Cinco mulheres estão sentadas, participando de uma discussão. Uma delas segura um microfone, falando para o público, enquanto as outras prestam atenção. No fundo, um slide projeta o logo do evento com o tema "O Meio Ambiente conectando o território litoral do Paraná". O ambiente é formal e acadêmico, com uma decoração simples, incluindo um tecido verde ao fundo.
Mesa Redonda Cultura Oceânica da V Semana de Estudos Ambientais do IFPR 2023 (Foto/Coalizão Paraná)

“A ideia era que a gente primeiro conseguisse fortalecer uma conversa entre os pesquisadores para identificar qual é a ciência que já vem sendo desenvolvida nessas três universidades, com múltiplos entendimentos e com uma multidisciplinaridade…”, explica a professora da UFPR e responsável pelo Laboratório de Ecologia e Conservação (LEC-UFPR), Camila Domit, também coordenadora da Rede.

O projeto foi contemplado por um edital do Conselho Nacional de Desenvolvimento Tecnológico (CNPq) e Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), que subsidia o trabalho realizado pelo grupo.

A Coalizão, portanto, se articulou como uma rede colaborativa de Ciência Oceânica, que promove, além de divulgação científica, produtos e ações de integração entre ciência, sociedade e gestão no estado, sobretudo na região do litoral paranaense.

“A partir desses entendimentos, a gente tem alguns dobramentos de tradução dessa ciência para diferentes públicos. E entre os públicos elencados no projeto, a gente incluiu tanto a sociedade, os estudantes de escolas públicas e privadas de ensino fundamental e médio, os estudantes da universidade e também os gestores”, completa Camila.

Esse trabalho, realizado no litoral do Paraná, gira em torno de cinco eixos: ecossistemas marinhos e costeiros; biodiversidade marinha e costeira;  humanidades e oceano; interação continente-atmosfera-oceano; e futuro do oceano.

A imagem descreve os Eixos Temáticos da Coalizão Paraná pela Década do Oceano, destacando seis áreas de foco relacionadas à preservação e ao estudo dos oceanos. Aqui estão os eixos apresentados:
Ecossistemas Marinhos e Costeiros (Macroecologia):
Foco em grandes ecossistemas marinhos e áreas costeiras.
Biodiversidade Marinha e Costeira (Vida Marinha e Costeira):
Estudo da vida que habita os oceanos e regiões costeiras.
Humanidade e Oceano (Dimensão Humana):
Explora a relação entre seres humanos e o oceano.
Interação Continente-Oceano-Atmosfera (Processos Climáticos e Oceânicos):
Investiga as conexões entre os continentes, oceanos e a atmosfera, principalmente em relação aos processos climáticos.
Futuro do Oceano ("O Oceano que Precisamos para o Futuro que Queremos"):

Discutindo soluções e objetivos para garantir um oceano sustentável no futuro.
Eixo Transversal (Comunicação, Inovação, Tecnologia, Processos, Metodologias):
Integração de comunicação, inovação e tecnologia em todas as áreas de estudo dos oceanos.
A arte foi creditada à Camila Lozeckyi e a fonte "Conexão Ciência" é mencionada no canto inferior da imagem. O fundo tem uma estética inspirada no mar e na natureza, com cores suaves e ícones que representam os temas principais.

Nesse sentido, a rede abraça um leque de objetivos, que vão desde o engajamento da Academia e da comunidade interna que pesquisa a área da ciência oceânica, a divulgação científica para os diferentes públicos, bem como a organização de banco de dados e sínteses de resultados, que sirvam de subsídio para atuação dos gestores na criação de políticas públicas. 

Quem mergulha nesse oceano?

Para que o trabalho da Rede seja possível, ele precisa ser feito com ajuda de muitas mãos: são cerca de 90 pesquisadores cadastrados cooperando e trabalhando em conjunto para pensar sobre o nosso oceano. Os pesquisadores que integram a Coalizão estão cadastrados no site da rede.

A articulação desse grupo facilita que pesquisadores encontrem seus pares em temáticas de estudo comuns no que diz respeito à Ciência Oceânica. Desse modo, a produção acadêmica vem sendo fortalecida.

