Florestas Urbanas: vida na cidade

Mais do que apenas fazer sombras, as árvores desempenham diversas funções importantes no meio urbano

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Árvores na cidade. Esse foi o tema que mobilizou mais de 350 pessoas, entre os dias 15 e 23 de setembro, em Maringá. Estamos falando do Congresso Brasileiro de Arborização Urbana (CBAU), realizado pela Sociedade Brasileira de Arborização Urbana (SBAU). A programação, além de extensa, foi diversa, com campeonatos de escalada, minicursos, visitas técnicas, palestras e mesas-redondas. Os temas chamaram a atenção do C², que percebeu a riqueza da pesquisa e da tecnologia nesta área. Só de palestrantes foram 52. A ideia era contribuir com a profissionalização e com a conscientização da população em relação à arborização e ao planejamento urbano no que diz respeito às árvores.

O debate a respeito das árvores e a importância delas para o meio urbano, se tornou assunto emergente. Afinal, é necessário conscientizar as pessoas de que estamos em um período de aumento acelerado das temperaturas da Terra e da intensificação dos eventos extremos, tristemente irreversíveis e são essas ‘plantinhas’, na verdade, que podem, de alguma forma, garantir a sobrevivência humana. A sombra de uma árvore faz um bem danado, não é mesmo? Principalmente, nos dias mais quentes e secos de um verão. 

Quando falamos em calor exagerado em plena região sul do Brasil, chegando aos 40º C, até parece mentira. Mas, na última semana de setembro de 2023, o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) indicou um aumento de 5°C da temperatura no Paraná. Os dados demonstram consequências terríveis à saúde da população. Esse não parece ser um caso isolado. Ainda este ano, a ONU alertou que julho foi o mês mais quente da história. O aumento de altas temperaturas é decorrente de vários fatores, um deles é a falta de arborização adequada nos ambientes urbanos. 

Isso ocorre devido ao mal planejamento urbano. A graduanda em Comunicação e Multimeios da Universidade Estadual de Maringá (UEM), Eduarda Omiak Malacarne, conta que, quando morava em uma casa alugada na cidade de Campo Mourão, no Paraná, percebeu a falta de sombras e resolveu plantar árvores no local junto com a família.

Graduanda em Comunicação e Multimeios Eduarda Omiak Malacarne (Foto/Maysa Ribeiro Macedo)

A estudante lembra que “no verão, faz muito calor. Então, resolvemos plantar em frente a nossa casa algumas mudas para que pudéssemos ter sombra e umidade”. Apesar da boa intenção, o plantio que não atende aos critérios estabelecidos pelo plano de arborização municipal pode acarretar diversos problemas: acidentes de trânsito, quedas de árvores e até intoxicação por plantas. A população pode fazer parte do ‘reflorestamento da cidade’, desde que siga as normas determinadas pela prefeitura.

Em outras palavras, um planejamento é fundamental. Falando nisso, você já se perguntou o que é planejar a arborização urbana?

Planejamento de arborização urbana

Esse é um processo delicado e técnico. Segundo o diretor da Neofloresta Serviços Ecossistêmicos, Ciro Duarte de Paula Costa, é responsabilidade de um conjunto de profissionais das áreas de Agronomia, Biologia Ambiental e Arquitetura, que elaboraram documentos para orientar e padronizar o plantio, auxiliando a população e a prefeitura na escolha de espécies ideais para as zonas urbanas. 

“Então, é preciso tomar esse cuidado em relação à seleção da espécie associada ao local. O planejamento da arborização é de local por local. A gente não pode extrapolar um planejamento para o município inteiro, considerando questões de potencial de risco de queda de algumas árvores, associado às características das espécies”, disse Costa.

Não é só discurso do diretor. A engenheira florestal Daniela Biondi Batista, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), é uma das pioneiras quando o assunto é o inventário de árvores de rua. Ela contou que considera essas espécies que ‘povoam’ nossas cidades como a nossa floresta urbana.

“É fundamental, em primeiro lugar, você conhecer as condições que já existem na região. Utilizamos muitas tecnologias para viabilizar o processo de formação dos inventários de árvores urbanas por todo o Brasil. É importante ter esse inventário para sabermos em quais locais essas árvores já existem, qual o local adequado para o plantio e onde as espécies se adaptam melhor. Com esse levantamento, podemos concluir as atitudes que deverão ser tomadas a respeito da região em que determinada árvore será plantada”, contribuindo com o planejamento, explica a professora.

Mas os pesquisadores admitem que, mesmo existindo um planejamento de arborização, esses documentos, normalmente, são deixados de lado pelas Secretarias de Meio Ambiente ou pelo Departamento de Projetos dos municípios, na hora que pensam em arborização. Esquecem como isso é importante para o bem-estar da cidade e que o planejamento de arborização urbano deve ser estruturado pelo município de cada Estado, para não ocorrer uma má estruturação dos ambientes urbanos. 

A professora Biondi explica, inclusive, que isso é regra. “É exigido, em nível estadual, via Ministério Público, que todos os municípios devem ter o seu plano de arborização e os cidadãos que queiram plantar árvores nas ruas têm que fazer seguir o plano urbano. Escolher as espécies com base no que for regrado”. Com isso, fica claro que plantar árvores não pode ser uma decisão individual. 

