NAPI Alimento e Território: inovação agroecológica

Com o propósito de promover pesquisa e colaboração em prol da soberania alimentar, surge um projeto destinado a transformar vidas paranaenses

Numa pesquisa rápida pela internet ou conversando com alguns amigos, você pode entender que ser saudável envolve um conjunto de fatores e hábitos. Muito além de acordar cedo e fazer academia ou pilates, comer alimentos de qualidade também é fundamental para uma rotina mais leve. Lendo uma matéria do C2 que aborda as relações entre o campo e projetos desenvolvidos dentro das universidades, entendi como o uso de fertilizantes e agrotóxicos tem crescido globalmente e que a produção de alimentos orgânicos, cultivados sem o emprego de pesticidas, fertilizantes químicos ou sementes transgênicas, garante grande segurança para o consumo. 

Com a matrícula da academia realizada, me perguntei como me tornar ainda mais saudável, tentando priorizar a questão alimentar desta vez. Andando por um dos caminhos da Universidade Estadual de Maringá (UEM), minha resposta estava mais perto do que eu imaginava. Muito bem organizada, estava montada a Feira de Economia Solidária, que vende produtos orgânicos produzidos pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), alimentos caseiros e industrializados de pequenos empreendedores, cosméticos naturais, artesanato e até roupas.

Não muito distante, num outro cantinho do Paraná, se faz presente uma iniciativa que vai além dos livros acadêmicos, trazendo soluções práticas e sustentáveis para comunidades rurais em busca de uma produção de qualidade. Hoje, os jovens do campo almejam, mais do que nunca, mais acesso à tecnologia, uma renda maior e a oportunidade de se engajar em diversas atividades, desejando permanecer no seu ambiente sem sacrificar essas aspirações. Outra questão pertinente é que o êxodo rural no Brasil supera em dobro a média mundial, segundo dados do Banco Mundial, evidenciando uma preocupante tendência: nos últimos 22 anos, a população rural do país encolheu em 34%, o que também impacta diretamente na produção de alimentos de qualidade.

Para auxiliar no enfrentamento dessas problemáticas, foi fundado, em 2002, na cidade de Francisco Beltrão, o Novo Arranjo de Pesquisa e Inovação (NAPI) Alimento e Território se tornou uma referência ao expandir sua estrutura para outras regiões, incluindo Foz do Iguaçu e Marechal Cândido Rondon. A proposta é construir uma rede de parcerias sólidas com associações, cooperativas e famílias de agricultores, valorizando os saberes locais e criando oportunidades para as mulheres da comunidade. Hoje, diversos produtores rurais, como os responsáveis pela feirinha na universidade, são auxiliados por uma equipe dedicada de pesquisadores e extensionistas. Juntos, eles discutem ideias e estratégias para melhorar a produção de maneira sustentável, utilizando práticas inovadoras e respeitando o meio ambiente.

Essa iniciativa, que vai além dos estudos acadêmicos, surgiu na Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), fruto do Grupo de Estudos Territoriais (GETERR), que nasceu como resposta na busca por recursos financeiros para potencializar as atividades que já eram desenvolvidas desde 2002. Em um diálogo inspirador sobre o NAPI, os líderes do projeto e professores da Unioeste – Campus de Francisco Beltrão, Marcos Aurelio Saquet e Adilson Francelino Alves, compartilharam as raízes desta iniciativa, que visa transformar o desenvolvimento sustentável em regiões paranaenses.

Agroecologia em foco: uma nova visão para a agricultura

Ao focar em duas frentes, alimentação e território, o NAPI se ramifica em duas áreas geográficas distintas: o sudoeste do Paraná e o litoral do Estado. “No Sudoeste, a aposta recai na produção de estufas para o cultivo de batata-doce e mandioca, colaborando com a Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) e a Embrapa, para garantir qualidade e atender à demanda crescente, especialmente na merenda escolar”, destaca Marcos.

No litoral paranaense, a estratégia se volta para a transformação de alimentos típicos, colaborando com associações, cooperativas e famílias de agricultores. A ênfase está na valorização dos saberes locais e na criação de oportunidades para as mulheres, que terão cozinhas profissionais para processar e comercializar produtos regionais.

Destacam-se, ainda, vários projetos que estão moldando o futuro da agricultura na região, desde a produção de alimentos agroecológicos locais, como a bala de banana, até o desenvolvimento de cadernos informativos para famílias. O NAPI Alimento e Território está na vanguarda de iniciativas, que visam não apenas transformar a produção de alimentos, mas também empoderar as comunidades locais. Um exemplo notável é a feirinha agroecológica, um sucesso que proporciona aos consumidores acesso a produtos frescos e saudáveis. A iniciativa promove sustentabilidade, sem deixar de fortalecer os laços entre produtores e consumidores, criando uma economia local robusta.

