SpectroCheck: a tecnologia na ponta da língua

Sem necessidade de coleta de material biológico, o teste desenvolvido pela UEM detecta resultado positivo ou negativo para Covid-19 em 3 segundos

Em dezembro de 2019, uma “pneumonia misteriosa” assombrou os médicos e pesquisadores de Wuhan, na China. Poucos meses depois, a doença, ainda desconhecida, já causava vítimas em todo o globo terrestre.

SARS-CoV-2 ou novo coronavírus: assim foi chamado o tão temido microorganismo que, de uma hora pra outra, fez o mundo parar, as pessoas se distanciarem, os abraços serem proibidos e ficar em casa se tornar uma regra de segurança. Tudo para evitar a doença provocada pela infecção, a Covid-19.

Assim como tem acontecido durante a pandemia do coronavírus, pessoas do mundo todo também tiveram de mudar suas rotinas durante aquela que ficou conhecida como “a mãe das pandemias”, em 1918, a Gripe Espanhola. Assim descreveu a professora Heloísa Starling, no texto “O ano em que Belo Horizonte enfrentou a peste”, a situação do século passado: “as ruas ficaram vazias, cafés e bares, cinemas, clubes e casas de diversão, às moscas”.

Apresentando sintomas como dor de cabeça, febre, dor no corpo e cansaço, a Gripe Espanhola, como a Covid-19, também fez com que os hospitais ficassem lotados e faltassem leitos para todos os infectados. Os enterros das vítimas eram permitidos apenas aos mais próximos e o isolamento dos contaminados era obrigatório. 

Enfermaria improvisada no salão de festas do clube Paulistano, São Paulo, 1918 (Unicamp/Divulgação) – Enfermaria improvisada em tenda, 2021, (Mike Adas/TV TEM)
Vagão de bonde para cargas repleto de caixões, 1918 (Revista A Vida Moderna) – Carregamento de caixões, 2020, (Reprodução/Facebook)
Cemitério durante pandemia da Gripe Espanhola, 1918 (ABC) – Vítimas da Covid-19 enterradas em vala coletiva, 2020

A história tem se repetido, mas uma coisa fez com que os cem anos entre as doenças se tornassem mais evidentes. Em 1918, não existiam tecnologias de detecção da doença tão avançadas quanto em 2019.

“Essa doença pode não apresentar sintomas em algumas pessoas, como vou saber se fui contaminado?”; “como posso ter a certeza de que os sintomas que tenho são da Covid-19?” Essas perguntas, tão realizadas nesse período, só podiam, e podem, ser respondidas de uma forma: por meio de um exame. 

Os técnicos de laboratório, durante a pandemia, têm trabalhado incansavelmente na coleta de material para realizar o teste que confirma ou não a doença no paciente, o chamado de RT-PCR para SARS-CoV-2 em swab combinado de nasofaringe. O que se observa é uma testagem menor do que a esperada e um tempo longo para que a infecção seja detectada, cerca de 3 ou 4 dias após o início dos sintomas, o que faz com que a confirmação da doença demore mais que o desejado.

Roselaine Lopes da Silva Ribas, de 47 anos, é dentista e trabalha na linha de frente, assim como o marido, Fabiano Ribas, de 48 anos, que atua como pediatra em um hospital na cidade de Ubiratã. Por estarem diariamente em um ambiente de extrema exposição ao vírus, ambos já realizaram diversas análises RT-PCR. “É um exame muito invasivo e desconfortável. Não desejamos em nenhum momento ter que fazê-lo várias vezes. Além disso, a demora em saber o resultado nos deixa aflitos, esperando por uma resposta e sem saber o que fazer”, contou Roselaine. 

rose e fabiano, arquivo pessoal
📷 Rose e Fabiano

Para realizar esse exame, é necessária a coleta do material biológico do indivíduo e aí se encontra toda a aflição. Para obter a amostra, um swab, que é um cotonete comprido, é colocado profundamente dentro do nariz e da garganta. O paciente sente uma ardência no local, parecida como se estivesse na praia dando um mergulho e entrasse água no nariz. O desconforto é imenso e, quando é feita a parte da coleta da garganta, alguns sentem até náuseas. 