A imagem mostra uma página da "Rede de Pesquisa" com filtros de busca para selecionar nomes, instituições, áreas de atuação e eixos temáticos de pesquisadores. Dois perfis de pesquisadores estão destacados. Aislyn Alvarenga, da USP, é doutoranda em oceanografia e realiza pesquisas em reconstruções paleoceanográficas, focando em foraminíferos. Allan Paul Krelling, do IFPR, é professor e atua em pesquisas sobre lixo no mar, gestão costeira integrada e desenvolvimento sustentável. Ambos possuem informações de contato e suas áreas de pesquisa, com fotos de perfil.
Rede de Pesquisadores do Coalizão Paraná pela Década do Oceano no site do projeto (Foto/Reprodução)

Para conectar essas pessoas, a pesquisadora e gerente da Coalizão, Mariana Lacerda, explica que o grupo produz uma série de materiais para reunir e divulgar as produções, como newsletters mensais, podcasts, conteúdos nas redes sociais, workshops guiados pelos eixos temáticos, além da comunicação interna com os pesquisadores.

“A gente fala que  o principal objetivo, que também é o grande desafio, é o de se trabalhar em rede. Mas o que a gente pensa é que de alguma forma, ao longo do tempo, essa rede vai sendo alimentada e ela começa a girar”, argumenta Mariana.

  • A imagem mostra um grupo de seis pessoas reunidas ao redor de uma mesa redonda, sorrindo e engajadas em uma conversa animada. Duas mulheres de cabelo cacheado, uma de costas e outra de perfil, estão entre os participantes. Na mesa, há documentos, um laptop e uma garrafa de água, sugerindo que eles estão em um ambiente colaborativo ou de trabalho, possivelmente participando de uma reunião ou workshop.
  • A imagem mostra um grupo de pessoas assistindo a uma apresentação em um ambiente de workshop. Os participantes estão sentados em cadeiras, voltados para uma tela de projeção, onde uma mulher está em pé, fazendo uma apresentação. Na tela, há informações sobre o "Workshop Biodiversidade Marinha e Costeira do Litoral do Paraná", com imagens relacionadas à vida marinha e logos de organizações envolvidas. No canto esquerdo, há um banner com o logo "Coalizão Paraná pela Década do Oceano".
  • A imagem retrata um grupo de aproximadamente 20 pessoas posando juntas para uma foto em uma sala de workshop. Todos estão sorrindo e parecem estar participando de um evento relacionado à "Coalizão Paraná pela Década do Oceano", como indicado no banner posicionado à esquerda. Vários dos participantes estão vestindo camisetas com o logo do evento, e o clima geral é de camaradagem e engajamento. O fundo da sala é simples, com um quadro branco e equipamentos de apresentação, sugerindo um ambiente educacional ou de trabalho colaborativo.

Além disso, o trabalho da Coalizão anda lado a lado com outros projetos e iniciativas das instituições de ensino UFPR, IFPR e UNESPAR, bem como de outras organizações como a Associação MarBrasil

“Então a ideia não é que a Coalizão execute projetos. […] O que nós queremos é aproximar essas pessoas, para elas conversarem, trocarem informações e, além disso, ajudá-las a construir materiais, diálogos, espaços de divulgação, onde elas vão conseguir escalonar a pesquisa para esse nível de educação, de comunicação, da cultura científica e da cultura oceânica”, explica a pesquisadora Camila.