Eduarda Omiak Malacarne, que percebeu o erro ao alterar o terreno sem verificar e seguir um planejamento, lá em Campo Mourão, relata que, quando a família desocupou a casa, o dono mudou todo o ambiente e retirou as árvores que foram plantadas. Apesar do plantio não ter sido realizado de forma correta, o corte por parte da população é perigoso e também é uma irregularidade.

Segundo Costa, por norma, a prefeitura é responsável pelo espaço urbano. A escolha de espécie, plantio, corte, poda, são todos regulamentados pelo Plano Municipal de Arborização Urbana. Porém, o Plano também pode prever flexibilizações quanto a isso, sendo possível a participação da população.

A professora Daniela Biondi conta uma experiência que teve em Recife, na qual a população se envolveu em um planejamento participativo. “Participativo é quando a comunidade tem essa prerrogativa de escolher. Mas, quando a gente faz essa consulta, já foram medidas todas as calçadas, verificado o local de plantio e, de acordo com as condições do local, são separadas diferentes espécies possíveis de plantar. Assim, são várias opções e a pessoa escolhe uma delas, sendo que, qualquer opção pode ser adequada para aquele local”. A engenheira florestal complementa dizendo que “a participação da população é positiva, ao tornar o cidadão co-autor, podendo gerar mais afeto e responsabilidade com a árvore”.

Qual árvore plantar?

A professora da Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Flavia Gizele König Brun, também formada em Engenharia Florestal explica, que essa é uma pergunta complicada. Segundo ela, a árvore certa depende de muitos fatores, precisando ser analisado caso a caso. 

Ao escolher uma espécie, temos que nos manter atentos a diversos problemas. Um deles, como Brun alerta, é saber se a planta escolhida apresenta risco de intoxicação. “Houve casos, alguns anos atrás, de espécies que foram usadas em programas de arborização urbana e que são tóxicas em termos respiratórios. Isso acabou contribuindo para sobrecarregar uma das infraestruturas mais frágeis dentro dos nossos sistema de gestão municipal, que é a saúde pública”, relata a professora. 

Outra questão que deve ser levada em conta é a origem da espécie a ser utilizada. A professora explica que, mesmo com a enorme biodiversidade no Brasil, modelos mais antigos de arborização urbana valorizavam a flora exótica, ou seja, de outros países. Muitas dessas árvores que vieram de fora, são plantas que, por não ter inimigos naturais, acabam se alastrando, os gestores têm dificuldade em controlá-las, sendo até mesmo um risco para espécies ameaçadas de extinção nos biomas brasileiros.

A engenheira florestal também aponta que é impossível escolher uma espécie adequada sem pensar no local onde ela será plantada. As condições e os arredores, como a largura da calçada, o espaço reservado para o plantio, se há fiação aérea, são situações que alteram a espécie escolhida para esses locais.

A professora Daniela Biondi reforça a importância de procurar espécies que superem as adversidades da cidade, como, por exemplo, aquelas com raízes subterrâneas e que ocupem menos espaço. E tem mais: os locais reservados para as árvores são pequenos, o que, muitas vezes, contribui para as quedas.

Brun também alerta sobre a posição da árvore no meio urbano, indicando que, “colocada em local inadequado, pode obstruir a visão e causar acidentes, ou ocultar a visão de um pedestre que esteja circulando”. Assim, o planejamento tem que observar diferentes possibilidades e impactos no meio urbano.

A professora também lembra que, em um país extenso como o Brasil, os climas e biomas que compõem o território devem ser considerados na escolha da espécie. Isso porque o clima impacta no desenvolvimento da árvore. A professora utiliza o Ipê-amarelo – árvore considerada símbolo brasileiro – plantada em diversos locais, para exemplificar o que cada um se comporta diferentemente em situações diversas. “No Rio Grande do Sul, o Ipê vai crescer com muito adubo, muito cuidado e muita reza para São João Gualberto, que é o santo protetor do engenheiro florestal. Com isso, deve alcançar cinco metros. Mas se plantar em Maringá, vamos encontrar ipês de 5, 8 até 12 metros de altura. No Cerrado, em Brasília, o Ipê-amarelo cresce mais de 20 metros”, detalha a engenheira. 

E tem mais… em locais onde faz calor na maior parte do tempo, a população vai querer árvores com copas grandes que façam sombra. Já em locais frios o desejo é por espécies que promovem menos sombra, permitindo mais incidência solar. A professora Daniela Biondi explica que, esses diferentes serviços proporcionados para o ser humano por recursos naturais são chamados de serviços ecossistêmicos. A matéria do C², Fazer bem para o planeta é investir, se aprofunda sobre esse tema.

Então você percebeu como é importante cuidar das árvores e ter um planejamento correto? Esperamos que sim! Esses seres vivos desempenham papéis importantes dentro das cidades, fazem parte mesmo da infraestrutura urbana! Por isso,  elas demandam cuidado e atenção, assim como nós, cidadãos!

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Texto:
Maysa Ribeiro Macedo, Gabriel Vieira dos Santos e Eduarda Omiak Malacarne
Supervisão de texto: Ana Paula Machado Velho
Arte: Marjorie C. Gracino
Supervisão de arte: Tiago Franklin Lucena
Edição Digital: Gutembergue Junior

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