Há três anos, o C² contou a história do primeiro dinossauro descoberto no Paraná, o Vespersaurus paranaensis. Na época, o professor Lucas Sant’Ana, então integrante da equipe da Universidade Estadual de Maringá (UEM) que assumiu os trabalhos realizados no sítio paleontológico de Cruzeiro do Oeste, nos contou com exclusividade detalhes sobre a descoberta.
Recentemente, bateu a curiosidade: será que há novidades sobre esses estudos? Já conhecemos mais sobre o Vespersaurus? Ou, quem sabe, outros dinossauros foram encontrados? Como a curiosidade é a marca registrada do C², fomos em busca de respostas. E, mais uma vez, quem nos ajudou a descobrir o que há de novo foi Sant’Ana, que agora atua como professor no Instituto Federal do Paraná (IFPR).

Em uma nova conversa, ele já começou contando de cara: temos um segundo dinossauro descoberto aqui no nosso estado! O Berthasaura leopoldinae faz parte do grupo dos terópodes, representado mundialmente pelo Tiranossauro rex. Esta espécie foi encontrada entre 2011 e 2014 também em Cruzeiro do Oeste, o que reitera a importância do sítio fossilífero no Oeste paranaense.
O excelente estado de conservação do fóssil permitiu avanços significativos nas pesquisas, que revelaram, dez anos após a descoberta, detalhes sobre o Berthasaura, um jovem terópode de cerca de um metro de comprimento, 80 cm de altura e com peso de oito a dez quilos. Além disso, era uma espécie edêntula (sem dentes), característica rara em indivíduos jovens desse grupo.

Incrível, né? Mas não para por aí. Uma outra descoberta fez com que o Paraná tenha, atualmente, três espécies de pterossauros: Keresdrakon vilsoni, Caiuajara dobruskii e Torukjara bandeirae. Não é à toa que Cruzeiro do Oeste é apelidada de Cemitério dos Pterossauros, se destacando mundialmente nos estudos paleontológicos.
Preservar para educar
A importância do sítio arqueológico de Cruzeiro do Oeste traz à tona a necessidade de proteção e conservação dessas áreas. Devemos preservá-los não somente para garantir que mais pesquisas e descobertas possam ser feitas no futuro, mas também para que a população possa aprender sobre como era a pré-história das cidades que habitam.

É com esse propósito que surgem as propostas de criação de geoparques, que são uma estratégia para proteger e valorizar áreas de relevância geológica. Esses parques combinam a preservação do patrimônio geológico com iniciativas de educação e desenvolvimento sustentável, conectando ciência, história e cultura. Além disso, os geoparques impulsionam o geoturismo, que utiliza a geodiversidade como base para o desenvolvimento econômico responsável.
Além das descobertas dos novos dinossauros e pterossauros, Sant´Ana conta que uma das maiores novidades é a criação de um consórcio para a implantação do Geoparque Caiuá, no Paraná. Atualmente, o projeto ainda está em fase de desenvolvimento.
“Toda pesquisa e projeto nascem de um problema. Sempre que promovíamos palestras, capacitações ou conversávamos com professores e comerciantes de Cruzeiro do Oeste, percebíamos que, embora eles compreendessem as descobertas feitas na região, tinham dificuldade em conectar isso com o impacto direto na vida deles. Isso nos incomodava, mas de forma positiva. Afinal, são os cidadãos, por meio dos impostos, que viabilizam muitas das nossas pesquisas. Foi daí que surgiu a ideia do geoparque: uma forma de valorizar o potencial geológico da região e mostrar à população como a ciência está profundamente ligada ao nosso cotidiano”, conta o professor.
O Geoparque Caiuá não será delimitado por muros. Na verdade, ele é uma iniciativa entre cinco cidades: Cruzeiro do Oeste, Mariluz, Alto Piquiri, Formosa do Oeste e Tuneiras do Oeste. Assim, juntas, essas cidades poderão formar um corredor de belezas naturais raras, como o sítio arqueológico de Cruzeiro do Oeste, a Reserva das Perobas e as cachoeiras e corredeiras dos rios Piquiri e Goioerê.
“Passamos mais de um ano explorando estradas rurais e áreas de difícil acesso nas cinco cidades. Nosso objetivo era mapear novos atrativos naturais além dos já conhecidos. Recentemente, foi descoberto um sistema de cavernas graças aos moradores da área rural, que sempre souberam da existência delas, mas só perceberam sua possível importância histórica e natural após o início do projeto. Isso mostra como o Geoparque é essencial para a comunidade local, já que ele ajuda nesse processo de reconhecimento do valor científico e econômico de algo que antes parecia trivial”, destaca Sant’Ana.
Uma das teorias sobre a formação dessas cavernas aponta para a escavação feita por preguiças-gigantes, que viveram nessa região há cerca de 10 a 11 mil anos. O professor explica que esses animais criavam buracos para abrigo e reprodução, deixando marcas de garras que ainda podem ser vistas hoje.