  • A imagem mostra um grupo de jovens participando de uma atividade prática em torno de uma mesa. Eles estão manuseando objetos e analisando materiais com instrumentos de laboratório, como pinças e luvas. Ao fundo, uma mulher de camiseta branca observa e sorri, orientando o grupo. Na parede ao fundo, há uma tela de projeção com a frase "Vamos investigar juntos!!!". A atividade parece ser uma oficina educativa, possivelmente sobre questões ambientais ou científicas. O ambiente é descontraído e colaborativo.
  • A imagem mostra um grupo de jovens em um ambiente escolar, possivelmente em uma sala de aula. Eles parecem estar em um momento de interação descontraída, com três rapazes e uma moça em destaque, sorrindo e conversando. Ao fundo, outros estudantes estão sentados em mesas, também interagindo. A moça de pé, com cabelos longos e óculos, usa uma camiseta clara e parece estar liderando ou participando ativamente da conversa. O ambiente é iluminado e o clima geral sugere colaboração e troca de ideias.
  • A imagem mostra uma atividade interativa em um estande expositivo, realizada em um local próximo à praia. Vemos uma criança e algumas mulheres participando da atividade, que parece envolver o uso de caixas com aberturas nas quais os participantes colocam as mãos, talvez para sentir objetos relacionados ao tema da exposição. Ao fundo, há um banner com informações sobre o oceano e sua importância, destacando tópicos como a regulação do clima, proteção de costas, turismo e recreação. O clima é de aprendizado e conscientização sobre questões ambientais, com foco no oceano.
  • A imagem mostra crianças participando de uma atividade artística em um evento, provavelmente relacionado ao meio ambiente. As crianças, vestindo camisetas com o logotipo de uma secretaria municipal de educação, estão em frente a um mural onde estão deixando suas marcas de mãos coloridas com tinta. Uma das crianças está com a mão coberta de tinta verde, pronta para fazer sua marca no mural, que já está repleto de impressões de mãos coloridas. Ao fundo, adultos e outras crianças também participam do evento. O clima é de diversão e criatividade, promovendo a conscientização ambiental de forma lúdica.

Nesse sentido, a Coalizão atua dando suporte na comunicação, divulgação e organização de ações coletivas para esses projetos, cultivando a divulgação científica no âmbito escolar e universitário e facilitando a conexão entre ciência e a sociedade.

Esse importante trabalho de alfabetização oceânica e educomunicação, ajuda a traduzir em diferentes linguagens o que vem sendo produzido na academia e nos projetos sociais ligados ao oceano. 

Existe um futuro possível?

Conectar pesquisadores e estudantes e sensibilizar a sociedade no que diz respeito aos estudos do oceano é uma parte essencial do trabalho da Coalizão. Entretanto, é necessário que as pesquisas acadêmicas e ações sejam traduzidas na forma de subsídios para os gestores e governanças territoriais. 

“Nós estamos nesse processo agora de construir também esses espaços, documentos e esse diálogo com os gestores. A ideia é fazer a tradução desses dados de ciência e também escutar os órgãos ambientais, para saber o que eles estão precisando da ciência, quais são as prioridades em relação aos dados científicos, para que eles tenham um processo de gestão mais adequado para o território”, explica Camila Domit. 

A imagem mostra um grupo de pessoas caminhando por uma trilha em meio à vegetação de restinga. Elas estão de costas para a câmera, caminhando em direção a uma área aberta sob um céu claro. Algumas pessoas carregam garrafas de água, mochilas e estão vestidas de forma casual. O ambiente ao redor é de natureza, com plantas rasteiras e arbustos típicos de uma área de restinga. Trata-se de uma atividade ao ar livre, relacionada a educação ambiental ou um passeio ecológico.
Trilha Restinga – Ações de visitas de escolas no CEM-UFPR (Foto/Coalizão Paraná)

A meta, portanto, é colaborar para que a governança, em nível local e regional, possa tomar decisões sustentáveis e que colaborem para a proteção do oceano, manutenção da biodiversidade e para a justiça social. 

Dessa forma, é possível construir em conjunto e de maneira comunitária, uma realidade outra, que proteja o oceano, a vida marinha e a nossa biodiversidade, estendendo essas ações para além da década atual – mas também para um futuro possível a longo prazo.

Embora o ponto de não-retorno acenda um alerta na situação em que o planeta se encontra, ele ainda não foi alcançado. Ainda é possível – e necessário – buscarmos soluções, em conjunto, para cuidar do nosso oceano. Ainda dá tempo de mergulharmos juntos nessa missão. 

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Texto:
Camila Lozeckyi
Supervisão de Texto: Ana Paula Machado Velho
Arte: Camila Lozeckyi
Supervisão de arte: Tiago Franklin Lucena
Edição Digital: Gutembergue Junior

Glossário

A pesquisa que mencionamos contribui para os seguintes ODS:

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