Um dos pontos fortes do projeto é a sinergia entre diversas instituições, uma vez que, além das universidades locais, como a Unioeste e a UTFPR, cinco programas de pós-graduação que enriquecem a iniciativa com expertise. A parceria com entidades como a União das Cooperativas de Agricultura Familiar e Economia Solidária (UNICAFES), Cooperativa Agropecuária Familiar Rural (COAFAR) e com a Cooperativa Central Da Agricultura Familiar Integrada Do Paraná (COOPAFI), fortalece o elo entre a área acadêmica e a agricultura familiar.

Desafios e a busca por soluções inovadoras

Ao abordar os desafios enfrentados, os professores reconhecem obstáculos, como a escassez de mão de obra no campo e a burocracia envolvida em projetos acadêmicos. No entanto, destacam a importância de superar esses impasses para atingir objetivos mais amplos. A necessidade de financiamento e apoio contínuo foi ressaltada por Edilson como essencial para a sustentabilidade a longo prazo dessas iniciativas.

“Aqui na região sudoeste do Paraná, a mecanização nas plantações de soja e milho é praticamente dominante. Há um esforço contínuo, há cerca de um ano, para obter recursos públicos destinados à construção de estufas, porém, até o momento, não obtivemos êxito. A falta de financiamento, especialmente para pequenos agricultores, tem sido um grande obstáculo. Muitos deles necessitam de valores entre 30 mil e 50 mil reais para viabilizar a construção das estufas”, esclarece o docente.

Professor Adilson Alves, Unioeste, integrante do NAPI Alimento e Territórios (Foto/Arquivo pessoal)

Já o professor Marcos aponta que uma parte significativa das sementes usadas na primeira etapa da agricultura na região sudoeste do Paraná é importada. Isso significa que o Brasil não consegue produzir localmente as sementes necessárias, sendo incapaz de gerar matrizes para atender à demanda dos agricultores na área. “Essa dependência de sementes importadas pode trazer desafios para a segurança alimentar e a autonomia dos agricultores locais”, afirma.

Professor Marcos Saquet, coordenador do NAPI Alimento e Territórios na Unioeste (Foto/Arquivo pessoal)

Outro desafio crucial identificado é a produção de mudas agroecológicas, um fator essencial na cadeia produtiva. A dependência de sementes importadas ressalta a necessidade de fortalecer a capacidade nacional de gerar matrizes e mudas. O projeto também enfrenta desafios logísticos, buscando criar uma cadeia produtiva mais autossuficiente. 

Sobre a importância das sementes, Marcos destaca: “decidimos investir na produção de sementes orgânicas, porque já sabemos que elas são importadas e muito caras. Nós conseguimos um recurso da Fundação Araucária, assim como todo o NAPI, que é também para comprar as sementes e para construir essa casa da vegetação profissional que estamos construindo na UTFPR de Dois Vizinhos”.

Resultados alcançados e perspectivas futuras

Ao discutir as metas do NAPI, ficou evidente que o foco é tanto quantitativo quanto qualitativo. Além dos números e publicações, a meta de formação e a busca por uma coordenação mais ágil foram aspectos destacados. Os líderes expressaram otimismo em relação ao futuro, destacando a importância de expandir a colaboração com outros NAPIs e fortalecer os laços com a comunidade.

Além das parcerias consolidadas em território nacional, o GETERR busca uma abordagem global. Convênios com universidades da Itália, México, Colômbia, Costa Rica, Portugal, Chile e Argentina demonstram o compromisso em aprender e compartilhar conhecimentos tanto nacionalmente como internacionalmente. A realização de eventos com especialistas de renome internacional é uma prova do reconhecimento da qualidade do trabalho desenvolvido.

Sociedade + Universidades

O impacto do NAPI Alimento e Território é evidenciado pelos números expressivos de acessos em redes sociais e nas mídias, além de projetos como a feirinha agroecológica e a colaboração com outros NAPIs, que refletem o compromisso em disseminar conhecimento e estimular o desenvolvimento regional.

Conforme indicado pelo professor Adilson, no que diz respeito ao sudoeste do Paraná, houve uma redução significativa de 21% na população rural entre 2000 e 2010. É realmente impressionante e preocupante notar esse declínio e o envelhecimento nas comunidades agrícolas da região. Os dados fornecidos destacam a urgência de implementar ações para reverter essa tendência, e a colaboração entre a universidade e o território, exemplificada pelo trabalho dos professores, desempenha um papel crucial na promoção do desenvolvimento sustentável e na retenção das pessoas no campo.

A formação de recursos humanos, o trabalho em conjunto com as entidades locais, e a busca por soluções que atendam às necessidades reais das comunidades são abordagens essenciais. A preocupação com a juventude, tanto no campo quanto na periferia urbana, mostra uma visão holística do desenvolvimento, abordando questões de educação, emprego, e qualidade de vida. 

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Texto:
Juliano Meurer Backes
Colaboração: Guilherme de Souza Oliveira e Douglas Cardoso Dragunski
Supervisão de texto: Ana Paula Machado Velho
Revisão de texto: Silvia Calciolari
Arte: Camila Lozeckyi
Supervisão de arte: Tiago Franklin Lucena
Edição Digital: Gutembergue Junior

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