Sant’Ana foi convidado pela prefeitura de Cruzeiro do Oeste para atuar como consultor técnico do Geoparque. Ele também destaca que a UEM está envolvida no projeto, com o apoio de uma pesquisa financiada por um edital do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). A equipe da Universidade é coordenada pela professora do Departamento de Geografia (DGE) da UEM, Juliana de Paula, e visa, por meio de pesquisas, estabelecer ações coordenadas para a implantação do Geoparque.
Além disso, outro objetivo do grupo é a elaboração dos documentos necessários para candidatura à rede da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) de Geoparques Mundiais. O professor explica que para um geoparque ser reconhecido pela Organização é essencial que o processo tenha o apoio das comunidades locais, parcerias fortes na região, suporte público e político de longo prazo e uma estratégia bem planejada, que atenda aos objetivos da população enquanto protege e valoriza o patrimônio geológico da área.
Afinal, um geoparque não deve envolver apenas Geologia. Ele deve, também, explorar, desenvolver e celebrar as relações entre esse patrimônio geológico e todos os outros aspectos patrimoniais naturais, culturais e imateriais da área. Assim, por meio de investimentos iniciais da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico e Turismo de Cruzeiro do Oeste e das cidades vizinhas, o projeto do Geoparque Caiuá pode, agora, procurar mais investimentos em outras instituições parceiras e, futuramente, solicitar reconhecimento como Geoparque Mundial da UNESCO.
Geoparques no Brasil
O Brasil conta, atualmente, com cinco Geoparques Mundiais da UNESCO. O primeiro a receber a chancela no país foi o Geoparque Araripe, no Cariri cearense. A região conta com um dos maiores depósitos de fósseis do período Cretáceo Inferior em todo o mundo. Ainda no Nordeste brasileiro, o Geoparque Seridó se destaca pelos registros de povos antigos e de minérios provenientes de atividades vulcânicas no passado. Com sete geossítios, quem marca presença no Sudeste é o Geoparque Uberaba em Minas Gerais, o mais novo reconhecido pela UNESCO.
O Sul do Brasil conta com três geoparques. Entre eles, o Caçapava, no Rio Grande do Sul, que apresenta rochas sedimentares marinhas e continentais de mais de 500 milhões de anos. Entre a divisa de Santa Catarina e o estado gaúcho está localizado o Geoparque Caminhos dos Cânions Sul, que abriga os Parques Nacionais Aparados da Serra, Serra Geral e o Parque Estadual de Itapeva. Ainda no Rio Grande do Sul, o Geoparque Quarta Colônia é composto por nove cidades e é abundante em rios, cascatas e fósseis.
As iniciativas para a criação do Geoparque Caiuá, no Paraná, destacam a importância de aliar ciência, preservação ambiental e desenvolvimento sustentável. Além de valorizar o patrimônio geológico da região, o projeto busca fortalecer a conexão entre as comunidades locais e a história natural de seu território. Com o apoio de pesquisadores, moradores e instituições, o Geoparque tem o potencial de se tornar um modelo de conservação e turismo responsável, ampliando as possibilidades de pesquisa, educação e investimentos para o futuro da região.
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Texto: Luiza da Costa
Revisão: Silvia Calciolari
Supervisão de Texto: Ana Paula Machado Velho
Arte: Lucas Higashi
Supervisão de arte: Tiago Franklin Lucena
Edição Digital: Gutembergue Junior
A pesquisa que mencionamos contribui para os seguintes ODS:

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