🎧 Rose fala sobre os testes

Pensando em pessoas como a Roselaine e o Fabiano e em uma possível testagem em massa da população, uma empresa chamada Gluco Scan desenvolveu, em parceria com a Universidade Estadual de Maringá (UEM), um teste que, além de não ser invasivo, apresenta o resultado positivo ou negativo, em 3 segundos, para a presença do coronavírus no organismo, o chamado SpectroCheck.

Coordenado pelo professor Dennis Armando Bertolini, que é parte do Departamento de Análises Clínicas e Biomedicina (DAB) e do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde (PCS) da UEM, essa parceria teve início há cerca de quatro meses, quando a equipe da empresa entrou em contato com o professor, com a intenção de formalizar e formatar o estudo dentro da metodologia padrão para que os testes com os pacientes internados no Hospital Universitário Regional de Maringá (HUM), ligado à UEM, pudessem ser realizados.

Usando um tipo de leitura chamado espectrometria de massa, mais especificamente o infravermelho, o SpectroCheck identifica a presença ou não do vírus na língua do indivíduo. Por se tratar de uma doença respiratória, a multiplicação do microrganismo pode ser encontrada na saliva. É também, por meio dessa tecnologia, que se permite que o resultado esteja pronto em 3 segundos. 

📺 O farmacêutico Dennis Bertolini explica como o Spectrocheck funciona

O procedimento para notificar o projeto para a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) é extremamente burocrático e Bertolini explica o porquê. “A Anvisa exige diversas documentações, desde certidão negativa da empresa até os relatórios e resultados realizados pelos pesquisadores da UEM. Por se tratar da Covid-19, o processo entra em uma classificação de urgência, que proporciona uma análise mais rápida, entre 7 e 15 dias.”

O novo teste analisa três critérios: sensibilidade, especificidade e confiança. Enquanto o RT-PCR, feito por Roselaine por inúmeras vezes, apresenta 86% de sensibilidade, 96% de especificidade e quase 100% de confiança, o SpectroCheck apresenta 83,87% no primeiro critério, 91,07% no segundo e 90% no último, demonstrando sua eficácia na detecção. 

📺 Entenda os critérios utilizados para definir a eficácia do Spectrocheck

A testagem em massa ainda não é uma realidade no Brasil. A quantidade de testes disponíveis é muito limitada, não permitindo que todos os casos sejam confirmados. Porém, com a tecnologia aplicada pelo SpectroCheck existe a possibilidade de serem testados mais brasileiros.

“Seria muito mais interessante usar o SpectroCheck na entrada dos estabelecimentos do que o termômetro, por exemplo. Estar com febre não significa que uma pessoa está com a Covid-19, ao contrário do teste, que ao dar positivo, significa que ela está com a doença”, explicou Bertolini.

Ademais, Roselaine e milhares de brasileiros sentiriam-se menos aflitos com o conforto proporcionado pelo teste e por sua agilidade na entrega do resultado. Os três segundos propostos pelo exame e sua não necessidade de coleta de material biológico, com certeza, fariam toda a diferença no enfrentamento da pandemia no Brasil, que conta com mais de meio milhão de mortes pela Covid-19.

O conteúdo desta página foi produzido por

Texto: Valéria Quaglio da Silva e Rafael Donadio
Edição de áudio: Valéria Quaglio da Silva e Rafael Donadio
Roteiro de vídeo: Karoline Yasmin Cera da Silva
Edição de vídeo: Karoline Yasmin Cera da Silva
Supervisão: Ana Paula Machado Velho e Rafael Donadio
Imagens: Lorena Dutra de Moura e arquivo pessoal
Arte: Murilo Mokwa

A pesquisa que mencionamos contribui para os seguintes ODS:


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